Nos últimos tempos, poucas coisas têm sido tão assombrosas quanto a participação dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) em programas de entrevista. Esses onze senhores, cujo papel deveria se restringir a guardar os princípios constitucionais, se tornaram comentaristas da vida política nacional.
Em entrevista recente concedida ao Canal Livre, da Rede Bandeirantes, o decano Gilmar Mendes não decepcionou. Ao ser perguntado se a suspensão das redes sociais do Partido da Causa Operária (PCO) e do ex-deputado federal Marcos Cintra consistia em uma censura prévia, Mendes tergiversou e, finalmente, concluiu que essa história de proibir a censura prévia ficou “obsoleta”.
Os casos do PCO e de Marcos Cintra estão entre os mais escabrosos ataques à liberdade de expressão do último período. Após publicar mensagens e artigos propondo uma reforma democrática do Poder Judiciário, o PCO teve todas as suas redes suspensas por quase um ano inteiro. Já Marcos Cintra foi suspenso da rede social X (antigo Twitter) simplesmente por suspeitar – sem sequer fazer qualquer acusação – do funcionamento das urnas eletrônicas.
Qualquer tipo de sanção, em ambos os casos, já seria abusiva. O artigo V da Constituição Federal estabelece claramente que é livre a manifestação do pensamento, vedado o anonimato. No entanto, tudo se torna muito pior quando levado em conta que a punição ao PCO e a Marcos Cintra não foi apenas a censura das mensagens publicadas, mas também a censura de qualquer mensagem futura, uma vez que foram suspensos das plataformas. É um caso evidente de censura prévia. E, portanto, algo que vai de encontro ao artigo 19 do Marco Civil da Internet e à própria Constituição Federal.
Mendes falou da Alemanha, falou do Reino Unido, mas não disse o mais óbvio: que ele, como ministro do STF, deveria aplicar a Constituição, e não o que está sendo feito em outros países. Que ele, enquanto ministro do STF, deveria se restringir a aplicar a Lei, e não opinar sobre as leis aprovadas no Congresso Nacional.
A fala de Gilmar Mendes, vindo em mais um momento de tensão entre o Congresso e o STF, revivida pela decisão de Dino de suspender as emendas parlamentares, revela, uma vez mais, o caráter cada vez mais antidemocrático do Supremo. Constituído por onze ministros que não foram eleitos por ninguém, o STF é uma instituição controlada pelo capital financeiro que, em tempos de crise, passa por cima de todos os poderes constituídos para garantir os interesses de seus patrões.