Em seu artigo Lula quer que Marta seja o Alckmin de Boulos, publicado no dia 18 de dezembro pelo portal Brasil 247, o jornalista Alex Solnik demonstra todo o seu entusiasmo com a possibilidade da ex-prefeita Marta Suplicy, hoje filiada ao MDB, retornar ao Partido dos Trabalhadores (PT) para que seja candidata a vice-prefeita na chapa encabeçada por Guilherme Boulos (PSOL).
“Os petistas ortodoxos”, lamenta Solnik, “ainda torcem o nariz para ela, desde que votou a favor do impeachment de Dilma Rousseff e migrou para o MDB de Temer. O MDB a trata a pão-de-ló”. Lula, por sua vez, “entrou em campo para trazê-la de volta ao PT, custe o que custar”, afirma Solnik.
Não há confirmação de que Lula esteja de fato fazendo tal articulação. O que há são matérias de órgãos nada confiáveis, como a emissora CNN Brasil, que alega que “a possibilidade de Marta Suplicy (sem partido) como vice de Guilherme Boulos (PSOL-SP) na disputa pela Prefeitura de São Paulo é uma escolha pessoal do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT)”, mas se limita a citar como fonte “aliados do chefe do Executivo”.
A queixa dos “petistas ortodoxos”, por outro lado, é real. Não são poucos os comentários de filiados do Partido dos Trabalhadores que se revoltaram com os boatos em torno da ex-prefeita. Alguns dirigentes preferiram o silêncio – o que, neste caso, é uma demonstração de que não querem apoiar publicamente Suplicy. Mesmo Valter Pomar, que se mostrou favorável a uma aliança com a emedebista, criticou o seu regresso ao PT:
“O que ela fez em 2016, apoiando o golpe, foi uma violência inesquecível e imperdoável. Imperdoável, entre outras por uma razão muito simples: quem cruza determinadas fronteiras, não cruza uma única vez. Tê-la como aliada, na disputa pela prefeitura de São Paulo, pode fazer parte. Tê-la como ‘companheira’ de Partido, não faz parte.”
Mas o que também é fato, mas Solnik não diz, é que Boulos está contente com a possibilidade de ter Marta Suplicy como ministra. O psolista, ao ser questionado sobre tê-la como vice, falou que “respeitaria”, caso fosse essa a decisão do PT, e ainda a elogiou: “deixou marcas como CEUs, Bilhete Único e corredores de ônibus na periferia”.
É neste ponto em que fica claro que a análise de Solnik de que Marta seria um “Alckmin” para Guilherme Boulos é um erro. Comparar Marta com Alckmin não é de todo um erro: ambos apoiaram o golpe de 2016, ambos são políticos burgueses, ambos estão hoje filiados a partidos golpistas. O erro, no entanto, está em dizer que Marta está para Alckmin como Lula está para Boulos:
“Ele [Boulos], homem, ela [Marta] mulher. Ele inexperiente, ela veterana; ele radical, ela moderada; ele de esquerda, ela de direita. Pode parecer contradição, mas não é. Em relação a Nunes, ela é de esquerda; em relação a Boulos, de direita. Para Nunes, ela vai atrair os eleitores de esquerda; para Boulos, os de direita. Marta será para Boulos o que Alckmin foi para Lula.”
O papel de Alckmin na candidatura de Lula foi o de infiltrar um setor da burguesia em uma candidatura de forte apelo popular. Alckmin veio não para “somar votos” – afinal, teve 3% de votos em 2018 -, mas sim para fazer com que a candidatura de Lula tivesse um caráter mais moderado, mais direitista. Alckmin era o oposto da candidatura de Lula: um era o símbolo do golpe de Estado de 2016, defendido pelo PSDB, e outro era o símbolo da luta contra o golpe, da luta contra a Operação Lava jato.
Não é este o caso. Boulos, assim como Marta Suplicy, foi parte do golpe de Estado. Boulos fez pela “esquerda” o que Marta fez pela direita. Enquanto a ex-prefeita rompeu publicamente com o PT e foi para o MDB, partido do futuro presidente golpista Michel Temer, Boulos organizou a Frente Povo Sem Medo, para “rachar” a Frente Brasil Popular, e saiu às ruas com reivindicações que, em vez de ajudar a luta contra o golpe, colocava a população contra o governo.
Diferente da candidatura de Alckmin, que foi um grave erro e quase que impediu a vitória de Lula, a escolha por Marta Suplicy apenas termina por revelar o verdadeiro conteúdo da candidatura de Boulos: é uma candidatura conservadora, frequentemente apoiada por setores da direita, como o próprio PSDB, a Rede Globo e a Folha de S.Paulo, que está sendo imposta para levar o Partido dos Trabalhadores, no estado em que é mais bem organizado, à sua destruição.
Escolher Marta Suplicy para vice de Boulos não seria, portanto, uma grande novidade. No entanto, infiltrá-la no Partido dos Trabalhadores é que seria “corrigir” um erro com o outro: além de abrir mão da candidatura a prefeito, deixando o espaço livre para que um partido sem vínculo real com os trabalhadores cresça, o PT ainda dará boas-vindas em suas fileiras a uma figura que, até pouco tempo, conspirou pela derrubada do governo de Dilma Rousseff.