Mais uma chacina cometida pela Polícia Militar, mais de dez pessoas assassinadas, algumas após serem torturadas. Bairros populares inteiros com sua população sendo hostilizada por homens armados que ameaçam matar algumas dezenas. Um verdadeiro filme de terror, um terror cotidiano no Brasil. E como num filme de terror, aparecem o governador do estado e a imprensa para dar requintes de crueldade a mais uma ação covarde do Estado contra o povo. As vítimas são acusadas sem qualquer embasamento de serem criminosas e o governador afirma que vai “reforçar o efetivo policial”.
Na última quinta-feira, um policial da Rota (um batalhão de forças especiais da PM) foi assassinado com um tiro próximo ao tórax durante um patrulhamento. A resposta da PM foi a padrão, sair matando qualquer um nas favelas, especialmente quem tiver ficha criminal. Se a pessoa foi presa há anos por um crime qualquer, como furto ou tráfico de drogas, entra na conta dos policiais. Não se trata de um serviço de inteligência que ligue essa pessoa a quem matou o policial, mas de pura e simples vingança. Uma vingança contra a população pobre de conjunto. Um pobre teria matado um policial, então dezenas de pobres serão torturados e assassinados.
O banho de sangue foi protagonizado com o reforço de 600 policiais no Guarujá. Agora a população pobre da cidade terá que sobreviver a 30 dias de ocupação policial nas favelas, que vai reunir agentes de todos os batalhões de operações especiais do estado. A Secretaria de Segurança Pública, vinculada ao governo Tarcísio, relatou à imprensa que não havia verificado abuso policial. Em entrevista coletiva após a chacina, o governador deu aquela passada de pano para a PM e disse que “a gente não quer de maneira nenhuma o confronto, mas a gente não vai tolerar a agressão porque a polícia reage para repelir a ameaça”.
Como exemplo dessa ação para “repelir a ameaça”, um camelô foi torturado e assassinado sob testemunho dos moradores da Vila Bahiana. Sem qualquer envolvimento com o assassinato do PM, Felipe Vieira Nunes foi escolhido para saciar a sede de sangue dos policiais porque teria em algum momento da sua vida passado pelo radar da justiça brasileira, ficando com ficha criminal. Moradores chegaram a denunciar o acontecido para uma equipe da Rede Bandeirantes que esteve no local, mas nada do que os moradores informaram foi publicado pela empresa, que no lugar de relatar as informações que coletou no local se limitou a reproduzir a versão da PM.
É interessante como um acontecimento desses, que não é nenhuma novidade no Brasil, joga no ridículo duas das bandeiras adotadas por uma esquerda completamente desnorteada: a campanha pelo desarmamento da população civil e o combate às “fake news”. Por um lado, a probabilidade de que o tiro que teria matado o policial tenha saído de uma arma desviada de algum CAC (caçador, atirador ou colecionador) é praticamente nula. E por outro, quem afirma nas suas páginas que as pessoas mortas na retaliação policial são integrantes de facções do crime organizado tem imunidade contra as tais “fake news”. É o desarmamento que deixa armado quem mais mata no país e o combate à falsificação de informações que dá anistia vitalícia a quem espalha mentira sem parar.
Além de abandonar essa defesa inconsequente da repressão estatal, é urgente que a esquerda se mobilize com clareza pelo fim das polícias, em especial a Polícia Militar, e em defesa da liberdade de expressão irrestrita. Não é possível falar em democracia se a maioria da população brasileira não tem nenhum direito garantido diante de um policial. Não faz nenhum sentido censurar a internet, onde é possível ouvir a versão dos moradores desses bairros sitiados, para deixar o monopólio das comunicações falar sozinho para o conjunto da população brasileira. O sangue dos inocentes mortos pela polícia nos últimos dias está nas mãos de Tarcísio e dessa imprensa canalha que ainda pede por mais.