Na última quarta-feira (24), aconteceu, embora passado despercebido pela maioria do povo, a lockdown nacional das centrais sindicais. Como já era esperado, o lockdown nacional, vendido também como um dia nacional de luta, não causou impacto algum no que diz respeito à mobilização dos trabalhadores contra o governo Bolsonaro. No fim das contas, a atividade só serviu para reafirmar a política de frente ampla de um setor da esquerda nacional com João Doria e toda a direita golpista, conforme será provado no presente artigo.
Antes de tudo, é preciso esclarecer o termo centrais sindicais, utilizado maliciosamente pela imprensa burguesa e pela burocracia sindical para dar alguma legitimidade a inimigos da classe operária. Historicamente, uma central sindical é uma organização que reúne o conjunto dos sindicatos de um país a partir de um determinado movimento real. A central sindical não é uma instituição do Estado ou mera formalidade, mas sim um estágio da consciência política da classe operária. É formada, justamente, quando os trabalhadores, diante de necessidades concretas, evoluem da luta econômica para a luta política e se deparam com os limites da atividade sindical localizada.
A Central Única dos Trabalhadores (CUT) corresponde a essa definição de uma central sindical. A CUT foi construída em meio a um gigantesco movimento, com características revolucionárias, que foi a luta contra a ditadura militar e pelas reivindicações operárias contra os patrões e a ditadura por eles apoiada. Na prática, a justificativa para a formação de uma central sindical seria organizar a greve geral dos trabalhadores — bem ou mal, a CUT já fez isso várias vezes desde sua origem. As demais centrais — CTB, UGT, Força Sindical, CSP/Conlutas etc. — são, portanto, centrais sindicais de brinquedo, que servem para que um grupinho de burocratas controle uma pequena parcela de sindicatos e, com isso, procure se opor à política da Central Única dos Trabalhadores. Ora, se nenhuma dessas centrais é capaz de organizar uma greve geral, deveriam apoiar a CUT. Não apoiam e fazem questão de manter uma independência porque, no fim das contas, sua existência está justificada pela necessidade dos patrões controlarem o movimento operário.
Esse controle patronal se dá desde maneira muito direta — como é o caso da Força Sindical e da UGT, ligados a partidos de direita e que são abertamente financiados pelos patrões — ou de maneira mais velada — como é o caso da CPS/Conlutas, que procura se mostrar como radical, mas que está sempre alinhada dos pelegos e da política da direita. Sempre que o leitor ouvir falar em unidade das centrais sindicais, deve, portanto, entender como uma tentativa dos patrões, puxando a corda de suas marionetes, impedir que a CUT expresse a tendência de luta dos trabalhadores.
Dito isso, debatamos a proposta, em si, do lockdown nacional. Segundo o sítio da CUT, a atividade consistiria, na verdade, em uma grande “live” com representantes das centrais sindicais, além de “panfletagens em praças públicas, terminais de ônibus, trens e metrô, carros de som com mensagens de alerta ao povo brasileiro; atos simbólicos; audiências públicas, além de carreatas [e] mobilização nas redes sociais”.
O fato de que a CUT tenha concordado em participar de uma atividade tão ridícula apenas demonstra o quanto os seus dirigentes estão distantes da realidade enfrentada por suas bases. Os trabalhadores não estão fazendo “lockdown” — que sentido, então, teria a CUT de organizar um lockdown nacional? Assim o fazem são, em grande parte, a expressão do modo de vida e das impressões e medos de outro setor social: a pequena burguesia e a aristocracia operária.
Os dirigentes sindicais não estão trabalhando na pandemia. Pelo contrário: em um gesto criminoso, trancaram os sindicatos enquanto os trabalhadores morriam aos montes porque não podiam ficar em casa. Hoje, com o País registrando 3 mil mortes diárias, a situação permanece.
O fato é que, segundo pesquisa do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), 86% dos trabalhadores empregados — quase 80 milhões de pessoas — não são capazes de fazer home office. Isto é, trabalham em empregos que exigiriam a presença física de seus funcionários. E mesmo os que poderiam fazer home office, não estão, necessariamente fazendo uso do isolamento social. É o caso de categorias como os bancários, que, por causa das metas criminosas e outras loucuras impostas pelos banqueiros, acabam preferindo trabalhar nas agências do que em casa.
O lockdown nacional não teve impacto, finalmente, porque foi incapaz de envolver a classe operária, que não vive no aquário de suas direções pequeno-burguesas. No entanto, é preciso destacar o conteúdo político desse tipo de atividade. De fato, a CUT deveria organizar protestos para que as autoridades decretassem o isolamento social. Mas esse isolamento social não pode ser feito como as centrais fizeram, isto é, “fique em casa se puder”. É preciso chamar uma greve, uma mobilização real, que tire os trabalhadores de seus postos de trabalho e obriguem os capitalistas a arcar com a crise sanitária e econômica, para o que seria necessária uma luta real, uma mobilização dos trabalhadores com seu métodos de luta.
É uma política, portanto, que serve apenas à demagogia. E não a demagogia com a classe operária, pois a reivindicação geral da atividade é antidemocrática — “fique em casa, sem comida e sem salário, ou será preso”. Trata-se da demagogia com os seus setores mais atrasados que tem como ficar em casa, e com a direita golpista, no caso de João Doria, exatamente esse programa.