No artigo Lula só conseguirá dialogar com os evangélicos se aprender a falar em línguas estranhas, o articulista Ricardo Nêggo Tom, do Brasil 247, voltou a apresentar a sua tese de que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não deveria “dialogar” com os evangélicos. Por evangélicos, leia-se não os grandes pastores evangélicos, que de fato integram a burguesia brasileira, mas sim a totalidade da população evangélica. Isto é, 40 milhões de brasileiros!
Em seus textos, Nêggo Tom não especifica o que seria um “diálogo” com a população evangélica. Assumimos, portanto, que, na condição de presidente da República e maior liderança operária do País, quando Lula fala em “dialogar” com os evangélicos, ele está se referindo a travar uma luta política para que os evangélicos participem do movimento de trabalhadores ou, no mínimo, de seu governo.
É realmente incompreensível como tal movimento seja condenado por Ricardo Nêggo Tom. Se estivesse ele em uma fábrica, não discutiria com os trabalhadores evangélicos para lutar contra o patrão? E se a maioria fosse evangélica? Nêggo Tom nunca os procuraria para organizar uma greve? E do ponto de vista do governo? O presidente da República não deveria se preocupar em integrar 25% da população às suas políticas públicas? Não deveria saber quais são as suas demandas, não deveria buscar, na medida em que isto não afete a orientação geral de seu governo, satisfazê-las? Na prática, Nêggo Tom está dando aval para que um governo como o de “Israel” segregue os judeus dos palestinos, cedendo aos primeiros uma série de privilégios em relação aos segundos.
Passemos, agora, aos argumentos bizarros de Nêggo Tom. O primeiro deles é o de que “Adolph (sic) Hitler tinha admiração profunda por Martinho Lutero”, dirigente maior da reforma protestante, que inspiraria os grupos evangélicos vindouros. O que Nêggo Tom ignora, no entanto, é que Hitler era, na verdade, católico! E não é apenas isso: o Papa Pio XI se tornou conhecido como “o papa de Hitler”, tamanho o seu entusiasmo com o Führer.
Se formos partir dessa premissa, não é possível dialogar com absolutamente ninguém. Os judeus também “dialogaram” com Hitler, como é o caso de Abrão Stern, que, por várias vezes, tentou um acordo com o ditador nazista. É o caso dos muçulmanos: Amin al-Husseini, o mufti de Jerusalém, procurou um acordo com Hitler. É o caso, ainda, de Mahatma Gandhi, liderança hindu que se reuniu com Hitler e com Benedito Mussolini.
Por fim, Nêggo Tom argumenta que o avanço dos evangélicos pode ser facilmente contido ao acabar “com a imunidade tributária das igrejas e deixando de facilitar o surgimento de novas empresas que comercializam a fé e arrebanha mais alienados para o seu projeto de poder”. Ainda que a imunidade tributária das igrejas deva de fato ser combatida, essa colocação revela a mentalidade truculenta de Nêggo Tom. Para ele, as divergências políticas entre a esquerda e o pensamento conservador expressado por setores evangélicos deveria ser resolvido com a supressão dos evangélicos. É o raciocínio semelhante ao do Tribunal Superior do Trabalho (TST), organização que tenta acabar com o movimento sindical impondo multas.
O fim da imunidade tributária não irá deter em nada o “avanço” dos evangélicos, se é que está previsto que tal coisa ocorra. O movimento evangélico se sustenta fundamentalmente pela doação de seus fiéis: é um movimento fortemente ideológico. A solução, portanto, está justamente no contrário do que prega Nêggo Tom, está na luta política, na tentativa de incorporar os evangélicos nos movimentos de luta contra os poderosos. Do contrário, apenas estará dando mais munição para que a extrema direita coopte os evangélicos para seus fins.