A Câmara de Vereadores do Rio de Janeiro aprovou, por iniciativa de psolistas, a retirada do busto do Padre António Vieira dos jardins da PUC. Pelo jeito, a maioria direitista da Câmara não exitou em aprovar o projeto, das duas, uma: ou a direita nacional está se tornando uma grande defensora das questões identitárias, ou os vereadores do Rio – quase todos -, incluindo os do PSOL, são uma turba de ignorantes que não sabem quem foi António Vieira, nunca leram nada dele e, convenhamos, nunca leram nada de nada. E se leram, têm sérias dificuldades de interpretação de texto.
Além da flagrante demostração de ignorância e obscurantismo, a medida ainda tem um toque de deselegância. O busto foi um presente da Câmara Municipal de Lisboa, em retribuição ao busto de Machado de Assis presenteado à Universidade Católica Portuguesa em 2008.
Os portugueses, acusados de serem terríveis colonizadores, reconhecem a importância de Machado de Assis, brasileiro, mulato, autodidata, um monumento de toda a literatura em língua portuguesa. E os portugueses, esses colonizadores maldosos, retribuem com o busto de outro monumento de nossa língua, Padre António Vieira. O correto seria chamá-lo luso-brasileiro, mas a verdade é que Antônio Vieira era brasileiro já que nasceu em Lisboa, mas chegou ao Brasil colônia com cerca de seis anos, passando a maior parte de sua vida no Brasil, tendo morrido em Salvador em 1697.
Se não conhecêssemos a esquerda pequeno-burguesa, contaminada pelo identitarismo, poderíamos dizer que é espantoso que um projeto obscurantista como esse tenha vindo de vereadores da esquerda. Nenhuma loucura identitária da esquerda espanta, o nível cultural e político é cada vez menor.
Em tempos normais, veríamos a esquerda defendendo que as obras culturais do nosso povo e da humanidade em geral devem ser preservadas, agora, querem tacar fogo em tudo.
Padre Vieira foi um monumento da literatura em língua portuguesa. Apenas isso já seria mais do que suficiente para que ele fosse estudado, homenageado, idolatrado como tal. Mesmo se ele tivesse sido um defensor da escravidão, como afirmam os ignorantes, isso não mudaria nada. O problema é que, ao contrário do que os ignorantes inventaram, o Padre António Vieira foi contra a escravidão, dentro, logicamente, dos limites de seu tempo.
Mais ainda, por várias posições progressistas em sua época foi perseguido pela Santa Inquisição e esteve muito perto de ser queimado na fogueira.
Quem diria que séculos depois, uma câmara cheia de vereadores insignificantes, fosse concluir o trabalho da Inquisição e promover a queima de António Vieira.