Em artigo publicado pela Folha de S.Paulo, o jornalista Leão Serva, que mediou o debate entre candidatos a prefeito da cidade de São Paulo produzido pela TV Cultura, defende explicitamente que os órgãos de imprensa se unam para censurar candidatos. Segundo ele, se isso tivesse sido feito no século passado, o nazista Adolf Hitler não teria chegado ao poder.
Antes de entrar no mérito da questão, é preciso destacar o enorme cinismo do autor. O que determina o comportamento da imprensa? Por que a imprensa age de um jeito ou não de outro? Todo mundo sabe – ainda mais ele, que trabalha na imprensa burguesa – que o comportamento da imprensa corresponde aos interesses diretos de seus patrões. Isto é, do conjunto da burguesia brasileira.
Se a imprensa brasileira faz algo ou deixa de fazer algo, não é pela convicção de seus editores, é devido às ordens de seus patrões. Sendo assim, seria preciso dizer: é de interesse dos capitalistas que as eleições sejam um processo de fato democrático?
Não é e nunca foi. Desde que se estabeleceu o regime pós-ditadura militar, a grande imprensa se cartelizou para impedir que os partidos mais ideológicos e que os candidatos mais hostis aos interesses dos poderosos pudessem ter um maior alcance. Ninguém há de negar o papel decisivo da imprensa nas eleições de 1989, quando o direitista Fernando Collor derrotou a maior liderança operária do País, o hoje presidente Lula.
E também ninguém há de negar que o tratamento dispensado a partidos como o Partido da Causa Operária (PCO) é verdadeiramente criminoso. Os partidos que não possuem representação parlamentar nunca são chamados para os debates e suas entrevistas, quando ocorrem, são sempre menores que as entrevistas com os candidatos da burguesia. A grande imprensa é, neste sentido, sócia de um cerco tremendo aos direitos democráticos da população.
Voltemos, agora, à questão da imprensa e Adolf Hitler. Será que, como diz Leão Serva, os chefes de redação eram “ingênuos” à época e não sabiam que estava para vir uma ditadura monstruosa? Nada poderia ser mais absurdo.
Conforme o próprio Serva recorda em seu artigo, Hitler chegou a ser preso anos antes de tomar o poder. E foi preso não por um crime comum – mas por tentar dar um golpe de Estado. Que ele era “um líder político que promete atos disruptivos”, como diz Serva, já não era dúvida para ninguém. Mas por que, então, Hitler foi solto? Porque a classe dominante – a mesma que controla a grande imprensa – cegou a um acordo com Hitler. E, na medida em que os partidos do regime foram se mostrando incapazes de manter a situação sob controle, os capitalistas alemães decidiram, de conjunto, chamar Hitler para formar um governo.
Se o governo de Hitler era o governo dos capitalistas alemães, o que faz Leão Serva achar que a imprensa, que é totalmente controlada pelos capitalistas, atuaria no sentido de frear o crescimento do nazismo?
Já vimos que é ridículo, enquanto ideia, depositar as esperanças de um combate à extrema direita na grande imprensa. Agora, analisamos a questão de outro ponto de vista. Independentemente de ser viável ou não, trata-se de algo democrático?
É claro que não. Como já dissemos antes, a grande imprensa já controle os debates e as entrevistas. Já favorece descaradamente os seus candidatos. Defender que a Rede Globo, a Folha de S.Paulo e o SBT possam banir candidatos é apenas dar ainda mais poderes para uma máquina de censura. Fará apenas com que a burguesia seja ainda mais truculenta não no combate à extrema direita, mas no combate de tudo aquilo que ela considerar antagônico aos seus interesses.
Entre os interesses da Rede Globo e da extrema direita, as contradições são secundárias. Ambos são, no final das contas, parte da política burguesa. Entre a grande imprensa e os trabalhadores, no entanto, os interesses são inconciliáveis. E é neste sentido que alimentar o poder de censura da imprensa apenas levará a uma ditadura ainda mais profunda contra os trabalhadores.