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Não se perdeu no personagem

Revolucionário na ficção, reacionário na realidade

Mark Hamill

Como alguém que trabalha com e escreve sobre tecnologia, era de se esperar que este colunista gostasse, ao menos um pouco, da série hollywoodiana criada por George Lucas, Star Wars. Tomo cuidado para falar “ao menos um pouco” porque sei que existem muitos fãs de verdade por aí que dominam o universo da franquia e que até mesmo expandiram-no, para desespero dos capitalistas administrando essa valiosíssima propriedade intelectual. Confesso que minha apreciação resume-se a ter assistido aos filmes e ter me divertido, ocasionalmente. Meu episódio favorito talvez seja o filme original, atualmente conhecido como episódio IV, seguido de perto pelo recém-lançado episódio VIII, com o qual fiquei surpreso em muitos aspectos, incluindo roteiro e fotografia, apesar do elenco não tão interessante.

Enfim, essa coluna não é sobre as minhas impressões sobre Star Wars. Há gente muito mais qualificada para escrever sobre o tema. Gostaria de extrapolar um pouco nosso costumeiro tema de tecnologia esta semana para escrever sobre um tweet  publicado pelo ator que interpreta o protagonista da trilogia original, Luke Skywalker, que chegou a mim com um pouco de atraso.

[novashare_tweet tweet=”https://x.com/MarkHamill/status/1711090386482127122?s=20″]

Mark Hamill, assim como a maioria das personalidades de Hollywood viu-se forçado a se posicionar diante dos acontecimentos no Oriente Médio. Apesar dos muitos méritos da internet e das redes sociais, um de seus principais deméritos é que pessoas públicas, de atores a jogadores de futebol, passaram a ser obrigadas socialmente a se posicionar sobre tudo, perdendo seu importantíssimo direito de ficarem calados. Enfim, Hamill declarou apoio eterno dos Estados Unidos a Israel.

Tive uma reação ambivalente ao posicionamento. Ao mesmo tempo que a declaração era de se esperar, vinda de um ator de blockbusters norte-americanos, fiquei surpreso com a posição de Hamill por seu papel na série de filmes. Luke Skywalker é um jovem pobre criado num país de clima desértico que decide juntar-se a um movimento de resistência que luta contra um poderoso império intergaláctico. Tão poderoso que construíram uma arma de destruição em massa capaz de destruir planetas inteiros, a Estrela da Morte.

No meio de sua empreita contra o Império, Skywalker descobre sua fé e transforma-se num guerreiro religioso (fanático, na minha opinião), que no universo do filme é conhecido como jedi. Seu principal ato no final do episódio IV é realizar uma manobra ofensiva super arriscada contra a Estrela de Morte que termina por explodir completamente o planeta artificial ceifando a vida de um milhão e meio de pessoas (segundo alguns estudiosos desse universo fictício).

Espero que minha descrição semi-irônica tenha deixado transparecer a intenção que tinha com essa coluna. Hamill interpreta em Star Wars um militante do Hamas, mas no mundo real os acusa de terrorismo e fica ao lado do imperialismo sionista. Costuma-se dizer que certos atores, quando começam a agir como seus personagens, “perderam-se no personagem”. Este não é um desses casos. Como será que Hamill conseguiu interpretar seu personagem? Será que mesmo a história sendo muito simples, o autor a entendeu?

Após escrever esse artigo não consigo deixar de pensar nas manchetes do império fictício. Certamente choraram a morte dos opressores no controle da Estrela da Morte. É curioso pensar que os espectadores do filme sequer pensam nas vítimas da ofensiva rebelde e provavelmente, como eu, celebram seu sucesso. Isso só é possível porque Star Wars conta a história do ponto de vista dos rebeldes, enquanto as páginas dos jornais imperialistas do mundo real só contam a história mentirosa do ponto de vista do império.

* A opinião dos colunistas não reflete, necessariamente, a opinião deste Diário

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