Eu gosto de rivalidades no futebol; em verdade elas são o tempero desse esporte. Costumo dizer que o futebol se tornaria absolutamente desinteressante não fosse pela disputa irracional e apaixonada que se trava dentro e, muito mais, fora do campo. Duvido que, se o futebol fosse tão somente um espetáculo artístico e acrobático, teria qualquer importância social. Não é pelos dribles, os gols, as vitórias e os campeonatos, mas pela disputa e pela identificação que fazemos com as cores do nosso clube. Por isso as brigas de torcida, os xingamentos, as ameaças, a raiva, as ofensas, as lágrimas nas vitórias e o ranger de dentes nas derrotas. É dessa matéria bruta que vive o futebol. Ele tenta se equilibrar entre a racionalidade que o humaniza e a animalidade que o faz pulsar. Porém, onde estas forças conflitantes mais se expressam, e de forma mais evidente, é nos clássicos, nas disputas entre grandes rivalidades, e por esta razão acredito que o futebol é o grande espetáculo esportivo planetário por causa dessas disputas domésticas.
Ou seja, a rivalidade é o que dá vida e cor ao futebol, e isso só pode ocorrer quando existem times que disputam com paridade de forças a supremacia em um Estado ou de uma cidade. Desta forma, eu achei ótimo que o Botafogo tenha sido campeão da Libertadores em 2021, pois o antigo clube de “General Severiano” era o único clube grande do Rio de Janeiro que não tinha conquistado esse título. Apesar de ver muitos cariocas bravos e azedos com a vitória do rival, tenho certeza que essa vitória acenderá ainda mais a disputa entre eles, tornando os próprios adversários – que agora estão de cabeça quente – ainda mais interessados em vencê-lo. Tive o mesmo sentimento quando o Galo venceu a Libertadores de 2013, pois até então só o Cruzeiro tinha o título continental. Da mesma forma, fiquei feliz quando o Athlético Paranaense foi campeão nacional em 2001, pois no Estado do Paraná só o Coritiba tinha um título brasileiro até aquela data.
E vou além: até no meu Rio Grande do Sul, apesar de ter secado o Internacional, acho que a conquista das Libertadores por eles fez o meu Grêmio se esforçar mais ainda para conquistar o inédito tricampeonato. Assim, essas vitórias do adversário e rival podem doer quando ocorrem, mas elas são o combustível que alimenta os clubes a superarem suas dificuldades para ultrapassarem o coirmão. O que eu acho lamentável é a disparidade insuperável, quando clubes irmãos se afastam, quando um time enfraquece a ponto de não ser mais competitivo. A gente torce contra nossos adversários domésticos, faz mandinga, debocha e “toca flauta”, mas o fã consciente sabe que os rivais, na verdade, são irmãos e nossa existência como torcedor depende da energia que esta disputa nos proporciona.