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Ascânio Rubi

Ascânio Rubi é um trabalhador autodidata, que gosta de ler e de pensar. Os amigos me dizem que sou fisicamente parecido com certo “velho barbudo” de quem tomo emprestada a foto ao lado.

Imprensa burguesa

O diploma de Lula e o projeto da burguesia

Qualquer tolice útil ao projeto da burguesia de ressuscitar o "centro" merece repercussão na imprensa

Carlos Alberto de Nóbrega, conhecido por ter passado a vida sentado no banco de uma praça cenográfica fazendo “escada” para humoristas populares, foi recentemente entrevistado no programa Roda Viva, da TV Cultura. A atração, comandada pela peessedebista Vera Magalhães desde 2020, é, pelo menos desde as vésperas do golpe de 2016, também uma espécie de praça, frequentada por jornalistas da imprensa da burguesia e por convidados dos quais se possam extrair declarações em favor dos interesses dessa classe.

Que contribuição poderá trazer a essa pauta o amigo da velha surda, que sempre terminava os esquetes irritado e rasgava o jornal que supostamente tentava ler? Fazendo coro com o antilulismo da imprensa, genericamente atribuiu à falta de diploma universitário do presidente da República os problemas do país (“Um homem que não tem um curso ginasial, universitário, contábil… ser presidente da República? Por isso o país está desse jeito”).

Essa tolice foi repercutida em grande escala pela imprensa burguesa (e pelos veículos de esquerda, que costumam seguir a pauta daquela), obrigando o presidente da República a emitir uma resposta. Embora sem responder diretamente, Lula disse, durante reunião do Mercosul, que “o fato de não possuir diploma de graduação no ensino superior não impossibilitou que ele investisse na educação em seus primeiros mandatos”.

Além disso, publicou no Twitter a seguinte mensagem: “Em 1918 a Argentina já tinha feito sua primeira reforma universitária e o Brasil não tinha sequer sua primeira universidade. Quando xingarem que o Brasil é um país atrasado, saibam que alguém quis que o país fosse assim. Quando eu e o Zé Alencar tomamos posse, nós não tínhamos diploma, mas tínhamos a consciência que nenhum país se desenvolve sem antes investir na educação”. Ao empresário, que foi vice de Lula, curiosamente nunca foi cobrado diploma universitário.

A expectativa da imprensa burguesa era que Lula escorregasse na casca de banana e, de alguma forma, desmerecesse o saber acadêmico, o que poderia ser desastroso, já que é apoiado pela esquerda universitária, ou, ao valorizar o diploma, assumisse uma fragilidade, corroborando o argumento de uma espécie de “aristoburguesia”.  Esse tipo de cilada, no entanto, não é novidade para Lula, devidamente formado na escola da vida, como ele próprio diz, e na política.

Antes de sua primeira eleição – e mesmo depois dela –, jornalistas passavam o pente-fino nas suas falas em busca de “erros gramaticais”. Recebido na Folha de S. Paulo pelo então diretor da Redação (o falecido Otavio Frias Filho), o então presidenciável teve de responder se falava inglês. O intuito era, naturalmente, humilhar o jovem nordestino que, nascido em família humilde, se tornaria um grande líder operário em São Paulo. Lula, porém, não estava em uma entrevista de emprego para trabalhar no jornal – e deu o fora.

A maior parte do povo brasileiro é submetida a esse tipo de humilhação. A estratégia serve para convencer as pessoas pobres de que suas condições socioeconômicas são fruto de sua incompetência, ocultando o fato de que, grosso modo, são o resultado da correlação de forças políticas. Para a burguesia, o governo é uma espécie de administração de empresa. Seria essa classe a dona da empresa (no caso, o Brasil), e o povo consistiria em meros empregados, que têm de se esforçar para melhorar o currículo.

Difícil para a burguesia é engolir um operário na presidência da República. O problema não é a falta de proficiência em inglês. Geraldo Alckmin, amado pela burguesia, só foi estudar inglês quando voltou ao magistério, depois de amargar derrota nas urnas e perder espaço no PSDB, antes de se tornar vice de Lula; Michel Temer, o golpista, também não sabe inglês; Sergio Moro, como a maioria dos brasileiros, finge que sabe, mas tropeça tanto no inglês como no português. A esses personagens, os jornais sempre estenderam o tapete vermelho.

A turma da Lava Jato se referia a Lula como “nove dedos” ou simplesmente “nove”, o que seria reproduzido pelos bolsonaristas. O dedo que Lula perdeu em acidente de trabalho – como ocorre com muitos operários – é um índice de classe. Chamá-lo de “nove dedos” não tem nada a ver com o “capacitismo” de que reclamam os identitários. É antes uma maneira de dizer que um ex-operário não poderia estar no comando da “empresa Brasil”.

Curiosamente, durante o governo Bolsonaro, a imprensa da burguesia – dia sim, dia não – transformava em matéria de jornal qualquer erro de ortografa cometido por membro do governo. Veja-se, a propósito, a jornalista Mônica Bergamo, uma das mais bem pagas do país, debruçando-se sobre um “z” no lugar de “s” na palavra “paralisação” escrita por um funcionário do governo. Isso sem considerar o fato de que erros desse tipo são comuns em toda a imprensa, inclusive na coluna assinada por ela.

A Revista Fórum, que se apresenta como veículo de esquerda, deu ares de matéria crítica a uma troca de sílabas de Bolsonaro, que se atrapalhou ao pronunciar a palavra “conclamar” (o texto reproduz em detalhes os tropeços silábicos do então presidente), fazendo uso do mesmo tipo de recurso usado pela imprensa burguesa contra Lula. Diga-se que o episódio figura, entoado na voz do professor Pasquale, no “Hino ao Inominável” (“Tentou dizer “conclamo” e disse “eu canclomo”;/ Não sabe conjugar o verbo “concl…amar”), composição de Carlos Rennó que elenca os malefícios de Bolsonaro. O clipe foi gravado em 2022 por um conjunto de artistas e ativistas da esquerda identitário-cirandeira.

Ao fazerem isso com Bolsonaro, todavia, não favorecem Lula – muito pelo contrário, pois os tornam similares. Ajudam, isto sim, a promover a “direita educada” e “bem-nascida”, que, com sua política, sempre explorou as riquezas do país em benefício próprio.

Diploma universitário, correção gramatical, fluência em inglês, tudo isso pode servir para alavancar o currículo. Para ser presidente do país – que não em uma empresa –, a história é outra. Esse tipo de matéria na imprensa tenta educar o eleitor “às avessas”, de modo que, em vez de votar nos candidatos de sua classe, que o representem de fato, eleja ingenuamente os “bem-nascidos”, cujo objetivo é vender o país para obter lucros pessoais.

Bolsonaro, embora seja de direita, foi atacado com a mesma estratégia usada contra a esquerda, o que se explica pelo fato de já ter cumprido o seu papel na “direitização” da sociedade. A direita “civilizada” não precisa mais dele e, ao que tudo indica, acha que pode ressuscitar a oposição PT/PSDB nos moldes antigos. Enquanto isso, qualquer tolice que seja útil a esse propósito será repercutida pela imprensa burguesa e por seus amigos “de esquerda”.

* A opinião dos colunistas não reflete, necessariamente, a opinião deste Diário

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