O movimento estudantil nos Estados Unidos, com suas ocupações em boa parte das universidades do país em defesa da Palestina e contra o sionismo, vem servindo para intensificar ainda mais a polarização em torno do genocídio sionista contra os palestinos.
A intensificação da mobilização vem servindo para separar, como se diz na linguagem popular, o “joio do trigo”, em especial na chamada esquerda dos Estados Unidos. Recentemente, em uma coluna assinada para o jornal The New Yorker, a escritora Zadie Smith, ligada ao movimento identitário, sobretudo em relação à questão racial, desenvolveu um artigo onde busca afirmar que as palavras “são como armas de destruição em massa” e crítica o “extremismo” dos manifestantes que saem às ruas em defesa da luta contra o sionismo.
Zadie inicia seu texto buscando desenvolver a ideia de que filosofia, ou seja, princípios, e políticas são coisas que andam juntas, e que apesar do perigo da “filosofia sem política”, há também um outro perigo muito importante, o da “política sem filosofia”. A escritora assim descreve a “realpolitik” como “demasiada pragmática” e elabora toda uma explanação que visa diferenciar a filosofia política dos pacifistas, que lutam por um ideal e que tem a percepção de que “o corpo que devemos colocar entre as engrenagens não é o do nosso inimigo, mas o nosso”, com aqueles que se radicalizam nos protestos de forma não pacifica.
Para a escritora existe sempre a luta pelo “mais fraco”, algo que mobilizaria de forma solidária as pessoas. No entanto, a mesma busca a todo momento afirmar que isso seria relativo e que se, por um lado, devemos nos sensibilizar pelo lado mais fraco em Gaza, devemos também nos sensibilizar pelos estudantes judeus que são acusados de serem sionistas pelos demais. De maneira cínica, a escritora afirma ser favorável a um cessar-fogo, porém “não há muito tempo foi definido como um espaço seguro, delineado pelos limites das ideias éticas de uma geração – pode muito bem acontecer que um estudante judeu que passe pela escola tendas, que é chamada de sionista e depois avisada para manter distância, é, naquele momento, o participante mais fraco da zona”. Sobre isso, é preciso dizer claramente que a “choradeira sionista” não tem nenhuma importância diante do massacre por eles promovidos na Faixa de Gaza. A solução para os estudantes pró-“Israel” é muito simples: se não se sentem à vontade na Universidade, basta não comparecerem mais à Universidade, procurarem um ambiente onde são bem-vindos.
A escritora vai além e afirma “o papel dos ‘mais fracos’ não é uma questão existencial independente do tempo e do espaço, mas, antes, uma situação contingente, continuamente sujeita a mudanças“. E destaca, assim, a “perigosa na ideia de que a preocupação com a terrível situação dos reféns [reféns israelitas] é de alguma forma contrária ou incompatível com a exigência de um cessar-fogo“.
A escritora busca criar um paralelo entre “o monstruoso e brutal assassinato em massa de mais de mil e cem pessoas, a maioria delas civis, dezenas delas crianças, em 7 de outubro” com o “monstruoso e brutal assassinato em massa”, colocando assim que Hamas e “Israel” seriam duas faces da mesma moeda. Algo totalmente absurdo, tendo em vista que o Hamas está levando adiante uma luta de libertação nacional, procurando priorizar alvos militares e se enfrentando com uma força de ocupação financiada e armada pelo imperialismo mundial. Enquanto os sionistas estão procurando manter a sua dominação sobre o povo palestino e não perder o seu Estado fictício, cuja única função é servir como um enclave imperialista no Oriente Médio.
A escritora vai além e ainda afirma que este é “talvez o exemplo mais agudo no mundo do uso de palavras para justificar assassinatos sangrentos, para aplainar e apagar histórias inacreditavelmente labirínticas e para proporcionar o prazer atávico da simplicidade violenta às muitas pessoas que parecem acreditar que apenas por dizendo algo, eles fazem isso”.
Por trás das palavras complicadas da autora, fica evidente que o que temos é a boa e velha defesa da censura. Embora ela, falsamente, se coloque contra a repressão dos jovens, a verdade é que ela considera que se deveria impedir os jovens de falarem as palavras de ordem do movimento que desagradam o imperialismo, sendo essas aquelas relacionadas ao fim do Estado de “Israel”, em defesa do Hamas e da Resistência Armada dos palestinos, todas reivindicações mais do que legítimas.
Assim, afirma que tanto a ideia de simplesmente acusar os palestinos de terrorismo é errado, como também afirmar que “Israel” é um “Estado colonialista sionista” também seria errado e que “aceitar essas três palavras como uma definição completa e incontestável do Estado de Israel, não apenas sob a liderança desastrosa de Benjamin Netanyahu, mas em todas as fases da sua longa e complexa história, e também para ouça-os como uma descrição perfeitamente suficiente de cada homem, mulher e criança que já viveu em Israel ou que nasceu nele”.
Evidentemente que não se deve considerar que a população israelense comum tenha alguma responsabilidade no massacre dos palestinos promovidos pelos sionistas, mas não é possível abrir nenhuma brecha nas críticas ao Estado de “Israel”, que é, desde a sua fundação, um projeto fascista de extermínio do povo que reside naquele território.
A demagogia vai além e ainda afirma que a “pessoa que usa a palavra ‘sionista’ como se essa palavra fosse um monólito inalterado e imutável, significando exatamente a mesma coisa em 2024 e 1948 que significava em 1890, ou 1901, ou 1920 – essa pessoa não traz tanta clareza definitiva à história emaranhada de judeus e palestinos enquanto eles traçam com sucesso e calmamente uma linha para marcar sua própria zona de interesse e onde ela termina“.
No entanto, não adianta querer complicar o debate, “sionismo” é uma política fascista e supremacista, sempre foi e continua sendo. Nesse sentido, não há nenhum problema em pedir o seu esmagamento, da mesma forma que não é crime nenhum pedir o esmagamento dos nazistas ou dos fascistas.
Toda sua ideia central consiste na tentativa de atacar o que há de mais importante nas manifestações ocorridas nos Estados Unidos: o seu radicalismo. Justamente a força do movimento que vem abalando universidades de todo país e inflou o movimento estudantil de diversos países no mundo é sua radicalização, é sua clara e objetiva disposição de lutar contra o imperialismo, contra o sionismo genocida e defender a resistência do povo palestino que luta de armas na mão.
A tentativa de se colocar como um “pacifista”, uma pessoa acima do bem e do mal no conflito é na realidade uma defesa do próprio sionismo. Se negar a denunciar veementemente a existência do próprio Estado de “Israel” é acobertar seus crimes que remontam há mais de 70 anos de história na região. A defesa da revolução palestinas só pode ser efetiva por meio de uma radicalização política geral. O que ocorre hoje nos Estados Unidos é justamente isso, e é isto que gera força a sua mobilização.