Esquerda brasileira

MRT em frente única com Biden e Netaniahu

Apoio de esquerdistas ao golpe que derrubou Bashar al-Assad revela um setor do campo que fala em revolução, mas é incapaz de se opor verdadeiramente ao imperialismo

Órgão do MRT, o portal Esquerda Diário publicou no último dia 9, um artigo intitulado Assad derrubado, o que pode acontecer com a mudança de poder na Síria?, assinado por Baran Serhad e trazendo uma verdadeira pérola da submissão intelectual ao imperialismo, medida em parágrafos como o abaixo destacado:

“Partilhamos a alegria da queda de Assad, mas devemos alertar contra aqueles que semeiam expectativas no HTS. Já durante a ofensiva militar, surgiram nas redes sociais inúmeras provas de crimes de guerra cometidos pelas milícias, que não terminarão com a tomada do poder. Relatórios de Idlib sob HTS também mostram que os líderes governaram com mão de ferro e não toleraram qualquer oposição.”

Pode ter escapado aos “revolucionários” do MRT, mas essa é exatamente a posição do imperialismo e de seu principal capanga no Oriente Médio: o primeiro-ministro de “Israel” Benjamin Netaniahu. Juntos, Biden e Netaniahu comemoraram a queda de Assad e, aproveitando-se do caos, iniciaram uma sequência avassaladora de ataques contra posições supostamente pertencentes ao Estado Islâmico, aliado do HTS na luta que tanto alegrou o Esquerda Diário.

Como que para não deixar dúvidas quanto ao tipo de orientação política que norteia o MRT, o artigo continua:

“A ofensiva militar das milícias HTS em 26 de Novembro apanhou al-Assad desprevenido. Começando no noroeste da Síria, as milícias conseguiram conquistar várias cidades em menos de duas semanas sem grandes perdas e acabaram por penetrar em Damasco. Como as milícias conseguiram tomar o poder em pouco tempo?”

Um observador minimamente atento logo faria a conexão: “27 de novembro ‘Israel’ e o Hesbolá anunciaram um cessar-fogo, um dia antes os mercenários voltaram à ofensiva na Síria”Ignorar a incrível “coincidência” das datas é um recurso que permite desconsiderar o papel fundamental do imperialismo na retomada da ofensiva do HTS, do Estado Islâmico e de outras forças pró-imperialistas na Síria. É, portanto, uma picaretagem do autor, que continua o artigo questionando:

“Como as milícias conseguiram tomar o poder em pouco tempo? Afinal, al-Assad era conhecido como aquele que se manteve firme apesar da guerra civil. Ao contrário de Gaddafi na Líbia, Ben Ali na Tunísia ou Mubarak no Egipto, ele conseguiu manter o seu poder depois do início da chamada Primavera Árabe em 2011. O que mudou que o fez render-se hoje sem lutar?

A primeira razão, e provavelmente a mais importante, reside nas condições sob as quais al-Assad defendeu o seu poder durante 14 anos de guerra civil. Durante esse período, obteve apenas uma vitória de Pirro: os custos foram tão elevados que, embora não tenha sido expulso de Damasco nessa altura, perdeu o controlo de vários territórios na Síria. Isto também significou a perda de campos petrolíferos, que antes da guerra civil representavam 25 por cento das receitas do Governo. Segundo o Ministério dos Negócios Estrangeiros sírio, apenas 20% da produção de petróleo permaneceu nas suas mãos. A isto somam-se as sanções económicas, a fuga de milhões de pessoas e a destruição de infra-estruturas, que impediram a reconstrução da Síria. Nestas condições, ele não conseguiu reabilitar o seu regime. O facto de hoje as multidões celebrarem a sua queda nas ruas também mostra que al-Assad foi capaz de defender o seu poder principalmente através de medidas militares e policiais (grifo nosso).”

Antes de responder adequadamente, precisamos recorrer a Nicolau Maquiavel, que, no capítulo IX da obra O Príncipe, traz uma lição por vezes esquecida pela esquerda: não existe poder no vácuo e nem em grupos pequenos. O poder só pode existir quando alicerçado em estruturas sociais sólidas. Ainda sem o conceito das classes (que seria desenvolvido séculos depois), o pensador florentino simplesmente analisa a sociedade e destaca que “o principado é constituído ou pelo povo ou pelos grandes”. À luz desse fato, como fica o governo Assad?

O próprio autor reconhece, conforme os trechos grifados, que o governante sírio não contava com o apoio, mas a oposição do imperialismo. Além disso, governava sob condições extremamente precárias, com a economia em ruínas.

Em uma conjuntura como essa, o mero apoio das forças de repressão são incapazes de conter as massas, como dezenas de experiências históricas demonstram. A mais eloquente delas, a do antigo Vietnã do Sul, que, sem o apoio do imperialismo, rapidamente foi retomado pelos revolucionários do Norte, que, por sua vez, conseguiram sustentar décadas de uma guerra contra o imperialismo apoiados fundamentalmente na população.

Em qualquer país da era imperialista, os governos (e em especial os governos dos países atrasados) só tem duas opções: ou estão socialmente amparados pela ditadura dos monopólios, ou estão amparados pelas massas oprimidas do país em questão. Não há uma terceira opção, por mais que o MRT diga “defender a ditadura de Assad estava a quilómetros de qualquer tipo de anti-imperialismo”, simplesmente porque é impossível um governo de um país atrasado sobreviver sem apoio, ou do imperialismo ou do povo e, para o segundo, necessariamente, terá de demonstrar ter uma política “anti-imperialista”.

Para os EUA e para “Israel”, a derrubada de Assad e o esfacelamento da Síria são peças centrais na manutenção da guerra genocida que fatalmente retomarão contra o Líbano e a Palestina, agora, em uma posição muito melhor.

O caos sírio enfraquece as forças da Resistência que resistem à expansão sionista e imperialista, permitindo ataques mais incisivos contra o Hesbolá e os palestinos. Será que é isso que o MRT também quer, mas hesita em assumir abertamente? Suas posições, contudo, deixam pouco espaço para dúvidas: ao se alinhar com a política imperialista, o MRT pode não ter consciência do fenômeno, mas defendem, na prática, os mesmos interesses dos algozes do povo sírio e palestino.

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