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Protesto

Índia faz greve de fome contra invasão da especulação imobiliária

A cacica Gãh Té, ou Iracema no seu nome em português, está desde a última terça-feira (20) sem comer

A cacica Gãh Té, ou Iracema no seu nome em português, está desde a última terça-feira (20) sem comer. Sua greve de fome é em protesto contra a iminente reintegração de posse da retomada Gãh Ré, território na zona leste de Porto Alegre (RS), ao pé do Morro Santana, onde vivem cerca de 50 indígenas dos povos Kaingang e Xokleng.

Segundo a cacica, o jejum seguirá até que o território ancestral de 17 hectares esteja protegido. “Somos originários deste país, buscamos nossos direitos e nunca somos ouvidos”, se indigna. “Não é por mim”, a liderança explica sua greve de fome: “É pela minha mãe terra. Darei minha vida pelas coisas que existem nela. Nós, os bichos e a água que nasce nesse espaço”.

A decisão pelo despejo foi emitida pela juíza Clarissa Rahmeier, da 9ª Vara da Justiça Federal, e favorece a Maisonnave Companhia de Participações. A empresa planeja construir um condomínio com 11 torres residenciais na área, um total de 714 apartamentos.

A qualquer momento um oficial de justiça pode entregar a decisão judicial para os moradores da retomada Gãh Ré. A partir daí, começa a correr o prazo de 15 dias estipulado pela magistrada para que os indígenas saiam voluntariamente. Se não o fizerem, o despejo terá, nas palavras da juíza, “execução forçada, com apoio de força pública, se necessário”.

“Eu não vou sair. Se a polícia vier querendo nos levar à força, é mais uma vez que eles se sujarão de sangue indígena nas mãos. Só saio daqui se eles me levarem no caixão”, garante a anciã Gãh Té que, além de liderança, é também kujà, mestra na medicina tradicional Kaingang.

O Ministério Público Federal (MPF) entrou com um pedido de agravo para suspender a reintegração de posse, mas não foi aceito. Para a juíza Marga Inge Tessle, a retomada indígena é “uma invasão sem qualquer respaldo além da invocação da ancestralidade”.

Uma nota técnica do Núcleo de Antropologia das Sociedades Indígenas e Tradicionais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) atesta, no entanto, que a ancestralidade do território se fundamenta em mais do que uma “invocação”.

Segundo o documento, as evidências etno-históricas de que o território é indígena se apresentam por meio de “resquícios arqueológicos, relatos históricos e pesquisas antropológicas”.

Exploração empresarial e dívida com o poder público 

Entre os anos 1960 e 1970, a área foi usada como um complexo da pedreira Depósito Guaporense S.A, de propriedade de José Asmuz, já falecido. Décadas depois, já em 2017, a mineradora seria condenada pelos impactos ambientais do empreendimento minerário extrativista e por operar sem licença.

Mas antes disso, em 1981, o terreno foi hipotecado ao Banco Maisonnave. Este, por sua vez, se envolveu em um escândalo contra o sistema financeiro nacional. De acordo com a Ata 0626 do Conselho Monetário Nacional, a dívida com o poder público que se acumulou por parte do Maisonnave, junto com os bancos Auxiliar, do Commércio e Indústria de São Paulo, chegou a cerca de R$ 406 milhões.

Assim, discorre a Nota Técnica da UFRGS, “é preocupante que o empreendedor tenha recebido Licença Prévia para construir um grande condomínio no local”.

Ocupação ancestral do território 

A bibliografia científica citada na nota da UFRGS indica que o Morro Santana é ocupado pelo povo Kaingang ao menos desde o século 19. De acordo com relatos passados por gerações e colhidos em pesquisa antropológica, o tataravô da cacica que hoje protesta em jejum, José Augusto Joaquim, teria lutado na Guerra dos Farrapos (1835-1845).

Em troca de terras para o seu povo, o indígena teria batalhado ao lado do governo brasileiro. Ele “estabeleceu um ponto de observação no Morro Santana, então habitado pelos Kaingang, sobre o qual eles teriam vantagem tática sobre as forças opositoras”, discorre o documento.

Como resultado dessa barganha, em 1850 teria surgido a Terra Indígena (TI) Nonoai, ocupando uma área, no entanto, muito menor do que a incialmente prometida. Por cobrar que o Estado cumprisse o acordo, o tataravô da atual cacica “foi traído e morto numa emboscada pelo governo brasileiro”, conta o documento da UFRGS.

Segundo os pesquisadores, entre conflitos e guerras, os Kaingang fizeram constantes ocupações nos arredores do Morro Santana. No período mais recente, a ênfase foi na década de 1950 e, depois, 1980. Esta segunda leva ganhou corpo quando cerca de 50 famílias foram expulsas da TI Nonoai por se oporem ao arrendamento da terra para monocultura de soja e exploração de madeira.    

A área retomada – que agora vive risco de despejo – foi reocupada no último dia 18 de outubro. Segundo os indígenas, o território estava sem função social há cerca de 40 anos.

“Esse espaço é nosso. Ninguém comprou nada de nós. Então estou defendendo o que é nosso. Defendendo as raízes dos meus ancestrais, dos meus velhos que passaram e que estão aqui, espiritualmente, conosco”, afirma Gãh Té.

“Será que a justiça vai ser banhada com mais sangue indígena? Onde é que está a justiça? Onde é que estão nossos direitos como originários desse país? Isso eu pergunto para toda a sociedade”, ressalta.

“Nós não estamos cobrando os 500 e poucos anos que estamos sofrendo”, aponta a liderança Kaingang. “Queremos é paz para viver. Para plantar o que a gente consome. Só isso.”

* Os artigos aqui reproduzidos não expressam necessariamente a opinião deste Diário

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