“O Brasil exige: prisão para Bolsonaro e os generais golpistas!”, pelo menos é o que diz a matéria com o mesmo nome publicado no portal Esquerda Online neste 9 de fevereiro. De qual Brasil estamos falando? Essa deve ser a nossa primeira preocupação, pois metade da população não deve concordar. O próprio autor da matéria é obrigado a admitir que “o bolsonarismo ainda preserva influência política e ideológica em amplas camadas da população”.
O texto do Esquerda Online demonstra toda a sua fé nas instituições do Estado burguês, por isso propagandeia que “a operação ‘Tempus Veritatis’ tem enorme importância”, acrescentando: “primeiro, porque comprova que houve uma longa e sistemática articulação golpista cujo desfecho foi a intentona de 8 de janeiro. Segundo, por demonstrar cabalmente que Bolsonaro e diversos membros da alta cúpula do seu governo comandavam o plano autoritário. Terceiro, por atingir o núcleo de generais bolsonaristas e, assim, revelar a extensa trama golpista no interior das Forças Armadas.”
É tão grande o crédito que esse setor da esquerda dá às ações da direita, que atestam: “o Brasil tem uma oportunidade histórica, que não pode ser perdida. O que nunca se deu no país antes precisa acontecer dessa vez: punição rigorosa para a cúpula política e militar envolvida numa tentativa de golpe de Estado. Isso deve significar, fundamentalmente, prisão para Bolsonaro e os generais golpistas. Se essa chance única for desperdiçada, o preço a ser pago pode ser, num futuro não muito distante, a ocorrência de um novo e exitoso golpe contra a democracia e o povo trabalhador”.
Quem pode acreditar que a Polícia Federal, o STF, que estiveram no núcleo da operação pela derrubada de Dilma Rousseff, estejam tentando prevenir um “um novo e exitoso golpe contra a democracia e o povo trabalhador”?
‘Xandetes’ de carteirinha
A degeneração política está tão avançada em determinados setores da esquerda pequeno-burguesa, que já vemos campanha aberta em favor um dos ministros mais autoritários do já nada democrático Supremo Tribunal Federal: “Alexandre de Moraes está à frente do processo que encurralou a direção golpista. Felizmente, até aqui, o Ministro, com apoio da maioria do STF, atua com firmeza e rigor no caso. Por sua vez, o governo Lula, corretamente, vem dando apoio às investigações”. – grifo nosso.
O Esquerda Online apoia ‘firmeza’ e ‘rigor’ no judiciário, por mais que essa instituição seja contra a classe trabalhadora. É mais ou menos algo como o condenado lutando para o carrasco ter uma corda nova.
Como se não bastasse o absurdo de apoiar o STF, o artigo pede que a classe trabalhadora e a esquerda fiquem a reboque dessa instituição golpista. Convoca os trabalhadores a saírem às ruas em favor de um dos setores da direita: “É fundamental que a ação em curso vá às últimas consequências. Mas, sem as ruas, ela pode ficar limitada e, talvez, ser derrotada. (…) a esquerda, os movimento sociais e o governo Lula não podem ficar assistindo ‘de camarote’ o desenlace desse processo, como meros expectadores. Estamos num momento crucial, que pode representar uma derrota qualitativa do fascismo no país. É hora de chamar o povo às ruas, exercendo pressão pela prisão de Bolsonaro e dos generais golpistas. É preciso mostrar que há mobilização popular para colocar na cadeia quem tentou estabelecer uma nova ditadura no país”.
“O Brasil exige”?
O corpo da matéria desmente o título bombástico, pois afirma que “levantamento da Quaest revelou que a ação da PF teve gigantesca repercussão na internet, alcançando mais de 50 milhões de pessoas em um único dia. Segundo a aferição, 58% das publicações foram contrárias a Bolsonaro e 42% a seu favor”. O que esses números dizem é que existe uma grande divisão no País. Se aplicarmos as margens de erro para mais e para menos, facilmente teremos um empate nos números apresentados. – grifos nossos.
Parte da esquerda não consegue entender o que está acontecendo nos Estados Unidos e daí tirar as conclusões políticas. Donald Trump, que está sendo alvo de inúmeros processos judiciais, só tem se fortalecido. Nada impede que o mesmo aconteça no Brasil.
A esquerda pequeno-burguesa vive a ilusão de que a prisão de Bolsonaro, ou mesmo de alguns militares, destruirá o bolsonarismo. O que estamos vendo é uma operação da própria direita com objetivos eleitoreiros. Não tem nada a ver com justiça ou luta contra eventuais tentativas de golpes.
Em vez dar uma alternativa política contra o bolsonarismo e contra a direita, a matéria quer que a esquerda seja fiadora da direita. Diz que “as frentes Povo Sem Medo e Brasil Popular podem e devem liderar a articulação dos movimentos sociais e estudantis e sindicatos, marcando um dia unificado de atos em todo país. O PSOL, o PT, o PCdoB e demais partidos da esquerda, assim como seus parlamentares e lideranças, podem e devem estar à cabeça da convocação de mobilização. É necessário unidade, coragem e ousadia! Contra o fascismo, é preciso mostrar força, golpeando-o duramente quando se abre a oportunidade.”.
Que espécie de alternativa é essa quando a direita está com todas as iniciativas? O que o artigo não quer confessar é o desejo de se formar uma “frente ampla contra o fascismo”. A mesma desculpa que utilizaram nas últimas eleições, quando se manobrou na tentativa de emplacar um candidato da direita fantasiado de ‘terceira via’.
A farsa do “tudo vai melhorar”
A matéria do Esquerda Online nos promete um mundo melhor se prisões ocorrerem: “Caso Bolsonaro e a cúpula militar golpista sejam rigorosamente punidos, o país terá imensurável triunfo democrático. Haverá melhores condições para a luta popular e de esquerda pelas transformações sociais necessárias.”.
Primeiro, teremos que acreditar que a direita golpista irá punir rigorosamente este ou aquele golpista. Segundo, temos de perguntar: Onde estavam esses setores antes da subida de Bolsonaro ao poder? Estavam lutando, mas pela derrubada de Dilma Rousseff; ora abertamente, ora fazendo jogo duplo e dividindo a esquerda.
A esquerda precisa combater politicamente a direita e o fascismo. Esse é um processo político e não judiciário. Fortalecer as instituições do Estado burguês, não importa sob quais desculpas, apenas prejudicará a classe trabalhadora e beneficiará seus inimigos, os que apoiaram e que agora se dizem contra Bolsonaro.
