Na última quarta-feira (20), dezenas de milhares de argentinos saíram às ruas na capital Buenos Aires contra as medidas econômicas previstas pelo governo ultraneoliberal de Javier Milei, empossado dez dias antes da marcha. Convocada por sindicatos e por setores da esquerda, a manifestação, que culminou na frente da Casa Rosada, a sede da presidência argentina, protestava contra o primeiro pacote de “ajustes” anunciado pelo ministro da Economia, Luis Caputo, no dia 12. No mesmo dia da manifestação, foi anunciado um segundo pacote, ainda mais duro e extenso que o primeiro; ambos na forma de decreto.
Durante a sua campanha eleitoral, Milei defendeu uma repressão intensa contra aqueles que se levantassem contra as medidas econômicas destrutivas de seu governo, caso eleito. Não se tratavam de promessas eleitorais vazias. Dois dias depois das manifestações, o governo argentino, que mobilizara uma grande quantidade de membros do aparato repressivo estatal buscando intimidar os participantes, surgiu com a ideia de que seriam as organizações que participaram da manifestação as responsáveis por arcar com os custos relacionados a tal mobilização de policiais, totalizando sessenta milhões de pesos argentinos, cerca de trezentos e sessenta mil reais. Não se sabe ainda qual seria o método de cobrança.
Listemos todas as organizações que poderão ser cobradas pelo governo Milei: Polo Obrero, Corriente Clasista y Combativa (CCC), Movimiento Evita, La William Cooke, MTR 12 de abril, CUBA MTR, Libres del Sur, Darío Santillán, La Dignidad, El FOL, Barrios de Pie, Torres, MTE e Movimiento Patria Justa. Ou seja, estas foram as organizações identificadas por agentes do governo seguindo o “Protocolo de Ordem Pública” como participantes da manifestação do dia 20. Tal lista foi divulgada por Patricia Bullrich, que fora a candidata macrista no primeiro turno das eleições, e Manuel Adorni.
Trata-se de uma evidente medida ditatorial, em acordo com a caracterização do PCO, até o momento a única no meio da esquerda tanto brasileira quanto argentina, de que o governo Milei trata-se, na verdade, de um golpe de Estado.
Juan Carlos Alderete, líder da CCC, central sindical ligada ao PCR argentino, disse ao jornal burguês La Nación que “nós não marchamos no dia 20 de dezembro, hoje estão sendo realizados panelaços populares pelo país todo. Adorni se equivocou ao dizer que a CCC esteve na marcha. Não estivemos e nem a convocamos.” Ou seja, mesmo que digam coisas como “A resistência começará aqui na conurbação (Grande Buenos Aires)”, o grupo maoista capitulou antes mesmo de a luta começar. Além é claro de escapar completamente à organização o caráter do governo Milei, ainda não lhe caiu a ficha do que será este governo. É a receita capituladora da esquerda pequeno-burguesa, que não achou ser a hora de chamar o “Fora Bolsonaro” aqui no Brasil em 2019, e não acha ser a hora de lutar pela derrubada de Milei na Argentina.
As duas outras organizações que compõe “Los Cayetanos” junto à CCC, o Movimiento Evita e Somos Barrios de Pie, estas duas peronistas e cujos líderes participaram do governo Alberto Fernández, também disseram ao mesmo jornal que não haviam participado na manifestação nem a convocado. A essa altura dos acontecimentos, é fácil ver que o nacionalismo burguês capitulará vergonhosamente frente à direita, como o PT capitulou aqui quando prenderam Lula e fizeram eleger Bolsonaro. Não fosse só isso, os setores peronistas apontam em direção a uma “ampla frente antimileísta nas ruas”; ou seja, vão procurar infiltrar elementos direitistas na luta contra o governo Milei.
Até o momento da escrita desta matéria, somente o Polo Obrero e El FOL haviam confirmado sua participação nas manifestações do dia 20. Sem uma manifestação espontânea das massas argentinas, o governo Milei passará como um rolo compressor na Argentina, uma vez que o entendimento dos setores organizados da esquerda estão muito aquém do necessário para derrotar a duríssima investida neoliberal imposta pelo capital internacional na Argentina, pelo menos no momento.