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Carla Dórea Bartz

Jornalista, com 30 anos de experiência (boa parte deles em comunicação corporativa). Graduada em Letras e doutora pela USP. Filiou-se ao PCO em 2022.

Cinema e Política

Mephisto e a esquerda adormecida

Mephisto é um filme sobre a apatia da esquerda em momentos históricos que exigem ação

Mephisto

Há uma cena de Mephisto (Mephisto,1981), dirigido pelo cineasta húngaro István Szabó, que é primorosa: o ator Hendrik Höfgen (Klaus Maria Brandauer) está dormindo quando um amigo entra correndo em seu apartamento para avisar que Hitler havia sido escolhido como chanceler da Alemanha.

O amigo alerta Höfgen da urgência da situação e que um protesto veemente é necessário para impedir que a Alemanha siga pelo caminho do absurdo, mas o ator não lhe dá ouvidos, dizendo que não era o momento e que ele estava exagerando.

A cena é simbólica. Ela representa a apatia na hora da tomada de decisão pelas forças que deveriam ser as primeiras a se erguerem contra a ameaça do horror. O momento histórico em que vivemos nos mostrou com clareza como isso acontece: a recusa à mobilização da classe trabalhadora desde o golpe contra Dilma Rousseff ainda é, infelizmente, a norma e evidencia os caminhos equivocados dessas lideranças de centrais sindicais, de partidos políticos de esquerda e das demais forças progressistas na leitura da conjuntura histórica e na condução dos trabalhadores em momentos que exigem ação máxima e urgente.

No nosso caso, tudo isso ainda vem embrulhado no apelo sensacionalista ao medo e à indignação nas redes sociais, nesses ambientes onde impera uma cacofonia de ideias superficiais e medíocres que revelam o comportamento individualista e cafona de pessoas e instituições que deveriam liderar o debate. Neste espetáculo de massa imbecil, a única meta é o número de likes.

O filme de Szabó é um dos melhores filmes sobre a II Guerra Mundial e sobre a ascensão do nazismo na Alemanha que já assisti. Seu foco é o papel do artista e da arte em momentos extremos. O personagem de Brandauer é um jovem ator que faz peças brechtianas, mas sem a convicção ideológica que os tempos lhe impõem.

Ele pensa que é mais esperto que os nazistas, que pode enganá-los, que pode usar seus atributos de ator e de celebridade como proteção. Será que conseguimos elencar exemplos atuais do mesmo comportamento? Sua inspiração está na peça Dr. Fausto, de Goethe. No teatro, para deleite da plateia nazista que ele tenta seduzir, Höfgen interpreta Mephisto, o espírito diabólico com quem o médico faz um pacto demoníaco em nome da glória pessoal.

O filme é uma adaptação do romance de mesmo nome de Klaus Mann, publicado em 1936, no auge da ascensão do Terceiro Reich. Klaus era filho do escritor Thomas Mann, vencedor do prêmio Nobel. Essa é uma história interessante: anos depois da publicação do livro de seu filho, Mann escreverá seu próprio Dr. Fausto, que também é sobre um artista, no caso, um compositor, fazendo uma reflexão sobre o gênio alemão na música clássica e a loucura dos pactos demoníacos.

Szabó explica seu principal objetivo com a adaptação: “eu queria mostrar o problema na esperança de que o espectador se identificasse com o personagem e depois sentisse vergonha. E se ele se sentir envergonhado, entenderá e passará a se conhecer melhor. E talvez esse sentimento de vergonha – esse sentimento catártico de vergonha – seja uma vacina contra situações assim. Este é o nosso esforço com aquele filme. Eu vejo o filme como um remédio”.

A complexidade do enredo de Mephisto está no fato de que o personagem principal não é um nazista, não é um bolsotário. Ao contrário. Portanto, esse processo catártico de vergonha está associado àqueles que, como apontado acima, estavam dormindo quando a História os chamava à ação.


Também não podemos descartar a hipótese de que Szabó buscou fazer um filme sobre a própria situação da Hungria e do leste europeu comunista no início da década de 1980. Recentemente, escrevi sobre Danton, o processo da Revolução, filme do diretor polonês  Andrzej Wajda, realizado em 1983. Esses filmes captam, de maneira distinta, mas estranhamente complementares, as crises daqueles anos que culminariam na queda do Muro de Berlim e no fim da União Soviética. Vale a pena entendê-los neste contexto também.

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