A ação russa na Ucrânia evidencia mais uma vez quão frágil está o regime imperialista. Em outros tempos, haveria uma reação militar dos EUA e da Europa.
Essa reação poderia desencadear uma guerra de amplas proporções. Lembremos que a I Guerra Mundial começou quando o arquiduque da Áustria foi assassinado e a II Guerra Mundial quando Hitler invadiu a Polônia. Mas agora o imperialismo está tão enfraquecido que precisa calcular com muito cuidado se vale mesmo a pena entrar em uma guerra de grandes proporções.
A II Guerra Mundial foi o canto do cisne do sistema imperialista. De lá para cá, apesar de toda a dominação atroz, os países imperialistas têm visto seu poderio se reduzir significativamente. Inglaterra e França perderam quase todas as suas colônias logo após a Grande Guerra. Por sua vez, os EUA, que se asseguraram como a grande potência mundial após o conflito, não conseguiram seus objetivos na Coreia e foram humilhados no Vietnã.
Veio a crise de 1974, que abalou as estruturas econômicas do capitalismo de modo tal que até hoje não se conseguiu superá-la. A crise de 2008 – um aprofundamento da de 1974 – expandiu o calvário da burguesia mundial, que, desesperada, optou por uma fórmula semelhante à solução artificial dos anos 20: impulsionou movimentos fascistas e golpes de Estado que deram lugar a ditaduras no mundo todo.
Mas essa política se mostrou insustentável, pois a crise não se resolveu: pelo contrário, se aprofundou. O sintoma mais nítido dessa crise do imperialismo foi a derrota dos EUA e da OTAN no Afeganistão ano passado, para um bando de maltrapilhos esfomeados chamados talibãs.
A reação vigorosa da Rússia ao cerco da OTAN, “invadindo” a Ucrânia sem nenhuma resposta militar do imperialismo, é algo simplesmente espetacular. Deveria ser comemorada por toda a esquerda. Os líderes do chamado “terceiro mundo”, por sua vez, deveriam estar aplaudindo Putin. Ele fez o que qualquer governo soberano com poderio militar deveria fazer: afastar a OTAN e o imperialismo e deixá-los bem longe de seu território. A Rússia mostra o caminho a ser seguido.
Devido à sua tradição de buscar manter sob sua órbita (mesmo que na base da força) os países vizinhos, a Rússia de Putin tem um histórico de ações militares defensivas contra o imperialismo. Chechênia, Geórgia, Síria. Ele acaba de intervir no Cazaquistão para evitar um golpe imperialista. Mas a ação russa na Ucrânia pode indicar uma tendência e incentivar outros países a também partirem para as vias de fato a fim de resolver alguns de seus problemas pendentes com o imperialismo.
A China, ao contrário da Rússia, sempre tem procurado agir de maneira muito cautelosa e por debaixo do pano nessas questões. Mas, desde o Congresso de 2018 do Partido Comunista, o país tem modificado essa política. Percebendo os sinais de aprofundamento das tensões com o imperialismo, os chineses aumentaram a centralização do poder e eliminaram a limitação de mandatos do secretário-geral. Xi Jinping se fortaleceu e as expressões maiores de que a China não irá tolerar da mesma forma os arbítrios imperialistas em sua zona de influência são a repressão e controle da tentativa de golpe em Hong Kong em 2020 e a crescente ameaça do uso da força caso Taiwan continue sendo usada pelo imperialismo para desestabilizar Pequim. De fato, a ação de Putin na Ucrânia é um retrato do que Xi poderia muito bem fazer na ilha de Formosa, território chinês roubado pelo imperialismo.
Por outro lado, o fato de Vladimir Zelensky, presidente fantoche ucraniano, ter sido completamente abandonado pelas potências imperiais, é um aviso aos políticos que hoje se submetem como vassalos aos desígnios dos grandes monopólios. Há poucos dias, Juan Orlando Hernández, o ditador que comandou Honduras como uma colônia dos EUA, foi preso e Washington pediu sua extradição. Como já havia cumprido seu papel ─ e falhado, ao permitir que a oposição nacionalista voltasse ao poder ─, Hernández foi descartado pelo imperialismo e jogado fora.
Putin está testando os limites do imperialismo. Logicamente que isso não significa que a Rússia ou a China, ou qualquer outro país não alinhado com o imperialismo, possa fazer o que quiser sem retaliações militares. Quanto mais frágeis as estruturas do regime imperialista, mais agressivo ele se torna, como foi visto nos anos 20 com a promoção do fascismo e a II Guerra ou no último período com a onda de golpes de Estado. Mas isso não passa de medidas paliativas que, portanto, não resolvem o problema central de crise estrutural e terminal do sistema capitalista. A II Guerra só não terminou com a vitória da revolução proletária na Europa por causa das traições do stalinismo.
A grande burguesia internacional vai entrando em uma sinuca de bico cada vez mais aguda. A única e verdadeira solução para o impasse, ou seja, a resolução necessária para esse conflito, é a revolução proletária.
Podemos pensar o que quisermos de Vladimir Putin. Mas, objetivamente, a “invasão” russa é uma operação militar de libertação nacional da Ucrânia e, em menor medida, da própria Rússia e dos outros países do leste europeu, porque enfraquece a opressão imperialista na região. É uma operação extremamente progressista. Após essa operação, o imperialismo terá sido derrotado na Ucrânia. Em verdade, essa derrota do imperialismo o enfraquece a nível mundial, como o foi no Afeganistão.
Logo, a Ucrânia é um novo sintoma dessa fraqueza. Em pouco mais de seis meses, duas derrotas catastróficas para os imperialistas. Isso significa que o sistema imperialista está ruindo aceleradamente diante dos nossos olhos. Mas não devemos ser apenas espectadores, e sim agir no sentido de influenciar o máximo possível essa tendência. Por isso é preciso prestar todo o apoio à Rússia, ao Afeganistão, à China e a todos os países que estão em contradição com a expansão do imperialismo. Bem como é preciso enfraquecer a dominação imperialista sobre o Brasil, lutando para colocar no poder um governo anti-imperialista. Essa é a luta fundamental da esquerda.