O pacote de destruição neoliberal do presidente argentino Javier Milei foi aprovado pela Câmara dos Deputados da Argentina no dia 30 de abril. Chamado pelo próprio governo de “Lei Ônibus”, o pacote foi aprovado com folga: 142 votaram a seu favor, contra 106 deputados que disseram “não” ao pacote. A votação registrou apenas oito abstenções.
Ainda que o projeto tenha recebido alguns cortes, ele é, em essência, o decreto de uma verdadeira ditadura do capital financeiro sobre o conjunto da população argentina.
O nome do pacote faz referência à palavra latina “ominbus”, que significa “para todos”. Neste caso, o projeto se propõe a ser uma lei sobre todos os aspectos da vida social argentina, que vai desde a “segurança pública”, isto é, sobre os direitos democráticos da população e o aparato de repressão, à economia. Trata-se, portanto, de um pacote com o objetivo de consolidar e oficializar uma mudança no regime político.
Entre as medidas aprovadas, está a chamada “reorganização administrativa”, que permitirá Milei modificar ou dissolver organismos públicos ao seu bel-prazer. Também foi aprovada a privatização total de quatro empresas públicas, concessão de outras cinco e a privatização parcial de outras duas. Indo no mesmo sentido, foi aprovado que as empresas poderiam exportar hidrocarbonetos (petróleo e gás) livremente, sem estarem obrigadas a abastecer o mercado interno.
Uma quantidade impressionante de ataques trabalhistas também foi aprovada. Para os servidores públicos, destaca-se os ataques à estabilidade. Para os trabalhadores no geral, criou, para as empresas, um “fundo de cessação do emprego”, que torna as demissões mais fáceis, mais baratas e menos burocráticas. A lei ainda aumentou o período probatório de três para seis meses e legalizou a terceirização.
O pacote de destruição, vale destacar, foi aprovado mesmo com a base relativamente pequena que Javier Milei no parlamento. O partido governista La Libertad Avanza tem apenas 42 cadeiras na Câmara dos Deputados, tendo necessitado do apoio majoritário do PRO, da União Cívica Radical (UCR), Hacemos Coalición Federal, Innovación Federal e do Movimiento Popular Neuquino (MPN).
Após a aprovação do pacote de destruição, a sucursal chilena da emissora norte-americana CNN declarou que Milei “demonstrou capacidade de negociação”, na medida em que revisou o texto inicial da “Lei Ônibus” e fez com que fosse aprovada. Em outras palavras, segundo a imprensa imperialista, o presidente argentino teria demonstrado que, mesmo sendo um louco que tem seu cão morto como guru espiritual, ele seria um político “civilizado”. Uma pessoa razoável, com a qual se pode chegar em um acordo.
A avaliação da CNN Chile vai ao encontro do que disse Julie Kozack, diretora do Departamento de Comunicações, sobre os 100 primeiros dias do governo Milei. Segundo Kozack, após as vendas das farmácias despencarem quase pela metade, como resultado da queda abrupta do poder de compra dos argentinos, “o progresso até agora tem sido impressionante, com superávits fiscais registrados em janeiro e fevereiro pela 1ª vez em mais de uma década, reconstrução das reservas internacionais, queda da inflação mais rápida do que o previsto e melhorias contínuas nos indicadores de mercado“. Em outras palavras, “continue assim, Milei”.
A votação do pacote de destruição, bem como os comentários da imprensa e dos representantes do imperialismo, não deixam margem para dúvida: a política de Javier Milei não é um “ponto fora da curva”, mas sim uma política que está sendo apoiada pelo grande capital.
Esse apoio do imperialismo, contudo, não se dá por uma questão local. O apoio do imperialismo à devastação neoliberal não ocorre por questões específicas da política argentina. Ela é a expressão de uma tendência geral. E de uma tendência que, nas últimas semanas, já se estabeleceu como uma política geral. Diante da fragilidade de “Israel” no Oriente Próximo, o imperialismo colocou em marcha uma contraofensiva contra todos os povos do mundo.
A contraofensiva atua, fundamentalmente, em duas frentes. Por um lado, é preciso intensificar muito a repressão em todos os países, uma vez que a fragilidade do imperialismo é vista pelos oprimidos como uma oportunidade para lutar por sua libertação. Isso ficou mais que comprovado na história recente. O levante afegão em 2021 estimulou a Rússia a realizar a sua operação especial na Ucrânia. Da mesma forma, o golpe militar no Níger estimulou países como o Gabão e Senegal a romperem suas relações com a dominação francesa.
É por essa necessidade de se intensificar a repressão que os estudantes norte-americanos estão sendo duramente reprimidos. Assim como estão sendo reprimidos manifestantes na Europa e assim como o Partido da Causa Operária (PCO) foi brutalmente censurado pelo YouTube, plataforma controlada pelo imperialismo.
A outra frente da contraofensiva, que acaba alimentando a necessidade da repressão, é o problema econômico. Para conseguir conter todos os enfrentamentos militares no Oriente Próximo, no Leste Europeu e no Sudeste Asiático, assim como para financiar o aparato de repressão mundial, será preciso tirar dinheiro de onde o imperialismo não tem. Por isso, a única opção é partir para uma política neoliberal ainda mais agressiva. É preciso defender a pilhagem total dos povos.
Desse ponto de vista, fica claro que o que Milei faz na Argentina é o retrato do que o imperialismo quer para o mundo, incluindo o Brasil.