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Modernismo

Índio de Mário de Andrade é mais brasileiro que ‘índio’ do Itaú

Índio escritor, "apoiado" pelo Itaú, critica o romance Macunaíma por "reforçar" preconceitos contra os índios

O herói sem apreço é o título de uma coluna escrita por Cristino Wapichana e publicada em 2021 pela revista Quatro cinco um, a revista dos livros, ligada à Folha de S. Paulo. Apesar de ter sido escrito há mais de dois anos, o texto é interessante por refletir a política do identitarismo para as questões da cultural nacional.

O autor se aventura a falar sobre a principal obra de Mário de Andrade e principal romance do modernismo brasileiro, Macunaíma. “Mário de Andrade reforçou em ‘Macunaíma’ o sentimento anti-indígena dos brasileiros, que quase um século depois persiste”, afirma Cristino Wapichana.

Em resumo, seriam dois problemas: 1) o povo brasileiro seria contra o índio; 2) Mário de Andrade contribuiu para que o brasileiro desenvolvesse ainda mais preconceito contra os índios. Vejamos os argumentos do autor do texto.

Sobre o primeiro ponto, o autor do texto não explica muita coisa. Limita-se a dizer que “os não indígenas” “acham que esses povos, cada um com sua língua e cultura, são todos iguais. Acreditam que são preguiçosos, sujos, selvagens, incultos, gente do passado que atrapalha o progresso por cuidar do lugar onde mora, por lutar para que seu berço não dê lugar ao agronegócio, a madeireiros, garimpeiros e grileiros que matam tudo o que mora nas florestas e nos rios e enchem seus bolsos de dinheiro enquanto piora o problema climático no mundo”.

Aqui há um problema sério. A reclamação injustificada de que através de Macunaíma Mário de Andrade trata todas as comunidades de índios como se fossem iguais vale – só que de verdade – para a colocação do autor do texto. Ele chama de “povo brasileiro” os latifundiários, grileiros, madeireiros e garimpeiros. Bom, até podemos considerar que esses grupos econômicos são parte do povo brasileiro, mas dizer que eles são o povo brasileiro é uma generalização que não cabe.

O autor não explica, mas deveria explicar por que o “povo brasileiro” tem um “sentimento” contra os índios se uma boa parte da cultura nacional foi desenvolvida sobre os aspectos formadores da cultura desses povos. Como pode uma sociedade que tem preconceitos contra índios se em todas as cidades do País há um número incontável de obras, ruas, monumentos, cidades batizados com nomes de índios. Se muitas palavras indígenas foram incorporadas no português. Se até mesmo o chamado “mito fundador” do povo brasileiro está baseado na presença do índio e de sua cultura.

O próprio romance de Mário de Andrade, mesmo se respeitadas as “grandiosas” críticas de Cristino Wapichana, é ou não é uma homenagem aos índios e sua cultura? Claramente é. Mas não só isso, é um romance considerado um dos mais importantes da língua portuguesa no século XX.

Assim, voltamos à pergunta: onde está esse “sentimento anti-indígena do povo brasileiro”?

Se a crítica é a de que a maioria dos índios são pobres, portanto, nesse aspecto, são marginalizados, isso não é um problema de “sentimento anti-indígena”, mas um problema social. Afinal, a maioria dos brasileiros também são pobres, brancos, negros, índios, amarelos.

E Mário de Andrade, onde é que ele teria errado tão feio que até ajudou a reforçar o “sentimento anti-indígena”, segundo acredita o autor do texto? Tentemos desvendar seus argumentos:

“Mário estava tão focado em falar das muitas facetas e gentes deste grande Brasil que não se deu conta de que Makunaima pertencia ao sagrado de alguns povos indígenas. A forma como descreveu Macunaíma reforçou o sentimento anti-indígena dos brasileiros, que ainda persiste 93 anos depois da publicação do célebre livro.”

Está certo, Mário de Andrade faz uma espécie de coletânea de vários aspectos da cultura brasileira no Romance. Entre esses aspectos, muito importante é o uso das lendas, do folclore, da cultura dos índios brasileiros. O “sagrado Makunaima”, como afirma o autor do texto, era uma dessas histórias que ele adapta, cola e desenvolve para chegar ao resultado final do livro, que é a ideia que o escritor tem da característica do povo brasileiro. No final das contas, o livro de Mário de Andrade é um enorme elogio a todas as culturas populares que são parte da formação da nacionalidade brasileira. Ao contrário do que Cristino Wapichana o acusa, trata-se de um sentimento “pró-indígena”.

“A mistura dos diversos personagens indígenas, como muiraquitã, ceuci e Tainakã, fortalece a ignorância e a falta de humanidade dos não indígenas, que acham que esses povos, cada um com sua língua e cultura, são todos iguais. (…) o livro reflete o desprezo da sociedade para com os indígenas e está carregado de estereótipos, racismo e preconceitos, marcas dos empoderados de pele clara.”

Os identitários querem acusar a sociedade brasileira de ser racista, mas eles não percebem, como não percebeu Cristino Wapichana, que uma sociedade racista defende essencialmente uma raça pura, no caso, a europeia, coisa muito distante da realidade cultural do povo brasileiro e do livro de Mário de Andrade, que defende o exato oposto de uma raça pura.

“Um povo sem identidade ou nacionalidade é um povo que tem vergonha de ter nascido de gente indígena e preta, estuprada pelos portugueses, e que mesmo depois da tal independência ou morte teve herdeiros brancos que continuaram dominando a política e as riquezas do país.”

Nesse trecho, o autor do texto resume a política antinacional dos identitários. O Brasil, ou melhor, o povo brasileiro não tem identidade porque é produto de estupros e crimes. Aqui, racista não é o povo brasileiro, mas a concepção apresentada no texto de Wapichana. Temos a impressão de que ele mesmo não se considera brasileiro, ainda que escreve seu texto em português e seja financiado pelo maior banco brasileiro, o Itaú, conforme nota ao final de seu texto: “Este texto foi feito com o apoio do Itaú Cultural”.

Nada como ter o apoio dos homens brancos mais poderosos do Brasil para falar mal do povo brasileiro. Todo o lero-lero inicial de seu texto falando sobre “ancestralidade”, religiosidade etc. é puro oportunismo para conseguir um espaço nos salões da “elite branca”. Ele aprendeu na universidade “dos brancos” a falar essas asneiras identitárias sobre a cultura nacional e começa a repetir uma teoria de branco (europeu e norte-americano) para os brancos aplaudirem. É triste, mas essa é a realidade.

Estamos diante de um esquema para demolir a cultura nacional. As ideias contra o povo brasileiro genericamente, contra a cultura nacional, avacalhando personagens da cultura e da história nacional, como o caso de Mário de Andrade e do Modernismo em geral, tudo isso foi criado onde? Nos escritórios imperialistas, e os objetivos são os mais podres que se possa imaginar.

A propaganda de que o Brasil não é um país de verdade, de que não tem “identidade”, nem nacionalidade, de que a sociedade brasileira é produto apenas de crimes, violência etc,, que o povo é ruim; tudo isso cheira à mesma campanha imperialista usada por “Israel” para roubar as terras dos palestinos. Guardadas as devidas peculiaridades, para o imperialismo, é sempre melhor dividir um povo para controlá-lo. Para isso, nada melhor do que uma propaganda demagógica, pretensamente a favor dos índios, mas cujo objetivo é roubar o território e as riquezas do País.

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