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Chico Buarque

Identitárias conseguem o que a ditadura não foi capaz de impor

Nesta semana o compositor Chico Buarque anunciou que vai aceitar a censura das “feministas” identitárias e não cantar mais a famosa música “Com açúcar, com afeto”.

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Segundo ele há muitas críticas das “feministas” e vai aceitar o banimento da música de seus shows.

Isso mesmo ele aceitou a censura. Chico Buarque fez sua carreira artística, além obviamente da capacidade poética e musical, afirmando sua oposição à censura durante a ditadura militar. 

Suas músicas falavam o que a classe média conservadora da época não gostava de ouvir, particularmente a denúncia contra a censura da ditadura (Apesar de você, Cálice, Roda Viva etc) e contra os relacionamentos “super felizes” apoiados na tradicional família conservadora, onde as mulheres têm a infelicidade em forma de vida. 

A tristeza da vida feminina na sociedade conservadora da época, que se mantém nos dias atuais para a esmagadora maioria das mulheres, junto com a denúncia da censura, sempre foram temas recorrentes em suas músicas, cantadas nas rádios, em bares e nas fossas, pois expressão da vida real das pessoas. 

Longe de esqueminhas e discursos cansativos e repetitivos inventados nas modorrentas salas das universidades, as músicas de Chico Buarque trouxeram à luz aspectos importantes vida real do povo e das mulheres, por isso a tão longeva apreciação de várias gerações por sua obra. 

Conhecidas músicas como Ana de Amsterdan, Teresinha, História de Lily Braun, Mulheres de Atenas, Olhos nos Olhos, Tatuagem, Palavra de Mulher e muitas outras expressaram e expressam a situação da mulher. O que fazer, vamos banir e censurar talvez a parte mais importante da obra de Chico Buarque? E por quê?

Mesmo considerando a hipótese, como mera especulação, de que as músicas fossem “datadas” estas seriam um registro importante da cultura do nosso povo e da formação da nossa identidade musical.

Como o assunto é delicado os identitários (sim, também os homens identitários concordam integralmente com as “feministas”, suspeito não!) não falam abertamente o que pretendem, afinal sopa quente se come pela beirada.

Chico Buarque há anos vem sendo alvo da direita e dos identitários. Será que tem alguma relação com sua amizade pública com Lula? Pra pensar…

Entrando diretamente no assunto da música “Com açúcar com afeto” censurada pelos identitários, abaixo a letra:

Com açúcar, com afeto
Fiz seu doce predileto
Pra você parar em casa
Qual o quê
Com seu terno mais bonito
Você sai, não acredito
Quando diz que não se atrasa

Você diz que é um operário
Sai em busca do salário
Pra poder me sustentar
Qual o quê
No caminho da oficina
Há um bar em cada esquina
Pra você comemorar
Sei lá o quê

Sei que alguém vai sentar junto
Você vai puxar assunto
Discutindo futebol

E ficar olhando as saias
De quem vive pelas praias
Coloridas pelo sol

Vem a noite e mais um copo
Sei que alegre ma non troppo
Você vai querer cantar

Na caixinha um novo amigo
Vai bater um samba antigo
Pra você rememorar

Quando a noite enfim lhe cansa
Você vem feito criança
Pra chorar o meu perdão
Qual o quê
Diz pra eu não ficar sentida
Diz que vai mudar de vida
Pra agradar meu coração

E ao lhe ver assim cansado
Maltrapilho e maltratado
Como vou me aborrecer?
Qual o quê
Logo vou esquentar seu prato
Dou um beijo em seu retrato
E abro os meus braços pra você

A música é a exata expressão de inúmeros casamentos nas favelas e em setores de classe média baixa, particularmente, no Rio de Janeiro, nos dias atuais. Só pessoas que vivem em outro mundo podem censurar esta música com o argumento de que está “datada”, traduzindo: coisa antiga que não acontece mais. 

Nas famílias de baixa renda a regra é a mulher lutar desesperadamente para que o marido e os “filhos homens” “não se percam nas ilusões do mundo” porque o cotidiano massacrante empurra estas pessoas para:

“No caminho da oficina
Há um bar em cada esquina
Pra você comemorar
Sei lá o quê

Sei que alguém vai sentar junto
Você vai puxar assunto
Discutindo futebol”

A posição “compreensiva” da mulher de “Com açúcar com o afeto” é muito comum. Na realidade é a junção da falta de alternativa da mulher que depende do marido e uma certa pena da fraqueza e de uma certa “infantilidade” do trabalhador que num momento é a “esperança” da família, o elemento com maiores recursos econômicos e sociais e, no outro, diante das dificuldades e da falta de perspectiva perde o controle e aparece                          

“Maltrapilho e maltratado
              Como vou me aborrecer?
              Qual o quê
              Logo vou esquentar seu prato”

Para surpresa da pequena burguesia identitária, as mulheres de periferia não só esquentam o prato dos maridos, depois de bebedeiras, como fazem as marmitas para o dia seguinte e ajudam os maridos a se recuperarem para trabalhar no dia seguinte.

Quem já fez reuniões em bairros populares após clássicos importantes de futebol sabe que é o dia do “maltrapilho e maltratado” e um dia de muito trabalho para garantir que os filhos e maridos não faltem ao trabalho no dia seguinte. Por isso a burguesia não gosta de futebol e os patrões da construção civil contabilizam os prejuízos após os jogos importantes.

Hoje em dia, além do “bar em cada esquina” tem também os pancadões onde os “filhos homens”, como elas costumam se referir, podem também sair no camburão da Rota.

Só quem nunca conversou com o povo, as esposas e mães, nas favelas e nas periferias pode achar que a maioria das mulheres se livrou da carga pesada de ser dona de casa, cuja função basicamente é fazer o serviço doméstico massacrante e repetitivo, o qual não tem fim (não estamos falando das “donas de casa” fake que só não trabalham fora, mas tem funcionárias para sustentar todo o trabalho doméstico).

Atualmente estima-se que no Brasil cerca de 45% das mulheres trabalhem fora, no entanto, estão incluídos trabalhos precários (a maioria) que longe de garantir algum tipo de independência financeira (condição fundamental para independência pessoal) só mascaram o fato de que a esmagadora maioria das mulheres depende fundamentalmente dos maridos e filhos para sobreviver.

Os identitários consideram que o fato de que uma ínfima minoria de mulheres chegou à Globo, à Vogue, à Prada resolveu o problema das mulheres no Brasil. Ledo engano, alguém precisa esclarecer aos identitários que o Leblon não é o Brasil.

Com o financiamento de vultuosos recursos do imperialismo, a onda identitária repete em escala planetária que temos um mundo novo, como diziam os nazistas, pretendendo destruir tudo que não se enquadre no seu plano pré concebido para esta nova raça de pessoas.

Neste plano as mulheres são livres e, portanto, vamos banir músicas, livros, pensamentos (por que não?) que mostrem um mundo diferente.

Os identitários fundamentalmente são elementos da pequena burguesia, os quais vivendo isolados na bolha conservadora de classe média têm mais facilidade de agressivamente defender coisas absurdas como a censura à músicas, livros, imprensa etc, afinal de contas é tudo pelo bem das mulheres, negros, índios etc. A censura para o bem!

 A falta de contato com a realidade da população humilde do país e os privilégios sociais são a base desta atitude histérica e profundamente repressiva diante da história, da cultura e da vida do povo brasileiro.

É preciso condenar amplamente a política dos identitários de censura e destruição da história nacional, da sua cultura e do ambiente de verdadeiro presídio em que se pretende transformar o ambiente cultural do país, com os carcereiros identitários definindo o que é permitido falar, fazer e pensar.

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