O neoliberalismo ficou exposto com as recentes enchentes no Rio Grande do Sul. Prova disso é que uma das sucursais do imperialismo no Brasil, a Folha de S.Paulo, se apresentou para publicar um artigo defendendo esse tipo de devastador de economia. Nesta sexta-feira, 17, Deborah Bizarria assina um texto intitulado “A tragédia do RS matou o neoliberalismo?” Essa pergunta é uma reação ao fato de que está ficando cada vez mais claro para a população que a falta de investimentos públicos é o verdadeiro culpado das inundações.
Logo no primeiro parágrafo a autora é obrigada a reconhecer a percepção pública do ocorrido no Sul, por isso assinala que “vários usuários de redes sociais decretaram o fim do ‘Estado mínimo’ e do ‘neoliberalismo’, sugerindo uma incompatibilidade entre o liberalismo e uma resposta eficaz a crises, como a tragédia no Rio Grande do Sul”.
Bizarria, para defender sua frágil posição, tenta esclarecer seu ponto alegando que “o liberalismo não preconiza a ausência do Estado, mas sim sua atuação eficiente, limitada e focada nas áreas onde é mais necessário”. Ela só esquece de dizer que no mundo real não é assim que as coisas acontecem. Para o neoliberalismo, o Estado se torna eficiente quando drena os recursos públicos para os bolsos cada vez mais cheios dos capitalistas.
O texto de Deborah Bizarria, apesar de tudo, é defensivo, tanto que a autora evita utilizar o termo neoliberalismo, o que procura substituir por ‘liberalismo’. Ela sustenta que “O liberalismo político reconhece que, especialmente em situações de crise, o Estado deve desempenhar um papel de coordenador e facilitador de ações que o setor privado não consegue realizar sozinho. No caso da tragédia no Rio Grande do Sul, o Estado deveria estar preparado para atuar de forma eficiente, mobilizando recursos e organizando estratégias de socorro”.
A afirmação acima é falsa. Os neoliberais, que sozinhos não conseguem construir um sistema elétrico como o brasileiro; não consegue criar uma rede de captação, tratamento e distribuição de água como em todo o estado de São Paulo, corrompem determinados políticos e se apossam de bens públicos, de empresas estatais que foram possíveis apenas com o esforço social.
Não bastasse o crime que é vender a preço de banana empresas públicas, o Estado está passando para as mãos de tubarões verdadeiros monopólios. Não existe aí a concorrência, que os liberais fingem que prezam. Quem poderá criar um sistema elétrico paralelo? Quem poderá construir novas estradas para concorrer com as já existentes, ou empresas de distribuição de água?
Setores estratégicos, que deveriam ser monopólios do Estado, estão sendo privatizados e, como não existe concorrência, a população está sendo esfolada, como os constantes aumentos nas tarifas. O Estado entra apenas com a repressão para defender os interesses desses parasitas, como ocorreu no Rio Grande do Sul, quando manifestantes foram agredidos pela polícia por protestarem contra os constantes apagões e tarifas abusivas.
Novamente a questão do clima
Bizarria se apressa em dizer que “As questões climáticas e ambientais, por exemplo, são justamente áreas cruciais nas quais o Estado deve investir e criar arcabouços legais para prevenir e desenvolver respostas a desastres naturais, inclusive utilizando mecanismos de mercado, de modo articulado ao setor privado”.
Ora, o Estado burguês tem desregulamentado a proteção do meio ambiente, quando é de interesse do ‘mercado’, mas é chamando para dar respostas aos ‘desastres naturais’. Em outras palavras, o poder público, que garante o lucro dos capitalistas, tem de voltar à cena quando se trata de pagar as despesas.
Como não poderia deixar de ser, embora seja uma bizarrice, a autora vê oportunidades de ganhos na tragédia, por isso afirma que “empresas e ONGs são parceiras essenciais do Estado, trazendo recursos e conhecimento especializado para ajudar na recuperação e reconstrução”. – grifo nosso.
Ironicamente, Deborah Bizarria diz que “temos visto enormes esforços de voluntários e doadores para salvar vidas e reconstruir o estado após a tragédia”. É verdade, a população, que tem sido vítima do neoliberalismo, que já paga impostos altíssimos, é chamada para ajudar, pois o poder público entregou quase todo o orçamento para os ‘liberais’, que escondem a mão na hora de socorrer. Até virou piada nas redes sociais que a logística de envio de ajuda para as vítimas da enchente está sendo feita pelos Correios, uma empresa pública, não pela Amazon.
Corte de gastos
Deborah Bizzaria foi chamada para defender o corte de gastos públicos, embora disfarce e diga que “Governos devem gerenciar suas finanças de maneira prudente para garantir espaço orçamentário em momentos de crise”. Ou ainda: “Um controle das finanças públicas focado em políticas públicas eficazes permite investimentos em medidas preventivas e de resposta rápida a desastres”.
Ninguém pode levar a sério essas alegações. A ‘prudência’ aqui só serve para que o Estado não gaste dinheiro em obras e pague dívidas públicas. Não há ‘espaço orçamentário’ quando o dinheiro público é vampirizado pelos bancos, que ainda querem mais. Não existe dinheiro para prevenção. As inundações mostraram que o sistema de contenção das águas estava todo sucateado e enferrujado. Eduardo Leite, o governador neoliberal queridinho da grande imprensa, está sendo isentado pois fez o dever de casa: nada para a população, tudo para os capitalistas. Leite privatizou tudo o que pôde e a deterioração do Estado é impossível de esconder.
Apesar de a realidade não deixar margem para dúvidas, a senhora Bizarria tenta tapar o sol com a peneira afirmando que “ao contrário do que se vê nas redes sociais, não se trata de inação ou negligência, mas de valorizar a proteção dos direitos e a liberdade dos cidadãos em detrimento de gastos ineficientes ou projetos dirigistas e megalomaníacos”. Quais direitos estão sendo protegidos quando as pessoas perdem todos os seus pertences, que levaram uma vida para juntar, em uma inundação que poderia ser evitada, não fosse o compromisso de governos neoliberais com o ‘mercado’, não com o bem público?
Em uma coisa temos de concordar com a autora: a tragédia no Rio Grande do Sul não tem nada a ver com a morte do neoliberalismo (que ela escreve entre aspas), mas com a sua plena vigência. Foi a aplicação criteriosa da política neoliberal que provocou tamanha devastação.