Em nota oficial, a presidenta nacional do Partido dos Trabalhadores (PT), Gleisi Hoffmann, afirma que “é estarrecedor ver Bolsonaro convocar um ato ‘em defesa do estado democrático de direito’ que ele nunca respeitou e tentou abolir em sua fracassada tentativa de golpe”. Hoffmann ainda destaca que “é chocante ver a mídia normalizar esse chamado e o próprio ato, tratando como coisa normal”.
Diferentemente de outros analistas, Gleisi Hoffmann não insinua que o ato convocado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que ocorrerá no dia 25 de fevereiro, seja ilegal, ou mesmo que seja uma tentativa de “intimidar” o Supremo Tribunal Federal. A crítica da presidenta do PT, portanto, é política: o problema não seria o direito de Bolsonaro convocar ou não um ato, mas sim que ele não teria legitimidade para fazê-lo.
De certo ponto de vista, a presidenta do PT tem razão. Bolsonaro é um notório defensor da ditadura militar. Uma figura que prometeu “fuzilar a petralhada” e matar “30 mil”. Não há como levar a sério que Bolsonaro seja um defensor do Estado democrático de direito, nem de qualquer direito democrático.
Não se trata somente de acreditar ou não nos interesses de Bolsonaro. Por ser um representante da extrema direita brasileira, Bolsonaro é, por sua própria posição, um inimigo dos direitos democráticos. A base de Bolsonaro são os policiais militares e o conjunto do aparato de repressão do Estado. A repressão é, portanto, parte intrínseca à sua política.
Apesar de tudo isso, não cabe apenas assinalar a contradição. Ao que tudo indica, milhares de pessoas irão atender ao chamado de Bolsonaro – isto é, acreditam que, de fato, Bolsonaro e a defesa dos direitos democráticos andam juntos. Sendo assim, Gleisi Hoffmann, como presidenta do maior partido de esquerda do Brasil, deveria perguntar: como isso se tornou possível? Por que quem hoje convoca atos pelos direitos democráticos são os representantes da extrema direita, e não a esquerda e o movimento popular?
As duas perguntas estão diretamente relacionadas. Bolsonaro apenas consegue fazer sua demagogia em torno dos direitos democráticos porque as maiores organizações da esquerda brasileira desistiram de defendê-los. Pior ainda: essas mesmas organizações passaram a atacar os direitos do povo em nome de uma suposta luta entre os bolsonaristas e a direita “civilizada”.
Não adianta apontar a incoerência do bolsonarismo sem explicar como se tornou possível que Bolsonaro se apresentasse como defensor da liberdade de expressão, entre outros temas caros para a esquerda. É preciso dizer com todas as letras: se a esquerda não apoiasse as medidas arbitrárias do Supremo Tribunal Federal, da Polícia Federal e do Tribunal Superior Eleitoral, Bolsonaro não poderia hoje se apresentar como perseguido.
Que o ato do dia 25 seja uma lição. Se a esquerda não mudar de política, fará com que o bolsonarismo cresça ainda mais.