O Tribunal Superior Eleitoral publicou no último dia 10, em seu canal no Youtube, o vídeo intitulado “RAP da Democracia: campanha do TSE reforça liberdade de expressão, soberania e força popular”. Na produção, dois jovens negros (uma mulher, com trajes brancas onde se lê “democracia” e um rapaz mudo) enfrentam-se em uma batalha de rimas ao som de rap, acompanhados por uma claque que vibra a cada palavra de ordem proferida pela rimadora, a protagonista da campanha, que começa sua apresentação cantando que “liberdade de expressão não é licença, pra espalhar mentira, ódio, golpe e desavença”.
A cena prossegue com o que se supõe a vitória da moça e como sutileza não é o forte da burocracia, uma voz de fundo informa: “Na hora da verdade, a democracia fala mais alto. Justiça eleitoral. A justiça da democracia”. Como na novilíngua, “democracia” virou um eufemismo para as instituições burocráticas do Poder Judiciário, quem define a verdade e fala mais alto, são togados desconhecidos de quase toda a população, colocados em seus cargos, sabe deus por meio de que processo. A finalidade, no entanto, está clara: fazer, hoje, o que os militares faziam até 1985. E nisso se inclui o uso da censura para impor o silêncio.
A liberdade de expressão é assegurada pela Constituição Federal de 1988, que segundo o artigo 5º, inciso IV, estabelece uma, e somente uma restrição: o anonimato. Isso significa que se o cidadão quiser espalhar mentira, ódio, golpe, desavença e qualquer outra coisa do gênero, ele pode, desde que não se esconda. À população, naturalmente, é lícito debater se a norma constitucional está adequada ao sentimento social de justiça, se a norma deve ser alterada para caber outros limites ou modificada para não ter nenhum. É próprio da dinâmica vida política. O que não é de forma alguma lícito, é o setor judicial da burocracia definir da própria cabeça que o artigo 5º deve ser revogado, o que revoga, por tabela, a própria Constituição que os togados deveriam seguir à risca.
Tendo em vista o fato de que este não é um caso isolado, mas o próprio funcionamento normal do sistema judicial brasileiro, torna-se urgente a discussão de uma ampla reforma nas instituições do Estado, em especial as do Poder Judiciário. Não é sem receio de retaliações estatais que este Diário Causa Operária coloca o tema em discussão, mas tendo em vista o recrudescimento crescente das arbitrariedades cometidas pelo Judiciário, as organizações de luta dos trabalhadores, estudantes e dos movimentos sociais em geral precisa se atentar para o fato de que uma grande mobilização pela reforma da justiça é, cada vez mais, uma questão de sobrevivência.
Se quem fala mais alto é a justiça eleitoral e não o povo, não estamos diante de um regime verdadeiramente democrático, mas de uma ditadura. Combater essa ditadura e fortalecer a base social da esquerda, as massas operárias, camponesas e estudantis, é o único caminho seguro para as organizações populares não viverem um novo inferno à 1964, porém com os uniformes trocados.