Entre as diversas arbitrariedades que se vê todos os dias envolvendo, particularmente, o poder Judiciário no Brasil, chama muita atenção um acontecimento recente que foi amplamente divulgado na imprensa, apesar de muito pouco ter sido esclarecido sobre ele: a suposta agressão a Alexandre de Moraes em um aeroporto em Roma.
A história é que Moraes teria descido do avião e sido abordado por três pessoas, Roberto Mantovani Filho, Andreia Munarão e Alex Zanatta Bignotto, que o teriam insultado, supostamente. Também há relatos de uma suposta agressão contra o filho de Alexandre de Moraes. O fato foi negado pelas vítimas, que afirmaram que houve apenas um empurrão contra o filho de Moraes porque este estaria se direcionando de forma agressiva a Andreia Munarão, esposa do empresário Roberto Mantovani Filho.
Na versão dos três supostos agressores, a confusão já estaria estabelecida no aeroporto, com outras pessoas xingando Moraes também e teria sido a reação do ministro que levou à escalada na discussão com os três acusados. Mesmo a questão da agressão teria sido uma reação, conforme já mencionado. O fato é que há duas versões para a história, que não está claramente estabelecida, devido à falta de imagens públicas do ocorrido.
Aliás, a falta de imagens em si também é algo digno de nota. Quando ocorre qualquer entrevero do gênero, “pipocam” vídeos na internet poucas horas depois e vindos de todos os lados. No entanto, em um caso como esse, que está sendo discutido nacionalmente e que está tendo uma grande repercussão, não é possível ver nenhum vídeo e nenhuma foto da discussão. A família acusada teria entregue um vídeo para a Polícia, mostrando Moraes chamando-os de “bandidos”, mas o vídeo fora descartado como prova, após a Polícia apontar a suspeita de que ele tenha sido “editado”.
O Aeroporto de Roma já forneceu imagens para a Polícia Federal brasileira. A PF afirma que as imagens confirmam a “agressão física” (um tapa) contra o filho de Alexandre de Moraes, apesar de essas imagens serem inacessíveis para qualquer cidadão comum, o que levanta suspeita sobre todo o caso.
Uma parte da esquerda se mostra escandalizada com o ocorrido. A Revista Fórum classifica as supostas agressões como “faces da barbárie de Bolsonaro”, enquanto outros órgãos como Diário do Centro do Mundo e Brasil 247 procuram relatar todo o caso tomando o ponto de vista do ministro.
O caso é, naturalmente, algo de pequeníssima importância. Afinal de contas, Alexandre de Moraes é uma figura pública e sua atuação persecutória contra todo o povo brasileiro, embora inspire alegria em alguns desmiolados inconsequentes e em pessoas, é algo que causa revolta na maioria da população. É evidente e provável que eventualmente ele pudesse ser assediado de alguma forma nas ruas. Não é que se deva defender esse tipo de conduta, mas o fato é que é algo que pode ocorrer. É importante lembrar também que, quando esse tipo de coisa era feito com dirigentes do PT, a imprensa burguesa não se escandalizava e não protestava com a mesma veemência como fazem agora.
O mais escandaloso de tudo, no entanto, é que, após o ocorrido, a Polícia Federal, que colhe depoimento dos envolvidos, também foi instada a fazer uma operação de busca e apreensão na casa dos supostos agressores, a fim de procurar algo que possa incriminá-los em algum possível ato criminoso (já que está difícil de condená-los por um simples bate-boca no aeroporto).
Uma ação como essa, se tivesse ocorrido em um país como a Venezuela, levaria a todo um escândalo em toda a imprensa internacional. No entanto, como é no Brasil supostamente democrático e é conduzida por Moraes, um dos principais agentes do imperialismo, é tudo encarado com a maior normalidade.
Para piorar, o Ministro da Justiça, Flávio Dino, falou que as supostas agressões poderiam ser enquadradas em crime de atentado contra o estado democrático de direito. Alguns órgãos de imprensa e supostos “especialistas” falam em “atentado contra a honra”. Apesar de não estar claro ainda, é possível que, com o novo “Pacote Bolsonaro” do governo, pessoas que expressem indignação contra ministros em aeroportos peguem anos de prisão por causa disso.
A repressão escalou de forma tão escandalosa que certos setores da própria imprensa burguesa manifestam que há um certo exagero nas especulações. Um editorial do jornal Folha de São Paulo, afirma: “O que não se pode fazer, mas foi o que se fez, é inverter a ordem natural do processo só porque o ofendido é ministro do STF. Pior: sem indícios suficientes, elevou-se a injúria à categoria das tentativas de abolição do Estado democrático de Direito e autorizou-se uma ação de busca e apreensão em todo carente de justificativas oportunas”. Mostrando que a própria burguesia se preocupa com tais exageros de Alexandre de Moraes.
O editorial também afirma, de forma mais ou menos correta: “Admitindo-se que Moraes e seus colegas pretendam com isso apenas reagir à altura do que consideram ameaças sérias, também aí estarão equivocados: a facção golpista que cresceu sob Jair Bolsonaro (PL) se regozija a cada novo desequilíbrio do Poder Judiciário”. E, para piorar, toda essa repressão será associada ao governo Lula e à esquerda, que embarcaram num último período em uma política extremamente repressiva, usando uma suposta perseguição à extrema-direita como justificativa.
Além disso, a imprensa de esquerda não ajuda muito no caso, já que, ao comentar o editorial da Folha, o jornal online Brasil 247 afirma que “Folha minimiza agressão a Alexandre de Moraes e sua família”.
É preciso colocar com absoluta clareza que isso é uma verdadeira escalada na repressão do regime e que não é possível apoiar medidas como essas. Um setor da esquerda continua vivendo na fantasia de que, contra meus inimigos políticos, valem quaisquer tipos de arbitrariedades. Não é possível conceber como normal que uma pessoa tenha sua casa revistada, computadores e celulares apreendidos e sua vida revirada, porque xingou alguém no aeroporto. Estamos diante de uma verdadeira ditadura do Judiciário e isso precisa ser amplamente denunciado.