Uma das lições reforçadas em 13 anos de campanha pelos pisos estaduais em Santa Catarina, foi a de que é no estabelecimento do preço da força de trabalho que, de forma mais crua e direta, vem à tona a contradição entre os interesses dos capitalistas e os dos trabalhadores. Nesse sentido, o movimento sindical catarinense nesses anos de negociação dos pisos, reforçou sua percepção de que o melhor instrumento para os trabalhadores evitarem que a exploração se torne uma superexploração é manter sindicatos fortes, que defendam genuinamente os interesses da classe trabalhadora.
Como é conhecido, o surgimento do sindicalismo no Brasil carrega as características de um país cujo capitalismo se desenvolveu de forma tardia e atrasada, no qual predominava o capital agrário, após quase 400 anos de regime de brutal escravidão. A organização de uma estrutura sindical é registrada em 1903, entidade ligada, como seria de se esperar, à agricultura e pecuária. A normatização do trabalho é muito recente no Brasil. Na revolução de 1930, que teve como líder Getúlio Vargas, o Brasil não tinha direitos. O Ministério do trabalho foi criado em (1930), o trabalho das mulheres foi regulamentado em (1932) e o salário-mínimo foi criado em 1938 (e começou a ser pago em 1940).
Os sindicatos surgem, assim, atrelados ao Estado, com o objetivo, dentre outros, de mantê-los sob “rédea curta”. Dentre outras exigências, inclusive, os sindicatos só eram reconhecidos pelo Ministério do Trabalho, o que fornecia do Estado grande poder de controle das entidades. Não havia liberdade e autonomia sindical.
Na condição de primeira e mais importante linha de defesa do trabalhador, os sindicatos se movem, historicamente, sob violento fogo cerrado. Além dos ataques patronais, há inúmeras outras dificuldades no trabalho de sindicalização e de arregimentação de pessoas para o trabalho coletivo. No mundo todo há uma mobilização dos trabalhadores que pode ser considerada de baixa intensidade, que impacta bastante o trabalho de sindicalização e ação geral do sindicato. Essa é uma situação que pode começar a mudar (como estamos vendo pelos acontecimentos atuais na França), mas, por enquanto os sindicatos estão sendo obrigados a “remar contra a correnteza”.
A sistemática desqualificação dos sindicatos em geral torna muito difícil os trabalhadores enxergarem a importância que exerce o sindicato nas suas vidas. A cultura de valorização do indivíduo, tão cultivada na sociedade, leva os trabalhadores em geral a achar que conseguem resolver seus problemas solitariamente, sem a ajuda do sindicato ou de outras formas de organização coletiva. Uma parcela dos trabalhadores imagina que se trabalhar muito mais do que a média conseguirá ser reconhecida pela empresa e subir profissionalmente, sem precisar da ação coletiva do sindicato. E isso é verdade. O problema é que a fórmula funciona para um trabalhador em milhares. Analisada a história com atenção, constataremos que todos os direitos existentes são frutos das lutas coletivas dos trabalhadores.
A vida duríssima do trabalhador (desemprego, baixos salários, péssimas condições de trabalho etc.), dificulta que ele pare para refletir sobre questões de grande importância. A situação é tão desfavorável que o trabalhador nem quer parar para ouvir os argumentos dos sindicalistas, independentemente do assunto. Dessa forma, textos e materiais em geral produzidos pelo sindicato não são lidos pela maioria dos trabalhadores. Ou por falta de tempo, medo, desinteresse, falta de curiosidade etc. Também o assédio moral e a superexploração dificultam muito o trabalho dos sindicatos.
O trabalhador, pressionado pelo conjunto de dificuldades, muitas vezes espera do sindicato vantagens de caráter assistencialista, as quais a entidade não consegue oferecer, por crescentes limitações financeiras. É certo que o assistencialismo não deve ser praticado pelo sindicato como um fim em si mesmo. A assistência não é função da entidade sindical, que nem dispõe de recursos para praticá-la. Porém, dada a extrema gravidade da crise econômica atual, de desemprego recorde e franco empobrecimento da classe trabalhadora, se o sindicato dispuser de condições, penso que ele deve amparar o trabalhador em suas dificuldades. Não existe ação sindical em meio à fome.
Não me refiro à assistência social tradicional, acrítica e como um fim em si mesmo. É uma ajuda que o sindicato pode prestar ao trabalhador desempregado de sua base, se isso não ameaçar a sua própria sobrevivência. Mas sempre vinculando a referida ajuda a um processo de formação básica sobre sindicalismo, deixando claro para o trabalhador que sua situação não é uma fatalidade, e sim resultado direto da exploração que ele sofre.
Uma grave dificuldade da ação sindical é que, historicamente, há uma sonegação à população em geral e à juventude, da história dos direitos e dos sindicatos. Isso ocorre na escola tradicional, nas instituições, nas empresas, nos meios de comunicação etc. A história em geral é desconhecida, mas principalmente a história dos trabalhadores. Em consequência, uma parcela significativa da população, especialmente a juventude, supõe que os direitos existentes “caíram do céu”, ao invés de serem frutos de décadas de muita luta. Essa visão a-histórica dos direitos, por ironia, está sendo violentamente negada pela história recente, a partir do golpe de 2016, quando os direitos estão sendo destruídos em escala e velocidade industriais.
A tarefa de sindicalização requer conhecimento do sindicato e de algumas noções de economia e de política, que a maioria dos trabalhadores não dispõe. Um fenômeno que dificulta a sindicalização também é a política antissindical das empresas, com a disseminação de calúnias, associação do sindicato com desemprego, ou com corrupção etc. Isso dificulta muito porque a empresa exerce grande influência sobre o trabalhador, na medida em que a vida deste e de sua família dependem do emprego.