Apesar de contestado nas ruas, a resposta do governo de Daniel Noboa, do Equador, tem sido a militarização, a ocupação de áreas populosas e o corte do sinal de Internet em algumas comunidades, denuncia em artigo a emissora venezuelana teleSUR.
Noboa expressou estar disposto a uma investida contra o que ele chamou de “terrorismo”, permitindo que as Forças Armadas fizessem parte da repressão contra as mobilizações populares, junto a outras forças de segurança.
Efraín Fuerez, de 46 anos, foi assassinado no domingo, 28 de setembro, com três tiros, presumivelmente de armas de longo alcance, que são de posse exclusiva das Forças Armadas. Isso se soma às denúncias de tortura contra detidos e prisões ilegais.
Segundo a teleSUR, o dia 28 de setembro de 2025 foi o mais repressivo até agora na greve nacional que começou em 20 de setembro, convocada pela Confederação de Nacionalidades Indígenas do Equador (CONAIE) após a eliminação do subsídio ao diesel.
Durante o fim de semana, houve bloqueios em todas as estradas de acesso a Otavalo e os militares reprimiram os manifestantes com gás lacrimogêneo, o que não impediu o protesto e a mobilização nessa área. Algo semelhante ocorreu em outras províncias do Equador, incluindo os acessos à capital, Quito.
Neste domingo, 28, em Quito e Cuenca, houve manifestações de repúdio à violência militar, pedindo a punição dos responsáveis pelo assassinato de Fuerez e a eliminação de todas as medidas de ajuste econômico.
Apelando aos mesmos argumentos de Lenín Moreno e Guillermo Lasso, em 2019 e 2022, respectivamente, agora Noboa se vitimiza e se diz alvo de ataques de grupos “terroristas” e que ele também “resistirá”.
Durante o quinto dia da “greve imediata e indefinida”, o presidente desafiou os líderes da CONAIE a ganharem a Presidência ou a Assembleia Constituinte para “impor seu modelo econômico” e lembrou que nas últimas eleições o ex-candidato presidencial Leonidas Iza obteve menos de 3% dos votos.
Ele descartou a possibilidade de negociar para resolver o conflito e informou que há relatórios de inteligência de que algumas pessoas que participam do bloqueio de vias em Imbabura recebem dinheiro de grupos criminosos.
“Agora vemos que muitos estão conectados à mineração ilegal, com o crime organizado. Vimos membros do Tren de Aragua, narcoterroristas que atiram pedras nos policiais”, declarou em uma entrevista à imprensa.
No entanto, todas as pessoas detidas (cerca de 100 em todo o país) e apontadas como supostos integrantes de grupos criminosos não foram processadas e são trabalhadores, camponeses e comerciantes que saíram para protestar pacificamente.
Com bônus, compensações, créditos e todo tipo de oferta, Noboa tenta desmobilizar as organizações sociais e os cidadãos. O argumento oficial é que, com a eliminação do subsídio ao diesel, o governo economizará US$1,1 bilhão anuais.
Após o anúncio da eliminação do subsídio, o governo ofereceu compensações para os transportadores de passageiros e carga, com pagamentos que variam entre US$400 e US$1.800 por um período de quatro meses. Para isso, foram destinados US$220 milhões. Além disso, criou o Bono Agrícola Raíces, um pagamento único de US$1.000 para pequenos agricultores, com um orçamento de US$100 milhões.
No entanto, as organizações mobilizadas estão longe de aceitar “a troca”, que já custou uma morte nas ruas, presos e torturados. A relatora das Nações Unidas para a Liberdade de Associação, Gina Romero, manifestou-se neste domingo após a notícia da morte de Efraín Fuerez.
“Protestar é um direito, não pode custar a vida”, escreveu ela em sua conta no X. Da mesma forma, diversas organizações de defesa dos direitos humanos, artistas, cineastas, acadêmicos e inúmeros líderes sociais da serra equatoriana se manifestaram.
O Fundo Monetário Internacional (FMI) manifestou-se nesta quinta-feira, 3 de outubro de 2025, sobre a decisão do governo de Daniel Noboa de eliminar o subsídio ao diesel e destacou que o executivo equatoriano busca que os subsídios aos combustíveis sejam mais focalizados.
Segundo o FMI, a experiência internacional mostra que os subsídios aos combustíveis geralmente beneficiam de forma desproporcional os setores de maior renda e, além disso, podem gerar riscos de contrabando e corrupção.
No entanto, o FMI expressou sua preocupação com as consequências sociais da reforma, que já resultaram na morte de uma pessoa nos protestos. A instituição pediu um “diálogo construtivo entre o governo e os setores mobilizados” como forma de restaurar a calma e alcançar uma solução definitiva.
Na aposta de Noboa para militarizar o processo, usando como desculpa o combate a algumas das gangues criminosas como Los Chones e Los Lobos (integradas à lista de organizações terroristas pelos EUA), percebe-se a consultoria de Erik Prince.
Em 18 de julho de 2025, Erik Prince, agora fundador da empresa de segurança Academi, voltou ao Equador pela terceira vez no ano, onde o governo de Noboa o contratou para realizar formações e capacitações para forças de segurança, o que foi confirmado pelo ministro do Interior, John Reimberg. No entanto, até o momento, os termos do contrato e quanto as capacitações custarão ao país são desconhecidos.
Um relatório recente revela como a militarização da segurança pública no Equador facilitou a ocorrência de desaparecimentos forçados nas mãos das Forças Armadas, deixando famílias inteiras na incerteza e evidenciando o fracasso das políticas de segurança implementadas pelo presidente Daniel Noboa sob o chamado “Plano Fênix”.
A investigação expõe como o governo de Daniel Noboa tem recorrido de forma sistemática a estados de exceção e à declaração de um suposto “conflito armado interno” para justificar a expansão do papel das Forças Armadas em tarefas de segurança pública.
“Longe de proporcionar segurança, essa estratégia abriu a porta para violações graves dos direitos humanos e colocou as pessoas no país em maior risco”, conclui o relatório do organismo.
O relatório denuncia que a Procuradoria-Geral enfrentou graves obstáculos para investigar. As Forças Armadas se recusaram a fornecer informações, alegando “segredo” ou “informação reservada”.
Paralelamente, o relatório relata omissões graves da própria Procuradoria: atrasos em diligências-chave, falta de preservação de provas e abertura de investigações sob figuras jurídicas diferentes do desaparecimento forçado, o que atrasou o acesso à verdade e à justiça para as vítimas.
“Cada dia que passa sem que esses crimes sejam esclarecidos é um suplício para as famílias que procuram seus entes queridos. A verdade não pode continuar oculta atrás de desculpas militares ou da indiferença institucional. As autoridades devem lembrar que estamos falando de crianças e jovens cujas vidas foram ceifadas, e de famílias que merecem respostas imediatas e justiça real”, acrescentou Ana Piquer.





