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Marcelo Marcelino

Membro Auditoria Cidadã da Dívida Pública (ACD) nacional, sociólogo, economista e cientista político, pesquisador do Núcleo de Estudos Paranaenses – análise sociológica das famílias históricas da classe dominante do Brasil e membro do Partido da Causa Operária – Curitiba.

Coluna

30 anos do Plano Real

O mercado financeiro na nova era da pilhagem colonial

O avanço do processo de financeirização exacerbada do capital, principalmente a partir da década de 1990, com o estabelecimento do pacto neoliberal do “Consenso de Washington”, trouxe consequências bastante severas para a população brasileira. O principal instrumento dessa política de financeirização no Brasil passa pelo Comitê de Política Monetária – COPOM, órgão constituído em 1996 que atua com a finalidade de estabelecer as diretrizes e competências da política monetária do Banco Central do Brasil (BC, BCB ou BACEN).

As decisões da política monetária ratificadas no âmbito do Banco Central, principalmente a partir do Plano Real de 1994 vêm priorizando os interesses do mercado financeiro nacional e internacional em detrimento dos investimentos produtivos e das políticas públicas; O COPOM quando decide pela alternativa da menor emissão monetária e consequentemente pela manutenção da maior taxa básica de juros SELIC (Sistema de Liquidação e Custódia) do mundo na média histórica dos últimos 30 anos, impulsiona a desigualdade de renda e riqueza de uma maneira ainda mais perversa contra o povo. As decisões do COPOM pertencente ao Banco Central definem não apenas a política monetária de forma direta como também as políticas cambiais e fiscais, e com isso, o direcionamento impositivo do enquadramento das principais políticas econômicas que estruturam a organização das prioridades do país. Elas viabilizam ou não a alocação dos recursos do orçamento para as políticas públicas no Brasil. O projeto de acumulação e reprodução do capital em escala global utiliza as instituições tecnocráticas estratégicas na área econômica, como os bancos centrais para orientar as ações para os interesses dos capitalistas; e hoje, essas instituições são peça chave nessa mediação.

O Banco Central do Brasil tem preponderância no que tange as principais decisões na política econômica que fortalecem o predomínio financeiro e a concentração de renda em dissonância com a insuficiência e a ausência das políticas públicas para a maioria na sociedade brasileira. E como funciona esse modelo reacionário de pilhagem da população nacional?

No caso brasileiro os dois grandes pilares de sustentação do processo de financeirização são o Banco Central do Brasil (BACEN ou BC) e a Secretaria do Tesouro Nacional (STN) responsáveis pela emissão monetária e pela transferência de recursos do caixa do tesouro para o pagamento dos títulos da dívida pública respectivamente. Esse dueto entre essas instituições ou essa parceria impulsiona e dinamiza de forma institucionalizada os principais negócios do mercado financeiro no Brasil e ao mesmo tempo tornou-se uma referência de coordenação entre a política econômica a partir da política monetária exercida pelo Comitê de Política Monetária (COPOM) e suas conexões com as finanças nacionais e internacionais.

O marco dessa parceria institucional está assentada sob as premissas do Plano Real e toda a sua engenharia econômica está engendrada e conectada com os organismos econômicos e financeiros internacionais, além dos acordos firmados a partir do chamado Consenso de Washington. Todo o suporte teórico-metodológico do Plano Real está organizado em torno das exigências do neoliberalismo com suas formas ideológicas e organizacionais que preconizam a abertura comercial ao mercado global, privatizações em grande escala, redução dos investimentos públicos e a própria terceirização dos serviços públicos e da máquina pública administrativa.

O neoliberalismo tem ainda por princípio legitimar as orientações do processo de desregulamentação e liberalização dos mercados financeiros internacionais onde o papel dos Estados Nacionais passa a ser central no que tange a formulação de políticas econômicas de suporte aos negócios econômicos e financeiros em consonância às exigências do imperialismo em escala global. O aprofundamento das políticas neoliberais impostas pelo imperialismo em especial no momento em que os EUA fortaleciam sua hegemonia permitiu o avanço das políticas neoliberais em escala global. Esse fortalecimento econômico e político impactou de forma agressiva sobre uma série de restrições de política fiscal autônoma das nações periféricas e mesmo as mais desenvolvidas, e ainda, acelerou a imposição de medidas de políticas econômicas contracionistas principalmente na América Latina e particularmente o Brasil.

Na América Latina e no caso brasileiro as políticas monetária e cambial coordenadas pelo Banco Central foram responsáveis pela condução da base de toda a política econômica brasileira desde o Plano Real. A intensificação do processo de financeirização desse período marca a ascensão das políticas neoliberais no Brasil e o Banco Central passa a exercer funções primordiais no que tange a economia política brasileira através das ações de intermediação entre as finanças públicas e o mercado financeiro nacional e internacional.

A parceria entre o Banco Central e a Secretaria do Tesouro Nacional passa a ser estratégica para o sistema financeiro e para as finanças públicas no Brasil onde a intermediação da remuneração dos títulos da dívida pública interfere direta e indiretamente de forma impactante no orçamento público federal, estadual e municipal, principalmente a partir de 1997 quando as dívidas de todos os entes federados foram centralizadas ou federalizadas, isto é, permaneceriam a partir de então em poder da União.

A partir desse momento o Tesouro Nacional e o Banco Central irão desenvolver o seu aparato de poder através do controle das decisões de intermediação do capital financeiro nacional e internacional no fluxo do capital em nível nacional numa ampla conexão global frente às exigências impostas pelo neoliberalismo capitaneado pelo imperialismo a partir dos EUA, onde as finanças são preponderantes.

Desde a grande reconfiguração do sistema financeiro nacional na ditadura as transformações do mercado financeiro brasileiro foram profundas devido às determinações e as imposições do imperialismo guiado pelas finanças globais. Cabe aqui enfatizar que essa abordagem não se dedica a apresentar um organograma desse quadro institucional desse amplo sistema financeiro, mas apresentar as conexões que existem nesse modelo e que permitem o aprofundamento dos laços existentes entre as economias centrais e periféricas e entre o setor real da economia e o capital financeiro doméstico e externo.

O Sistema Financeiro Nacional (SFN), Conselho Monetário Nacional (CMN), Secretaria do Tesouro Nacional STN) e principalmente o Banco Central do Brasil (BCB, BC ou ainda BACEN) são instituições financeiras que foram construídas e lapidadas durante o regime ditatorial e a partir do Plano Real assumem um papel mais incisivo no processo de transferência de renda e riqueza do povo para os banqueiros e rentistas nacionais e estrangeiros.

O orçamento das várias áreas e setores da administração federal e das políticas públicas está depositado no Tesouro Nacional e a estreita relação com o Banco Central no que diz respeito a emissão dos títulos da dívida pública, principalmente nas últimas décadas a partir do Plano Real coloca em discussão de forma ampla o papel do desenvolvimento econômico e social e os projetos estatais do Estado brasileiro.

Existem objetivas intenções entre as emissões de títulos públicos de interesses do mercado financeiro e a gestão social das políticas econômicas, já que as operações compromissadas do Banco Central conduzem ao aumento da dívida pública de forma bastante acelerada desde o divisor de águas do Plano Real e seu projeto de acoplamento com os interesses do imperialismo capitaneados pelo fluxo de capitais globais.

A criação do Comitê de Política Monetária (COPOM), as desvinculações das receitas da união pela DRU, os programas de saneamento com as privatizações de muitos bancos regionais através de aquisições e fusões entre bancos privados sejam nacionais e também com estrangeiros fazem parte de um processo de desregulamentação e liberalização financeira pela via da concentração bancária de um lado e da concentração de recursos econômicos por outro, com objetivo de salvaguardar os monopólios bancários e a remuneração do capital financeiro por intermédio do Tesou Nacional e do Banco Central.

Outros elementos importantes como a federalização das dívidas dos entes da união como os Estados regionais e os municípios em 1997 e a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) de 2000 oferecem as bases legais e institucionais, além do suporte fiscal necessário ao avanço da acumulação e reprodução do capital através das adequações dos processos de controle e intermediação financeira por parte dessas instituições estatais.

Do Plano Real na sua fase inicial para cá, entre diversos governos do Partido dos Trabalhadores (PT), o golpe de Estado de 2016 e o retorno do governo Lula recentemente, quais as mudanças que foram implementadas pelos governos ditos populares para transformar esse sistema reacionário e perverso contra os trabalhadores e o povo? O Teto dos Gastos Públicos do governo Temer de 2017 foi o passo adiante da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) de 2000 do segundo governo FHC. O golpe também teve o objetivo de aprofundar a miséria do povo com o Teto de Gastos e impulsionar a especulação dos bilionários rentistas ao redor do mundo e do Brasil. A autonomia do presidente do Banco Central durante o governo Bolsonaro foi o passo seguinte do golpe como forma de garantir a decisão autoritária em favor dos endinheirados. E agora no governo Lula 2024, para onde aponta a política econômica? aponta para um severo ajuste fiscal conforme às exigências do Arcabouço fiscal de Haddad/Tebet. Um ajuste fiscal com a intenção de perpetuar a pilhagem colonial via transferência do orçamento público para os banqueiros e especuladores. Temos que admitir! O Plano Real completa seus 30 anos de “sucesso” mundial e serve como exemplo da maneira mais eficiente e eficaz de um Robin Hood às avessas da Era contemporânea em parceria com o vampiro do “Banco de Sangue Central” que suga até os ossos da população. O mais tragicômico dessa história real é que o vermelho da luta dos trabalhadores; que quase conseguiram retirar da bandeira do PT; agora está nos dentes do vampiro ultraliberal que o PT adotou nessas três décadas de destruição nacional com o Plano Real – o mais perverso plano econômico mundial sob a tutela do Banco Central. Detalhe: para comemorar os 30 anos do “Plano perverso Real” o PT indicou o próximo gerente do Banco de Sangue da cor do próprio PT, que continuará transferindo o sangue do povo através do orçamento público para os agiotas “legais” do sistema financeiro nacional e mundial.

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