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Carla Dórea Bartz

Jornalista, com 30 anos de experiência (boa parte deles em comunicação corporativa). Graduada em Letras e doutora pela USP. Filiou-se ao PCO em 2022.

Cinema e política

Babilônia: um filme na contramão

Filme abarca a história de Hollywood para refletir sobre o futuro da arte cinematográfica

Está em cartaz nos cinemas um filme estadunidense que vale o ingresso e a reflexão. Chama-se Babilônia (Babylon, 2022), dirigito por Damien Chazelle. Com mais de três horas de exibição, é uma grande representação da história do cinema e de sua força cultural, especialmente a de Hollywood.

Chazelle fez um filme para homenagear os pioneiros que transformaram Los Angeles na capital da indústria de cinema nos Estados Unidos. Mais, ao fazer esta homenagem, ele discute os rumos da arte na pós-pandemia, quando as salas de cinema ainda lutam para trazer de volta o público que perderam.

Com os serviços de streaming baratos, o alcance cada vez maior da internet, as TVs de telas cada vez maiores e de imagem e som de qualidade indiscutível, a sala de cinema entra na terceira década do século XXI com concorrentes que a ameaçam. 

É possível dizer que a TV e o rádio estejam no caminho de serem profundamente afetados e transformados pelas novas tecnologias. O livro físico e o teatro conseguem se manter apesar das mudanças em curso. Talvez o cinema, por sua importância, alcance artístico inegável e apelo afetivo para muitos, também encontre seu espaço no futuro que já está próximo.

É uma forma de arte que surgiu como evolução tecnológica da Revolução Industrial e se tornou uma expressão do século XX por excelência. Nos mostrou tanto, e ainda mostra, que parece difícil que as pessoas abdiquem totalmente do prazer de ir ao cinema.

E este é o exercício que Chazelle se propõe. Ele nos oferece uma obra para ser vista na sala de cinema. Com um enredo nos anos 1920, retrata um momento de disrupção com a chegada do som, que muda completamente a forma de produção. É quando os famosos estúdios são fundados, visto que se tornava impossível, com as novas exigências acústicas, manter cenários em locações abertas. Algo muito similar acontece atualmente.

O nome Babilônia tem uma relação com a própria história do cinema. Trata-se de uma citação ao filme de D.W. Griffith, Intolerância (Intolerance: Love´s struggle throught all the ages, 1916), um filme pioneiro, que tem um sequência interia na cidade da Babilônia antiga. Até hoje, é reverenciado pelos seus cenários, onde gigantescas estátuas de elefantes são posicionadas como colunas de um antigo templo.

A Babilônia de Griffith acabou se tornando sinômino de Hollywood. Em 1987, os cineastas italianos Paolo e Vittorio Taviani fizeram o premiado Bom dia, Babilônia (Good Morning Babilonia). Na história, dois irmãos trabalham na criação dos cenários de Intolerância. inclusive dos famosos elefantes, e, depois, voltam para a Europa onde lutam em lados opostos da I Guerra Mundial. Temos uma reflexão excepcional sobre a conjuntura histórica da produção de Intolerância

O filme de Chalese abre com uma cena icônica que apresenta os personagens principais em uma festa, que vira uma orgia, na casa de um produtor de cinema. É uma citação direta ao filme de Griffith e à sua famosa sequência babilônica. Um elefante vivo é literalmente colocado no meio da sala em um dado momento. 

Esta é a primeira referência de muitas. Em suas três horas, seguindo a história de quatro personagens, a película passeia por gêneros e cita filmes que cinéfilos atentos descobrirão. Além de citações diretas como a Cantando na Chuva (Singin´ in the Rain, Stanley Donen, 1952). 

O caráter popular do cinema de então é ressaltado: ele é feito por e para a classe trabalhadora. Além de ser uma improvável saída para aqueles que estão na miséria, como ainda é até hoje.

Em muito momentos, reflete a luta de classes. O contraste, por exemplo, entre a riqueza de atores de primeira linha e produtores e a pobreza dos demais trabalhadores dos estúdios é mostrado como pano de fundo da encenação que se desenrola à nossa frente. A crítica é evidente. Em uma outra cena, uma atriz é humilhada por sua ignorância por uma burguesia arrogante.

Mais ainda, apesar de se passar nos anos 1920, é claro que Babilônia não pode deixar de lado as circunstâncias de produção e a conjuntura histórica que permitiram sua criação. Ele reflete sobre o passado para falar do presente e projetar o futuro. Apesar de muitos momentos de humor, de aventura e de espetáculo, o tom final é melancólico.

Por exemplo, a questão identitária está lá. Temos quatro personagens principais: a aspirante a atriz Nelly LaRoy (Margot Robbie), que quer escapar da pobreza, Jack Conrad (Brad Pitt), o ator que está no topo do sucesso, Many Torres (Diego Calva), como o produtor em ascensão e Sidney Palmer (Jovan Adepo), o saxofonista que se torna astro. 

Em suma, temos a mulher branca (que também é homossexual), o homem branco, o latino e o negro. Assim, o tema da intolerância ganha contornos contemporâneos. Mas, engana-se quem pensa que o filme cai na fácil encenação aderente à cultura identitária atual. Ao contrário, a crítica está lá. 

O problema é que para falar sobre isso, tenho que revelar importante questão do enredo. Vem aí o spoiler. Se não quiser saber, não leia o que segue.

O que significa, no atual contexto, um ator como Brad Pitt escolher um personagem – um ator de sucesso – que comete suicídio? É uma encenação sobre a morte de um tipo de representação e uma escolha política, claro, endereçada justamente aos valores atualmente impostos.

No final, as três indicações meramente técnicas ao Oscar revelam também o lado positivo de Babilônia. Não dava para premiar como “melhor filme” um que critica o identitarismo e ressalta a decadência cultural atual e a luta de classes. Como falei no início desse texto, vale o ingresso.

* A opinião dos colunistas não reflete, necessariamente, a opinião deste Diário

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