De acordo com o blogueiro e sindicalista francês Vincent Présumey, no artigo Sobre a declaração de Lula sobre Gaza, publicado no blogue Arguments pour la lutte sociale, a esquerda não deveria celebrar a fala do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na Etiópia, quando comparou as ações de “Israel” contra os palestinos às ações da Alemanha Nazista contra os judeus. Segundo o autor, “o que Lula diz não permite uma defesa real dos palestinos”, pois seria necessário colocar sua fala em seu devido “contexto”. E que “contexto” seria esse?
O primeiro argumento levantado pelo francês é o de que Lula não mereceria qualquer confiança da esquerda porque fez sua declaração na Etiópia, um país que “se tornou um novo membro dos BRICS ampliados, com seu povo e sua terra entregues à exploração desenfreada de empresas frequentemente indianas, sauditas ou chinesas”. Logo de cara, Vincent Présumey expõe que sua oposição não é somente ao presidente brasileiro em si, mas ao conjunto dos BRICS, que, por sua vez, é o mais poderoso bloco de países atrasados organizados em oposição à ditadura do imperialismo.
Trata-se, obviamente, de uma calúnia contra os BRICS. O objetivo dos BRICS não é “explorar” o povo etíope, que já é muito explorado. É, na verdade, criar melhores condições econômicas para a Etiópia, uma vez que o país, como todos os países do mundo, é saqueado e sabotado pelo imperialismo.
Até esse ponto, pareceria que o blogueiro é apenas um esquerdista muito empolgado com a ideia de combater a burguesia, adotando uma posição equivocada porque deseja livrar a classe operária etíope da influência de qualquer classe de possuidores. Mas tal hipótese seria descartada logo em seguida.
Para Vincent Présumey, o grande crime de Lula na Etiópia teria sido o de se calar diante dos “crimes” de Vladimir Putin na Ucrânia:
“Contenção e moderação com seu amigo Putin: de fato, Lula nunca falou de um risco genocida em conexão com os apelos de Putin para acabar de uma vez por todas com a Ucrânia e os ucranianos, e os atos bárbaros massivos de suas forças na Ucrânia.”
Neste caso, não há margem alguma para confusão. A Ucrânia vive sob um regime nazista, sustentado por verdadeiras milícias fascistas, que estão no poder desde que ocorreu um golpe de Estado organizado pelos Estados Unidos em 2014. A guerra da Ucrânia é, hoje todos sabem, uma guerra por procuração entre um país atrasado, que é a Rússia, e a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN). Isto é, entre a Rússia e o imperialismo.
A colocação do blogueiro é tão ridícula que ele compara as ações concretas de “Israel”, que assassinou 13 mil crianças em quatro meses, com “apelos de Putin”. Apelos esses que qualquer pessoa que não esteja mal intencionada sabe muito bem que não visam o extermínio do povo ucraniano, mas o desmantelamento do regime nazista apoiado pelo imperialismo. O blogueiro, então, segue:
“Com o que a destruição contínua de Gaza pelo exército israelense realmente pode ser comparada? Não ao Holocausto, mas à destruição de Mariupol pelo exército russo em 2022.”
Não há como não interpretar essa frase que não como sendo uma defesa explícita do fascista Benjamin Netaniahu. Considerar que um Estado supremacista que bombardeia hospitais e prende arbitrariamente uma determinada população seja um genocídio seria um “exagero”. Ainda que “Israel” tenha sido responsável por criar um contingente de seis milhões de palestinos refugiados!
Gaza deveria ser comparada, portanto, com uma cidade em que o exército russo está combatendo outro exército, e não a população civil. E uma cidade, diga-se de passagem, em que o governo russo já se comprometeu com sua reconstrução, que deverá acontecer em até dois anos.
Em sua defesa dos interesses da OTAN contra a Rússia, o blogueiro francês também aproveita para comentar a morte do fascista Alexandre Navalni:
“Para colocar as palavras de Lula em contexto, devemos então compará-las com suas declarações feitas no mesmo dia no mesmo lugar pedindo ‘contenção’ e ‘moderação’ diante da morte do opositor russo Navalny, denunciando qualquer pessoa que, como milhões de russos e opositores da tirania ao redor do mundo, ousasse ligar essa morte às ações do presidente Putin.”
O fato é que nem o blogueiro sabe o que aconteceu com Navalni. E também não importa. Com um genocídio em marcha em Gaza, qual a importância do que aconteceu com o fascista Navalni, para quem os muçulmanos chechenos não passavam de “baratas”?
A posição de Lula é a mais razoável sobre o assunto: que se investigue, e não que se entre na histeria provocada pela mesma imprensa que se cala diante do massacre em Gaza.