Em sua propaganda, o Estado de “Israel” e o imperialismo tentam a todo custo emplacar a ideia de que não haveria uma nacionalidade ou mesmo um povo palestino. Contudo, toda a história de luta dos árabes originários da Palestina, luta esta travada por sua libertação nacional contra o domínio do imperialismo britânico e os avanços do sionismo antes mesmo da fundação de “Israel”, mostra justamente o contrário: existe, sim, uma nacionalidade e um povo palestinos.
Um dos eventos marcantes do desenvolvimento dessa nacionalidade, na primeira metade do século XX, foi o Congresso Islâmico Geral, ou o Grande Congresso Islâmico, que ocorreu em Jerusalém em 1931.
O congresso não se tratou de um raio em céu azul. Foi precedido de mais de uma década de luta dos palestinos contra os britânicos e seus lacaios, os sionistas, luta esta que começara já com o término da Primeira Guerra Mundial.
Tanto é assim que, no período que precedeu o Congresso Islâmico Geral, ocorreram sete congressos realizados pela população árabe-palestina, os quais eram organizados por uma rede nacional de Associações Muçulmanas-Cristãs, as quais foram estabelecidas na Palestina Britânica, com a derrota do Império Otomano, pelo Império Britânico.
Desde o início, os palestinos já mostravam oposição ao imperialismo britânico e ao sionismo, de forma que, no Primeiro Congresso, realizado no ano de 1919, também em Jerusalém, demandou-se a revogação da Declaração de Balfour, através da qual o imperialismo britânico havia declarado seu apoio expresso ao sionismo. Isso, todavia, foi rejeitado expressamente pelo Congresso, o qual declarou que aceitaria ajuda dos britânicos, apenas e tão somente se isto não implicasse em violação à soberania da Palestina. Ademais disto, foi demandada a inclusão da Palestina com “parte integrante do […] Governo Árabe independente da Síria dentro de uma União Árabe, livre de qualquer influência ou proteção estrangeira”.
E este foi apenas o primeiro. A ele seguiram-se os seguintes:
- Segundo Congresso – realizado em segredo na Palestina no dia 31 de maio de 1920, segundo o historiador judeu israelense Ilan Pappé. Nele, foi emitido um protesto contra a decisão da Conferência de San Remo, de conceder à Grã-Bretanha um mandato sobre a Palestina;
- Terceiro Congresso – datado de 4 de dezembro de 1920, em Haifa;
- Quarto Congresso – ocorreu em Jerusalém, em 25 de junho de 1921;
- Quinto Congresso – realizado na cidade de Nablus, em 22 de agosto de 1922;
- Sexto Congresso – Jaffa, de 16 a 20 de junho de 1923.
- Sétimo Congresso – Teve lugar em Jerusalém, no ano de 1928, em 2 de junho.
Em todos os congressos que seguiram ao segundo, as reivindicações nacionalistas dos palestinos, ou seja, de oposição aos britânicos e ao avanço do sionismo, foram crescendo.
E então, no ano de 1931, ocorreu o Congresso Islâmico Geral, novamente em Jerusalém. Segundo o historiador palestino Abdul-Wahhab Kayyali, foi a maior conferência de todas. “Esperava-se que o Congresso Islâmico concentraria a opinião muçulmana internacional no problema palestino que surgiu após os incidentes de Buraq em 1929”, diz Kayyali, em seu livro Palestina: uma história moderna, complementando que “a perspectiva de um Congresso Islâmico mundial em Jerusalém especificamente convocado para demonstrar solidariedade com os árabes-palestinos irritaram os sionistas”.
O principal nome do Congresso era o líder palestino nacionalista Mohammad Amin al-Huseini, que eventualmente teria papel fundamental na liderança da Revolução de 1936, e que seria exilado da Palestina em razão disto até o final de sua vida.
No Congresso, declarou-se “santidade da Mesquita de al-Aqsa e seus arredores, o Buraq [Muro das Lamentações], e a importância central da Palestina para o mundo muçulmano”. Foi também denunciado o “sionismo e as políticas britânicas na Palestina” e o “imperialismo do Ocidente [incluindo da Inglaterra] em todas as terras muçulmanas”. Ademais disto, propôs-se a construção de uma “Universidade Islâmica – A Universidade da Mesquita de Al-Aqsa – e uma Companhia Islâmica de Terras para impedir que terras árabes caíssem nas mãos do sionismo”.
Em suma, propostas que mostravam o desenvolvimento da nacionalidade palestina. Contudo, as declarações e resoluções do Congresso viraram letra-morta, pois, apesar do esforço de al-Huseini em angariar recursos para pôr em prática as decisões, o restante do Comitê Executivo não foi adiante com elas. Afinal, segundo Abdul-Wahhab Kayyali, o já citado historiador palestino, tal órgão estava vinculando aos “muçulmanos ricos”, os quais eram influenciados pelos britânicos.
Trata-se de um problema de classe que se revelaria mais agudo durante a Revolução de 1936 e seria fundamental para a sua derrota: dado o nível de desenvolvimento econômico da Palestina à época, a Revolução fora dirigida por uma aristocracia palestina, de senhores de terra chamados Effendi, a maioria dos quais, cooptados pelos britânicos, trairiam as massas e a Revolução, salvo raras exceções, como o próprio Huseini.
De qualquer forma, o Congresso Islâmico geral foi um importante capítulo da história do povo Palestino, e um dos vários episódios que serve para demonstrar que, de fato, existe uma nacionalidade palestina, a qual vem se desenvolvendo há mais de um século, em luta incessante contra o imperialismo e o sionismo.