O sectarismo e o oportunismo são dois lados da mesma moeda. A esquerda pequeno-burguesa oscila facilmente entre um e outro desses lados.
A eleição de Lula, e agora equipe de transição, assim como o próprio governo Lula num futuro próximo, estão deixando a esquerda totalmente desnorteada. Tal desorientação fica explícita numa polêmica entre os pseudo trotskistas do MRT e os proto-stalinistas da UP. Vejamos alguns bons momentos desse embate, em artigo escrito pelo MRT no Esquerda Diário chamado “UP-FENET vira conselheira na transição de Alckmin com a direita e os neoliberais”
Primeiro é preciso lembrar que ambos os grupos tinham uma posição parecida durante o primeiro turno da eleição. Ambos faziam a caracterização de que Lula era o candidato da burguesia. Confundiam a política conciliadora com um apoio real do imperialismo e do chamado “mercado” a Lula. Já explicamos muitas vezes que essa caracterização é errada, o que se comprova com os ataques a Lula por parte desses setores, incomodados com as declarações de Lula contra o teto de gastos e outras coisas.
A posição comum dessa esquerda fica mais ou menos resumida no seguinte trecho da matéria do MRT:
Seu futuro governo será junto com os grandes empresários e políticos burgueses, defensores das reformas e dos ataques que tanto afetam nosso povo, e não vai revogar medidas implementadas ao longo dos últimos anos que foram nefastas para a vida da juventude e da classe trabalhadora como as reformas trabalhista, da previdência e do ensino médio – pelo contrário, conta, na transição, com os articuladores dessas reformas.
A crítica do MRT é simples: a UP, após ter passado a eleição toda acusando Lula de ser o candidato dos capitalistas, decide participar da equipe de transição para esse futuro governo Lula. Equipe formada por elementos do PT e da esquerda, mas por uma série de nomes da direita, inclusive com a liderança de Geraldo Alckmin, um dos motivos pelos quais essa esquerda fechava a cara quando se falava em apoiar Lula.
Na contramão de qualquer crítica a conciliação de classes, a presença dessa organização como conselheiro de uma equipe repleta da mais alta burocracia petista da juventude e até mesmo de um integrante do MDB, indica qual caminho que esse partido [UP] pode trilhar no futuro governo Lula-Alckmin.
Nesse ponto, o MRT está certo. Na campanha do primeiro turno, cara fechada e críticas a Lula para manter a feição de radical. Na equipe de transição, participação em uma equipe liderada por nada menos que Geraldo Alckmin. Mas quem resiste a um cargo, não é mesmo?
A UP segue a linha do PSOL, que criticou Lula e o PT até quando pôde e ingressou na coligação com Geraldo Alckmin e tudo.
O MRT, contudo, perde-se na sua avaliação do próprio governo Lula. Enquanto a UP “mudou de ideia” diante da possibilidade de um cargo, o MRT mantém-se firme em sua análise sectária do governo Lula.
Se antes já deveria ser óbvio que a burguesia não queria Lula, o comportamento dos capitalistas agora não deveriam deixar dúvidas. O MRT acredita, no entanto, que “o futuro governo será junto com os grandes empresários e políticos burgueses, defensores das reformas e dos ataques que tanto afetam nosso povo”.
Ou seja, para o MRT, o governo Lula já é um governo burguês de ataques ao povo. O MRT tem certeza de que Lula fará a política dos banqueiros. Não sabemos de onde vem essa certeza toda, porque Lula, em que pese sua política conciliadora, tem desagradado muito os banqueiros.
O sectarismo do MRT impede que enxerguem a realidade. Não conseguem discernir um governo puramente burguês de um governo de frente popular, de conciliação de classes, e que foi eleito graças à mobilização dos trabalhadores, tendo uma certa independência da burguesia.
Essa confusão sectária abre o caminho para uma posição golpista do grupo, como aconteceu no golpe de 2016. O MRT, até os 45 do segundo tempo, ao invés de chamar a lutar contra o golpe, denunciava o governo Dilma por ser “burguês”.
O MRT afirma que é preciso independência do governo. Isso é verdade, mas como conseguir essa independência sem ser aliado da direita? A caracterização do MRT não permite isso. Se o futuro governo Lula é burguês, um governo dos bancos como afirma o MRT, não faria nem sentido falar em independência. O correto seria fazer oposição aberta ao governo.
Com essa confusão, o MRT é jogado na vala da direita, essa sim em oposição a Lula.
A independência verdadeira, que o MRT não entende, é manter uma política própria, a defesa de um programa próprio dos trabalhadores, empurrando o governo para a esquerda, desgrudando do governo os elementos direitistas.
Não fazer parte de um governo de conciliação pode ser a primeira condição para essa independência, coisa que a UP nunca buscou. Mas essa política precisa ser acrescida de uma caracterização que permita fazer com que o movimento dos trabalhadores, que votaram em Lula esperando a derrota da política golpistas, avance.