Segundo artigo do portal Brasil 247, Márcia Tiburi afirmou, em um programa na TV 247, que o prêmio recebido por Fernanda Torres no Globo de Ouro pela atuação no filme “Ainda estou aqui” pode “conter a ascensão fascista”.
Poderíamos chamar a colocação de Tiburi de idealista. Tiburi é filósofa, poderíamos chamá-la, então, de uma filósofa idealista. Ela acredita que o mundo é movido pelas ideias. O fascismo será contido por um filme, um único, vejam só!
“Nós temos que comemorar e discutir esse filme porque ele traz questões importantíssimas para pensar o nosso passado, nosso presente e, evidentemente, o futuro, considerando o risco da ascensão fascista, especialmente em períodos eleitorais como o que se aproxima em 2026.”
Ela acredita que uma peça cultural é que move a política. Inverteu tudo. Não é mais a luta de classes, não é mais a política. É um filme, um único filme.”O afeto que vence e faz a extrema direita chegar ao poder é sempre o ódio. Ele não é abstrato; é organizado e fomentado por meio de processos estéticos e afetivos.” O fascismo chegaria ao poder por meio de processos “estéticos e afetivos”. Aqui, nem precisamos ir a Marx, Tiburi não concorda nem com a música de Geraldo Vandré que diz que as flores não podem vencer o canhão.
Ela não entende que a cultura, embora possa ser e, em muitos casos é, uma peça de propaganda para determinada política, ela não tem força por si só para frear um movimento político. Sem uma política que se contraponha a outra, essa propaganda é apenas isso: propaganda.
E o fascismo, não sabemos exatamente o que ele entende como tal, não será freado por nenhum filme. Menos ainda nesse momento. Menos ainda a premiação desse filme num prêmio controlado por grandes corporações capitalistas.
Tiburi diz que a arte e a cultura não podem ficar na mão da extrema direita. Até aí, tudo bem. Quanto mais produção cultural estiver nas mãos do povo, melhor. Mas aqui, a oposição a uma arte controlada pela extrema direita é uma cultura controlada pelo imperialismo. A rede Globo também comemora a vitória do filme. Ninguém ganha um globo de ouro sem que haja no mínimo um consentimento dos grandes monopólios da indústria capitalista do entretenimento.
A cultura celebrada por Tiburi como a grande barreira para a ascensão do fascismo não é controlada pela extrema direita, mas é controlada pelo imperialismo. Quem é pior?
A crença de Tiburi nos faz mudar um pouco nossa caracterização. Ela não é idealista, ela é ingênua.
O problema aqui não é gostar ou não do filme, não achar cool o Brasil ser reconhecido internacionalmente. O problema do fascismo está muito longe de ser resolvido por um Globo de Ouro vencido por um filme apoiado pela rede Globo e por banqueiros. Na verdade, o episódio nem mesmo reflete um estado de espírito antifascista na sociedade. Ele reflete mais um esforço de um setor da burguesia imperialista para controlar a extrema direita, que é outro setor da burguesia mais fraco, ainda que cada vez mais forte. E está cada vez mais forte justamente porque a esquerda acredita que expedientes superficiais seriam capazes de conter o fascismo, como acredita Tiburi.
Não é também apenas um problema de ingenuidade em si, mas as consequências dessas ideias. Ao acreditar nesses expedientes, a esquerda fica a reboque do imperialismo dito “democrático”, uma força mais poderosa e devastadora do que a nomeada extrema direita. O imperialismo não é inimigo da extrema direita, pelo contrário, basta ver o caso do Brasil, em que todos os “democratas” ajudaram a eleger Bolsonaro e agora fingem ser seu adversário. O caso da Argentina também não deveria deixar dúvidas: os “democratas” estão apoiando o fascista Milei.
Com a mentalidade de Márcia Tiburi, a esquerda depõe suas armas e espera que o imperialismo resolva seu problema.