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Coluna

Folhas de Outono, de Aki Kaurismäki

Filme de Aki Kaurismäki mostra que relacionamento amoroso que une indivíduos da classe trabalhadora é uma forma de resistência

Leveza é a palavra que define Folhas de Outono (Kuolleet lehdet, 2023), lindo filme do diretor finlandês Aki Kaurismäki. 

No IMDB, uma frase do diretor ajuda a entender o caminho: “acho que quanto mais pessimista me sinto em relação à vida, mais otimistas devem ser os filmes”.

Nesses tempos tão inglórios, é assim mesmo que nos sentimos ao chegar no final: diante de uma pequena joia que olha para o futuro com otimismo.

O diretor nos convida a acompanhar uma história de amor com todos os ingredientes que conhecemos e alguns a mais.

Ansa Grönholm (Alma Pöysti) e Holappa (Jussi Vatanen) são da classe trabalhadora. Quando o filme começa, ela trabalha em um supermercado que a acusa de roubar um sanduíche, fora do prazo de validade, e a demite.

Ele trabalha na construção civil e é alcoólatra, perdendo vários empregos por beber no trabalho. Sua situação financeira é precária: ele mora em alojamentos coletivos de operários. Ela tem um diminuto quarto e cozinha, uma herança.

Os caminhos fazem com que eles se encontrem em um karaokê e após várias peripécias típicas de boas histórias de amor, o final chega para nos deixar um pouquinho mais felizes.

O romance entre os dois personagens, no entanto, é só um pretexto para nos mostrar a situação atual da classe trabalhadora finlandesa.

Para nós, brasileiros, não deixa de ser estranho pensar que um país como a Finlândia possa ter problemas como os que enfrentamos. 

Mas o capitalismo lá não é diferente do daqui e o colchão social que houve em algum momento também foi destruído pelo neoliberalismo nas últimas décadas. 

O filme de Kaurismäki lembra um pouco os filmes de Ken Loach na sua abordagem à classe trabalhadora.

A trajetória individual dos personagens – inclusive a possibilidade da relação amorosa – está totalmente ligada ao modo como conseguem dar conta de suas necessidades materiais cotidianas, muitas vezes por um fio.

Em uma cena, Ansa gasta os últimos euros que têm para alugar um laptop e assim visitar um site de uma agência de empregos.

O enredo é contemporâneo, mas Kaurismäki mistura nos cenários elementos de épocas diferentes como telefones antigos e pôsteres de filmes dos anos 1960.

Além da nostalgia, reflete também o fato de que esses personagens não têm acesso a todas as comodidades eletrônicas com as quais muitos de nós nem imaginamos como é viver sem. Um laptop é algo inacessível para Ansa.

Em Folhas de Outono, o relacionamento amoroso funciona como uma forma de trazer esses personagens à vida. No início do filme, eles parecem agir como autômatos, robôs, mas, conforme a narrativa avança, a humanidade retorna nos poucos e tímidos sorrisos.

O sentimento amoroso, neste caso, tem um quê de resistência revolucionária.

*A opinião dos colunistas não expressam, necessariamente, as deste Diário.

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