Em 1948, o imperialismo declarou a fundação do Estado de “Israel”. Um documento fundamental que expressou esse apoiou foi o Plano de Partilha da ONU (Resolução 181), do ano anterior, 1947. Ocorre que, não foi apenas os países imperialistas que deram seu apoio ao sionismo para que realizasse uma limpeza étnica da Palestina. A União Soviética, que a essa época já estava sob o controle da burocracia stalinista há mais de duas décadas, também permitiu a criação de “Israel”.
Contudo, é necessário frisar que houve uma época em que a posição do Estado Operário Russo e da Terceira Internacional (Internacional Comunista/Comintern) era expressamente contrária ao sionismo; isto é, quando a República Socialista Federativa Soviética da Rússia era dirigida pelos revolucionários bolcheviques que estiveram à frente da Revolução de Outubro, em especial Lênin e Trótski.
A posição antissionista foi expressa no Segundo Congresso Mundial da Comintern, que foi de 19 de fevereiro a 7 de março de 1920. Está expressa na seguinte declaração:
“É essencial constantemente expor e explicar às massas mais amplas dos trabalhadores em todos os lugares, e particularmente nos países atrasados, a decepção praticada pelas potências imperialistas, com a ajuda das classes privilegiadas nos países oprimidos, ao criar Estados politicamente independentes que, na realidade, são completamente dependentes delas econômica, financeira e militarmente. Um exemplo gritante da fraude praticada contra as classes trabalhadoras de uma nação oprimida pelos esforços combinados do imperialismo da Entente e da burguesia dessa mesma nação é oferecido pela empreitada sionista na Palestina (e pelo sionismo como um todo, que, sob o pretexto de criar um Estado Judeu na Palestina, na verdade entrega o povo trabalhador árabe da Palestina, onde os trabalhadores judeus formam apenas uma pequena minoria, à exploração pela Inglaterra). Nas condições internacionais atuais, não há salvação para nações dependentes e fracas, exceto como uma aliança de repúblicas soviéticas.”
A declaração acima fez parte das Teses Sobre a Questão Nacional e Colonial, adotadas pelo Segundo Congresso. E, como pode ser constado, deixa cristalino que o sionismo corresponde a um instrumento do imperialismo (à época o britânico, principalmente) para dominar a Palestina. A pretensa defesa dos judeus contra qualquer tipo de antissemitismo, seja praticado por meio dos pogroms do Leste (que, à época, já haviam sido desbaratados pelos bolcheviques, com a tomada do poder), seja pelo antissemitismo na Europa Ocidental e a vindoura perseguição que seria desencadeada pelos nazistas; nada mais era do que uma fraude, uma demagogia por parte do imperialismo britânico, uma farsa para esconder seus reais interesses: o domínio da Palestina, tanto para fins políticos (manutenção do domínio sobre os demais países árabes), quanto econômicos (petróleo e rotas comerciais).
A posição adotada pelo Segundo Congresso da Internacional Comunista a respeito do sionismo era a única posição revolucionária. Nada mais natural, afinal, Lênin e Trótski ainda estavam vivos, e a burocracia stalinista ainda não havia tomado conta do Estado Operário e do aparato da Internacional (o que só viria acontecer a partir do Quinto Congresso, em 1924).
Deve-se notar o contraste entre essa política revolucionária, adotada pelo Segundo Congresso, e a política do stalinismo, de apoio ao Plano de Partilha, em 1947, e à criação de “Israel”, em 1948.
Especula-se quais a razões específicas do apoio de Stálin e da URSS à Resolução 181. É difícil saber uma resposta exata, dada a ausência de documentos. Mas sabe-se que, nessa época, Stálin ainda estava em “lua de mel” com o imperialismo, pois este necessitava da ajuda do burocrata contrarrevolucionário para conter a situação revolucionária em toda a Europa do pós-guerra.
Assim, em 14 de maio de 1947, o embaixador soviético Andrei Gromyko deu a seguinte declaração na ONU:
“Como sabemos, as aspirações de uma parte considerável do povo judeu estão ligadas ao problema da Palestina e da sua futura administração. Este fato dificilmente requer prova. Durante a última guerra, o povo judeu passou por tristeza e sofrimento excepcionais.
As Nações Unidas não podem nem devem encarar esta situação com indiferença, pois isso seria incompatível com os elevados princípios proclamados na sua Carta.
O fato de nenhum Estado da Europa Ocidental ter sido capaz de assegurar a defesa dos direitos elementares do povo judeu e de salvaguardá-lo contra a violência dos algozes fascistas explica as aspirações dos judeus de estabelecer o seu próprio Estado. Seria injusto não levar isto em consideração e negar o direito do povo judeu de realizar esta aspiração.”
A declaração foi seguida do apoio ao Plano de Partilha. E, quando da formalização do Estado de “Israel”, em 17 de maio de 1948, a União Soviética foi o primeiro país a reconhecê-lo formalmente como um Estado nacional.
Não bastando, Stálin e sua burocracia foram cruciais para a limpeza étnica da Palestina, ou seja, a expulsão de quase 1 milhão de palestinos de suas terras, processo para o qual foi necessária a destruição de suas propriedades, o assassinato de milhares e a tentativa sistemática de varrer da face da Terra a nacionalidade palestina. De que forma se deu essa contribuição da burocracia? Stálin ajudou esse processo genocida fornecendo armas e equipamentos militares para os sionistas, através da Tchecoslováquia, durante a “Guerra” de 1948, conforme já exposto neste Diário:
Como o stalinismo contribuiu para limpeza étnica dos palestinos
Assim, vê-se que quando os revolucionários (Lênin, Trótski e outros) estavam na direção do Estado Operário Soviético e da Terceira Internacional, havia uma política clara e revolucionária contra o sionismo, apontando-o como algo reacionário a serviço do imperialismo britânico, posição esta que, assim como as demais políticas revolucionárias, veio a ser modificada com a ascensão de Stálin e de sua burocracia ao poder, esta que causou a vitória da contrarrevolução e a degeneração do Estado Operário.