O crime da privatização da Eletrobrás já começa pelo seu valor. O governo Bolsonaro, apoiado pelo Congresso Nacional, entregou uma das maiores empresas de energia do País por R$100 bilhões. Por esses números, é fácil concluir que não se trata da “venda” de uma determinada empresa para um capitalista, uma suposta operação para melhorar a “eficiência” ou para aliviar os cofres públicos. A dita “privatização” é um magnífico presente, uma verdadeira doação.
Somente no que diz respeito às finanças, Eletrobrás teve, no ano de 2021, um lucro líquido de R$4,1 bilhões. Considerando que se trata de uma empresa estatal, que redireciona parte de seus ganhos para seu próprio investimento, trata-se de um lucro bastante alto. E que, mantido como média, pagaria a “compra” da empresa em 25 anos!
Mas a privatização está longe de ser uma mera apropriação dos lucros anuais da Eletrobrás. Com a doação, o capital privado passa a ser dono de todo o patrimônio da empresa, o que, em termos de geração de energia, é extremamente valioso. Afinal, a Eletrobrás foi criada justamente para fazer o que os capitalistas não queriam fazer — construir.
Estima-se que o valor gasto para se construir a Usina de Itaipu tenha sido de 27 bilhões de dólares. Convertido para a moeda brasileira, seriam cerca de R$142 bilhões. É escandaloso. A Eletrobrás foi vendida por menos do que vale uma única de suas hidrelétricas!
As monstruosidades vistas na privatização da Eletrobrás derrubam por completo a falácia apresentada pela extrema direita de que o ex-presidente Jair Bolsonaro seria “nacionalista”. Afora os arroubos demagógicos, valendo-se sobretudo de polêmicas quando a esquerda nacional não soube apresentar uma posição, Bolsonaro se mostrou um verdadeiro lesa-pátria em seu governo, sendo a privatização da Eletrobrás, talvez, o seu maior atentado à soberania nacional.
A privatização da Eletrobrás, além de ter feito parte de um grande pacote do ex-presidente para a compra de votos, também foi uma das principais expressões da política neoliberal de seu governo, com a qual esteve comprometido desde o início, como condição da burguesia para que pudesse vestir a faixa presidencial. Essa política é perfeitamente representada pelo “Chicago boy” Paulo Guedes, seu ministro da Economia que nunca escondeu seu interesse em privatizar o país inteiro.
Felizmente, Paulo Guedes acabou não conseguindo as condições necessárias para implementar o seu programa dos sonhos, em virtude das contradições políticas do governo Bolsonaro. No entanto, o ex-ministro não teve pudor ao exibir seus planos ao público: conseguir R$ 3 trilhões de “investimentos” — como os R$ 100 bilhões da Eletrobrás — nos próximos 10 anos, pondo todo o patrimônio nacional em liquidação. Entre as principais doações, estariam 3.000 quilômetros de rodovias catarinenses, a ferrovia Ferrogrão, a concessão de rodoviais federais no Nordeste, o Porto de Santos e a usina Angra 3.
Desde que a direita começou a privatizar o patrimônio nacional, não houve uma única reversão importante. A Petrobrás está em vias de ser totalmente privatizada, a Vale do Rio Doce é uma empresa privada, a telefonia não tem nenhuma perspectiva de voltar ao controle do Estado, etc
É preciso, portanto, levar às últimas consequências a campanha pela reestatização da Eletrobrás e pelo controle da empresa pelos trabalhadores.
Essa política já havia sido prevista por Trótski em 1938, quando escreveu sobre a nacionalização do petróleo no México. Segundo o revolucionário, o processo de nacionalização — que seria semelhante caso Lula reestatizasse a Eletrobrás a partir de um movimento de massas — deve ser aproveitado como uma oportunidade dos trabalhadores se apresentarem e fazerem sua luta avançar. Isto é, de, mesmo em um governo capitalista, tomar a frente de posições “excepcionalmente importantes na indústria”, para que possam “liderar o ataque contra todas as forças do capital”.
A reestatização da Eletrobrás, além dos ganhos econômicos para o país, permitiria um avanço significativo para a classe operária em sua organização e na defesa de seus interesses, ainda mais em um período de instabilidade política, onde a burguesia pode, a qualquer hora, decidir partir para uma ofensiva contra o governo.