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Antônio Vicente Pietroforte

Professor Titular da USP (Universidade de São Paulo). Possui graduação em Letras pela Universidade de São Paulo (1989), mestrado em Linguística pela Universidade de São Paulo (1997) e doutorado em Linguística pela Universidade de São Paulo (2001).

Música brasileira

Breve discussão sobre a MPB

Reconsiderações sobre a Bossa Nova e o Tropicalismo

 Desgostar de algo, em regra, encaminha uma discussão… gostar, por sua vez, pode ser convite para participar de determinado grupo, em vista do reconhecimento, em quaisquer agremiações, nascer do gosto por coisas afins. Dizer “não gosto” é trazer à tona polêmicas, sempre presentes, mas eventualmente escondidas sob a linguagem… embora dizer “não gosto” expresse o “bom” ou o “mau” gosto, isso não se dá somente porque alguns “sabem das coisas” e outros “não sabem”, mas porque “gostar” é, antes de tudo, transitar em sistemas de valores.

              Nos dias de hoje, em supostos tempos da crise do sujeito e da representação, é difícil estabelecer padrões absolutos, capazes de orientar a beleza, a bondade ou a verdade, por isso é tão difícil se valer do gosto para dizer alguma coisa. Dessa maneira, o gosto sumiu das discussões aparentemente sérias; nelas, o gosto se disfarça de análise.

              Atualmente, as teorias do discurso procuram resolver questões polêmicas, tais quais o gosto, com o postulado da inter-incompreensão constitutiva. Em outras palavras, os discursos, nessas teorias, não se definem em relação a fatos, mas se definem uns em relação aos outros; essas relações são polêmicas porque, no mínimo, dois discursos se contrariam mutuamente. Não se trata de um discurso, porventura, polemizar com outros discursos; trata-se, isso sim, de afirmar que todos os discursos são gerados em polêmicas.

              Desse ponto de vista, afirmar não gostar de jazz não denunciaria, por vezes, desconhecimento da linguagem musical, mas que nos colocamos em determinada posição diante de quaisquer polêmicas. Diga-se de passagem, não há consenso sobre o conceito de jazz… em vista disso, em que polêmicas discursivas se fundamentariam os discursos da música popular brasileira?

              Antes de tudo, o que seria MPB? Não é possível responder sem fazer algumas teses; contudo, quem leu histórias da música popular brasileira sabe que a Bossa Nova e o Tropicalismo são divisores de águas e de discursos. Para alguns, há a música brasileira, pura e genuína, levada adiante por chorões, seresteiros, tocadores de violas e sanfonas, e há a Bossa Nova e o Tropicalismo, cujos artista dialogam, constantemente, com músicas estrangeiras. Trata-se, em linhas gerais, de uma polêmica regida por valores regionais versus valores universais; nela, em regra, quem se entusiasma com influências estrangeiras não compreende quem as considera danosas à cultura nacional.

              A “Pequena história da música popular brasileira”, de José Ramos Tinhorão, é exemplar quando se dedica a isso. Tinhorão é historiador nacionalista, isso se denuncia quando ele discorre, entusiasticamente, a respeito de tangos brasileiros, modinhas e lambadas; todavia, nos capítulos sobre a Bossa Nova e o Tropicalismo, suas conclusões são bastante conservadoras. Para o autor, os músicos da Bossa Nova se equivocam quando se justificam por meio da presumida “linguagem universal do jazz”, semelhantemente aos tropicalistas, quando dialogam com a presumida “linguagem universal do rock”. Tinhorão tem razão quando aponta as duas abordagens, ambas problemáticas, pois não há linguagens universais, todas elas são marcadas historicamente; entretanto, também não há culturas genuínas, toda cultura é gerada em polêmicas e por meio de influências, às vezes, contrárias e contraditórias. Dessa maneira, se chorinhos, maxixes, modinhas e lambadas não são gêneros genuinamente brasileiros, não há por que desvalorizar a Nossa Nova e o Tropicalismo pelos mesmos motivos.

              Quanto às linguagens musicais, comumente, afirma-se que a Bossa Nova é influenciada pela harmonia do jazz. O jazz, entretanto, não se resume à harmonia; jazz é, antes de tudo, tema e improviso; fora os grupos de música instrumental, raramente os cancionista da Bossa Nova praticam improvisos, seja com a própria voz, seja deixando espaço para os instrumentistas, relegados a simples acompanhantes. O Tropicalismo, por sua vez, parece mais próximo da música pop tocada nas rádios do que do rock; faz parte de tradição do rock vocalistas competentes, solistas de guitarra, tecladistas e bateristas virtuosos, e isso, com exceção de Sérgio Dias e Arnaldo Batista, não existe no Tropicalismo. A filosofia sexo, drogas e rock’n’roll está distante das canções de Caetano Veloso e Gilberto Gil; o próprio rock brasileiro, em grande maioria, aproxima-se mais da música pop que do próprio rock, conforme se verifica nos trabalhos de Raul Seixas e de Rita Lee, depois dos Mutantes, nas parcerias com Roberto de Carvalho.

* A opinião dos colunistas não reflete, necessariamente, a opinião deste Diário

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