Os acontecimentos da última semana apontam que a burguesia começou a baixar o tom com Bolsonaro e que se costura um acordo político de convivência no regime.
A preservação do regime político golpista, da qual Bolsonaro é uma expressão, é o objetivo fundamental da burguesia. O enfrentamento político entre as duas alas da classe dominante, a direita tradicional e o bolsonairismo, se intensificou com a prisão do ex-deputado Roberto Jefferson (PTB) e outras figuras do bolsonarismo pelo Supremo Tribunal Federal (STF), instituição que comanda a Polícia Federal.
O motivo do enfrentamento é o controle do Estado, uma questão da maior importância. Diante da ofensiva contra sua facção política, Bolsonaro partiu para a contraofensiva, atacou publicamente ministros do STF e do TSE e convocou os atos de 7 de setembro, que contam com forte adesão das Polícias Militares e das Forças Armadas. O STF ligado ao PSDB controla a Polícia Federal, porém Bolsonaro domina as Forças Armadas e mantém significativa influência nas Polícias Militares, Polícias Civis e no conjunto do aparato repressivo estatal.
A burguesia, por sua vez, recuou diante da contraofensiva de Bolsonaro e inclusive aceitou a recondução do bolsonarista Augusto Aras para a Procuradoria-Geral da República (PGR). O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), político da tradicional burguesia neoliberal, permitiu os atos bolsonaristas programados para a Avenida Paulista, enquanto que procurou proibir os atos da esquerda.
O acordo entre as forças políticas tradicionais da burguesia e Jair Bolsonaro tem duas cláusulas. As primeiras recuam na ofensiva política e o último garante que não haverá um golpe militar. O enfrentamento “ao fascismo” por parte da burguesia vai até a segunda ordem e esbarra nos seus próprios interesses.
A esquerda não pode confiar na aliança com a burguesia “democrática”, “civilizada” e “antifascista” que procura aparecer como opositora do bolsonarismo. A burguesia não quer uma derrota total de Bolsonaro através da mobilização popular, pois isto colocaria em xeque o conjunto do regime político que responde aos seus interesses de classe. Se Bolsonaro for derrotado, isto deve ser dado nos marcos do regime golpista e exclusivamente no âmbito eleitoral. João Doria, “a terceira via”, é a alternativa que a burguesia impulsiona para, ao mesmo tempo, derrotar Bolsonaro e preservar o regime golpista.
Uma ofensiva da população contra Bolsonaro nas ruas com greves, enfrentamentos e ocupação de fábricas, é a ameaça concreta a ser evitada por parte das forças da burguesia. O verdadeiro inimigo não é o bolsonarismo, que, com contradições, governa em prol dos interesses dos capitalistas nacionais e internacionais. A esquerda sim que é o inimigo mortal, em particular as organizações de massas (CUT, MST, FNL etc) e a ala lulista do Partido dos Trabalhadores (PT).
A burguesia não quer o impeachment de Bolsonaro no Congresso Nacional. Nenhum dos principais partidos burgueses (PSDB, MDB, DEM, Progressistas, Republicanos, PTB, PSL, PL) vai levar adiante o processo. É uma ilusão, que já deveria ter sido demolida pela realidade, a tese do impeachment.
A política de aliança dos partidos e organizações de esquerda com a burguesia “democrática”, isto é, a Frente Ampla, não serve para derrubar Bolsonaro. Somente uma política de mobilização do povo pelo Fora Bolsonaro, independente e que defenda um programa político que corresponda aos interesses dos trabalhadores, é que será capaz de fazê-lo. E a reivindicação de Lula presidente é um elemento central para oferecer uma perspectiva de luta pelo poder político. Não basta somente tirar Bolsonaro, é preciso oferecer uma alternativa para as massas. Neste momento Lula é essa alternativa.
