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Ric Jones

Médico homeopata e obstetra. Escritor, palestrante da temática da Humanização do Nascimento no Brasil e no exterior.

Revolução no parto

Revolução ou Reformismo

O foco precisa ser no bem estar de mães e recém-nascidos

maternidade

O século XX nos colocou diante de uma enorme reformulação na forma como entendemos as questões relacionadas à saúde e, em especial, como atendemos partos e nascimentos. Também, no outro extremo, passamos a questionar as maneiras de fechar o ciclo da existência; hoje em dia, morremos em salas altamente sofisticadas, em ambientes assépticos e rodeados de maquinário e tecnologia de ponta, onde antigamente havia tão somente a presença da família, dos amigos e dos amores. Em ambas as pontas do circuito da vida percebemos que a tecnologia invadiu de forma inexorável, prometendo a esses eventos mais segurança, ao mesmo tempo em que os desnaturalizava – e com isso os tornava paradoxalmente mais arriscados. Os nossos momentos mais marcantes sofrem uma perda crescente do contato com os aspectos mais sutis da vida – a nossa conexão com a natureza, nossas emoções e as relações amorosas que cultivamos – e, por esta razão, existe uma constante crítica aos caminhos que as sociedades contemporâneas traçaram para lidar com eles.

O Movimento de Humanização do Nascimento há muitos anos lança um olhar crítico às tendências da obstetrícia hegemônica, questionado o caráter intervencionista de suas práticas, que acabam por alijar as mulheres das decisões sobre seus próprios corpos e transformando um evento fisiológico em uma série infindável de intervenções que adicionam, apesar de oferecer mais segurança em eventos limites e de ordem patológica, aumentam o risco ao processo fisiológico de nascer. Hoje em dia, em nações industrializadas como os Estados Unidos, mas também no Brasil, a chance de uma mulher passar pela experiência de um parto fisiológico e sem interrupções exageradas (e até abusivas) é de apenas 5%. Ou seja; 95% das gestantes vão se submeter aos procedimentos obstétricos invasivos que surgiram há menos de 100 anos, seduzidas pela ideia de que, sem eles, as mulheres estariam correndo sérios riscos, tanto para si quanto para seus filhos. Todavia, ao contrário da avalanche alienante e invasiva do modelo obstétrico contemporâneo ocidental, milhares de artigos e estudos atestam a falsidade dessas propostas, e apontam o parto normal e vaginal como a maneira mais segura de parir e nascer.

A verdade é que, mesmo reconhecendo a importância da tecnologia aplicada à saúde – das cesarianas às UTIs sofisticadas – é inegável que houve um exagero ao se colocar nas mãos de cirurgiões a condução prioritária de um processo fisiológico e natural como o parto. Fica claro que, sendo formados e treinados intensamente para as intervenções salvadoras e para medidas emergenciais e dramáticas, os médicos obtêm sua respeitabilidade e valor social por meio da utilização dessas ferramentas. É ingenuidade imaginar que formaremos profissionais capacitados para tarefas importantes e complexas como estas e depois os impediremos de utilizá-las livremente. Por esta razão, não é justo para a população – e menos ainda para os médicos – que a tarefa da atenção fisiológica do parto esteja delegada preferencialmente a estes profissionais, que seriam muito mais bem aproveitados se colocados na linha de frente das ações salvadoras e heroicas, e não na atenção cotidiana ao nascimento fisiológico e de risco habitual.

Para a tarefa de acompanhar e assistir os partos eutócicos (de risco habitual) já temos profissionais cujo história na atenção aos processos femininos de gestar, parir e amamentar remontam à aurora da humanidade. São as parteiras profissionais – enfermeiras obstétricas, obstetrizes (estas com formação superior) e parteiras tradicionais em suas comunidades – aquelas que realizam esta tarefa com a máxima qualidade e com segurança superior. Elas são as mais capacitadas para distinguir os processos que estão disfuncionais e encaminhá-los para os profissionais médicos. São elas as profissionais mais qualificadas para a atenção do parto normal, pois congregam os ensinamentos técnicos para uma atenção segura com a especial característica afetiva, emocional, social e espiritual de cuidar das mulheres em seus períodos de transição. O novo paradigma da Parteria precisa se apoiar sobre o trabalho destas profissionais, porém sem jamais negar a importância do trabalho médico em atuar nas franjas do processo, naqueles especiais momentos em que a rota da fisiologia dá lugar aos caminhos tortuosos e perigosos da patologia.

“As estimativas extraídas de estudos indicam que onde ocorrem intervenções realizadas por parteiras profissionais, como planejamento familiar, controle do diabete, parto assistido e apoio à amamentação, 4.3 MILHÕES de vidas poderão ser salvas por ano até 2035″

Não há mais dúvida de que o mundo ocidental não pode aceitar as promessas de um “reformismo obstétrico” imaginando treinar – ou condicionar – profissionais para uma conduta mais suave, mais embasada em evidências, menos intervencionista quando é da essência da própria prática médica a intervenção sobre o corpo doente para lhe restaurar a saúde. Todavia, o parto não se adapta a esta lógica pois não há saúde a ser restaurada, apenas para ser mantida. E para esta tarefa é muito mais importante o suporte, o cuidado, a proximidade e a empatia entre a profissional do cuidado e aquela mulher que está parindo. Esta é a tarefa para qual a parteria está qualificada e sempre demonstrou resultados superiores.

O pensador austríaco Wilhelm Reich (1897-1957) já dizia que “A civilização começará no dia em que o bem-estar do recém-nascido prevalecer sobre qualquer outra consideração.” Ou seja, não podemos mais admitir que a atenção ao parto e ao recém-nascido com segurança, qualidade e com os profissionais mais adequados seja condicionada por questões econômicas, políticas, religiosas ou de qualquer outra ordem diferente do bem-estar das mães e dos bebês. A transformação deste paradigma se dará também com o questionamento cada vez mais intenso do capitalismo aplicado à saúde e à vinculação dos tratamentos às grande corporações farmacêuticas. A maior utilização de “Tratamentos e práticas complementares” como acupuntura e homeopatia, dentre outros, é um passo nesse sentido, e todo profissional de saúde deveria adquirir conhecimentos destas alternativas para oferecer uma ampla gama de possibilidades terapêuticas às gestantes.

Precisamos desmedicalizar a vida, em especial suas pontas: nascimento e morte. É urgente uma “revolução do parto“, onde as ordens hierárquicas sejam transformadas para que os valores da segurança e satisfação de mães e bebês estejam acima de qualquer outra consideração, e onde os profissionais ocupados com o nascimento sintam-se plenamente realizados ao participar desta grande aventura da vida.

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*As opiniões dos colunistas não expressam, necessariamente, as deste Diário.

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