Segunda, 21 de março de 1983. Na cidade de Arrabá, na região norte da Cisjordânia ocupada, por volta das 8h da manhã uma garota palestina de 17 anos corre em desespero para uma das janelas de sua sala de aula, tossindo e reclamando de dificuldades para respirar.
Os sintomas logo se espalham para colegas de classe e também para um professor. Não demora muito, e em poucas horas outras seis garotas da mesma escola relatam os mesmos sintomas.
Havia um odor de podridão no ar, como que o de ovos estragados, conforme relatos colhidos em investigação posterior do Centro de Controle de Doenças dos EUA (CDC, na sigla em inglês).
Casos de náusea, tontura, visão turva, vômitos e desmaios foram também relatados. Os estudantes acometidos pelos sintomas eram todas garotas, entre 12 e 17 anos. Muitas delas eram de classes diferentes, sem contato uma com a outra.
Estando a Cisjordânia sob ocupação, militares mulheres israelenses das forças de ocupação chegam à escola secundária para levar as estudantes para o hospital. Contudo, elas também são acometidas pelos mesmo sintomas, também sentido dores de cabeça e estomacal.
Naquele dia, trinta e duas garotas palestinas foram afetadas pelos sintomas expostos acima. Foi a Epidemia de Desmaios de 1983, na Cisjordânia, que durou até 3 de abril do mesmo ano.
Essa primeira fase da epidemia, que se deu na cidade de Arrabá, ocorreu entre 21 e 24 de março.
O segundo surto epidêmico, contudo, foi em Jenin, cidade localizada a cerca de 13km a nordeste de Arrabá, sendo a terceira maior da Cisjordânia.
Ocorreu entre 26 e 28 de março, quando 367 palestinos adoeceram, dos quais 246 eram garotas estudantes. Conforme informações colhidas pelo CDC, apesar de agora 246 garotas terem adoecido, “os sintomas desenvolveram-se em pessoas de todas as faixas etárias e ambos os sexos”, afinal, o total de pessoas acometidas foram 367 palestinos. Ademais, os sintomas começaram “depois de residentes locais observarem um carro a mover-se pelas ruas emitindo uma nuvem espessa de fumaça”.
O terceiro surto ocorreu na cidade de Hebron, sul da Cisjordânia, a 30 km de Jerusalém. Com o total de internações hospitalares já chegando a 943, o regime de ocupação fechou temporariamente as escolas na Cisjordânia, o que acabou resultando no fim da epidemia.
Até hoje não se sabe exatamente o que aconteceu. Apenas que quase mil palestinos e algumas soldadas israelenses tiveram de ser hospitalizados após sentirem sintomas persistentes como náusea, dificuldade para respirar e outros. Sintomas estes que surgiram após os acometidos relatarem odores de putrefação (no caso da escola, em Arrabá) e nuvem espessa de fumaça sendo expelida por um carro (em Jenin). O que levou muitos palestinos a temerem, à época, a utilização de algum tipo de arma química por parte de “Israel’.
Assim, líderes da resistência palestina acusaram o governo israelense e os colonos de utilizarem armas químicas para expulsá-los da Cisjordânia. Também foram feitas acusações de que seria algum tipo de arma para esterilizar as mulheres palestinas, tendo em vista que elas foram as principais vítimas.
Yasser Arafat, então presidente da OLP, declarou que o que estava ocorrendo era um “crime planejado e sistemático contra o nosso povo”. Nesse sentido, em 29 de março, Hasan Abdul Rahman, Vice-Observador Permanente da ONU enviou carta ao presidente do Conselho de Segurança da Organização, informando que um “pó sulforoso” havia sido encontrado em duas escolas, e que em uma terceira foi encontrada uma garrafa com uma “substância nociva”, “emitindo vapores”, concluindo que se tratava de mais um ataque contra o povo palestino
Quanto às alegações dos sionistas sobre o ocorrido, a conclusão do Ministério da Saúde de “Israel” foi a de que, mesmo que os primeiros desmaios possam ter tido origem em alguma substância presente no ambiente, os demais foram de ordem psicológica.
O imperialismo adotou a mesma conclusão: o CDC disse que a maioria dos casos de desmaios eram de natureza psicológica, sendo que alguns deles poderiam ter sido causados pelo odor emitido por sulfeto de hidrogênio. No mesmo sentido foi o relatório do Departamento de Saúde e Serviços Humanos, que “rejeitou as alegações de que 943 casos de doença aguda durante duas semanas foram causados por envenenamento deliberado ou foram fabricados para fins de propaganda“, concluindo que “os surtos representavam uma epidemia de verdadeira doença psicológica e que a causa desta doença era a ansiedade”.
Em suma, o imperialismo e grande parte da burocracia sionista estavam alinhados em sua conclusão de que os quase mil desmaios tinham sido fruto de uma “histeria em massa”.
Contudo, o brigadeiro-general Moshe Revá, líder do corpo médico das forças de ocupação, constatou que enquanto 10 soldados israelenses em Jenin adoeceram, outros dois não. E estes estavam usando máscaras. Naturalmente, ao declarar isto, o militar sionista estava sugerindo um ataque químico por parte da resistência palestina, o que é inverossímil. Contudo, a reflexão é válida.
Vale ressaltar que, no meio tempo, a imprensa israelense acusou organizações da resistência palestina de utilizarem armas químicas contra os próprios palestinos, para jogar a culpa em “Israel” e fomentar mobilizações de massa contra o Estado sionista. A típica campanha pérfida de calúnias do sionismo.
E, no que diz respeito ao uso da máquina de propaganda imperialista para esconder os crimes de “Israel”, já à época a própria cogitação feita pelos palestinos de que o Estado sionista os estava atacando com armas químicas foi alvo de acusação de “antissemitismo” por parte de Dan Margalit, do jornal israelense Haaretz. Exatamente a mesma campanha de acusar de antissemitismo todos aqueles que denunciam as atrocidades de “Israel”.
Mas o que, de fato, aconteceu ao final de março e começo de abril de 1983? “Israel” lançou ataque químico controlado na Cisjordânia, como forma de teste para um ataque maior? Ou foi de fato um caso de histeria de massa? Não se sabe ao certo. Afinal, não se pode confiar em investigações das instituições sionistas e dos órgãos do governo norte-americano.
Contudo, mesmo que os desmaios tenham tido causa psicológica, eles seriam resultado da ditadura de “Israel” contra o povo palestino. Afinal, não sendo bastante as seis décadas precedentes de colonização sionista e opressão imperialista, uma nova forma da extrema direita sionista, o sionismo religioso, estava em ascensão, especialmente entre os colonos da Cisjordânia.