Em editorial publicado no último dia 9 de novembro, o jornal A Nova Democracia tenta analisar a vitória de Lula e a chamada transição de governo.
O artigo, chamado “Finda a ‘festa’, vem a ressaca”, afirma que
“A PEC da Transição (que pode virar uma Medida Provisória), discutida pela equipe de transição do novo governo com o Congresso, pretende impor um rombo fiscal de até R$ 200 bilhões, acima do “teto de gastos” (cláusula pétrea do establishment das classes dominantes) para sinalizar cumprir o mínimo das promessas do novo governo, para que não se queime já de entrada. Afinal, os de cima estão todos de acordo com tais medidas compensatórias, pois são uma medida de salvação para evitar entornar de vez o caldo quente.”
Não fica muito claro se A Nova Democracia é a favor ou contra o teto de gastos. Se consideram que o teto é uma exigência das classes dominantes, também descrevem em tom crítico o “rombo fiscal de R$ 200 bilhões”, que seria nada mais do que uma medida demagógica. O que A Nova Democracia deveria explicar é se, sendo demagogia ou não, é a favor de romper o teto de gastos para medidas sociais.
Afinal, qualquer um tem o direito de criticar uma determinada política social. “Poderia ser mais”, dizem alguns, “é insuficiente”, dizem outros. A acusação pura e simples de demagogia não é uma verdadeira crítica, a não ser que se prove que aquilo com o que se está fazendo a demagogia seja apenas discurso, mera farsa. Não se trata disso, segundo o próprio editorial do jornal, afinal, segundo eles mesmos, a PEC prevê um rombo no teto de gastos.
Além disso, a acusação de demagogia pode muito bem ser feita por qualquer direitista, pelo simples fato de que a direita é contra dar dinheiro para o povo, ou porque querem um pretexto para atacar o futuro governo Lula.
A esquerda precisa se posicionar claramente. Se é favor de não dar dinheiro para o povo porque isso é “demagogia”, ou se é a favor de medidas que deem melhores condições para o povo, mesmo que sejam insuficientes. Logicamente, a esquerda precisa ser a favor de todas as medidas que beneficiam o povo e, mais ainda, deve defender que o teto de gastos seja tão arrombado que não exista mais.
A Nova Democracia afirma, ainda, que os “de cima estão todos de acordo com tais medidas compensatórias”. Nada poderia ser mais falso. Os banqueiros, especuladores, a imprensa golpista, em suma, a burguesia em geral e o imperialismo, estão totalmente contra a política apresentada por Lula. Há uma crise que está bem expressa nos principais jornais golpistas criticando a “irresponsabilidade fiscal de Lula”. O tal mercado reagiu mal na bolsa de valores. Existe uma contradição muito evidente.
O que parece é que A Nova Democracia inventou a ideia de que a burguesia está a favor dessa política, para não aparecer junto com ela em sua oposição ferrenha. Mas a posição do jornal acaba colocando sua política ao lado daqueles que estão criticando Lula por “gastar dinheiro para fazer demagogia” ─ esse é o conteúdo principal quando a direita chama Lula de “populista”.
A maioria do povo votou em Lula para ter o que comer. Um esquerdista pode chamar isso de demagogia, mas é uma coisa bem concreta. Um partido revolucionário deveria em primeiro lugar denunciar a política de fome da direita e chamar o povo a exigir mais. Nesse sentido, a posição do jornal é extremamente sectária.
O editorial de A Nova Democracia acredita que essa política é “demagogia, pura e simples”, mas que serve apenas para essa transição e início do governo: “O novo governo tem claro que nos próximos meses e anos, ou quiçá, nos quatro anos seguintes terá que levar a cabo ataques draconianos contra os direitos e interesses fundamentais das classes populares, para atender aos interesses sagrados das classes dominantes, principalmente de um sistema imperialista em profunda crise”. O governo Lula estaria se indispondo agora para daqui a pouco se colocar como um serviçal dos ataques imperialistas contra o povo.
Com base em que A Nova Democracia acredita nisso? Eles não explicam, apenas se limitam a dizer ser isso o que quer o imperialismo. De fato é isso, mas o que indica que o governo Lula será um instrumento dessa política? Se for pelos fatos de agora, nada indica. Pelo contrário, a primeira impressão é a de que o governo Lula será uma constante crise com o imperialismo.