Uilson de Sá, 47, religioso e ativista que atuava há vários anos ao lado dos moradores da Reserva Extrativista Mangabeira, em Aracaju, SE, foi encontrado morto, com sinais de violência pelo corpo, mãos e pés amarrados. Esta é a última reserva extrativista de mangaba de Aracaju. A fruta é típica das regiões de cerrado e agreste do Nordeste.
Uilson de Sá tinha uma história de vida ligada à mangaba que ajudou sua mãe e ele a sustentarem sua família, vendendo as frutas próximo ao aeroporto de Aracaju, que não fica distante da reserva. Por isso, a liderança dedicou-se totalmente à causa dos trabalhadores extrativistas que estão no local há mais de 60 anos. Sua morte representa um ato de violência fascista contra um missionário e ativista local que se opunha ao poder econômico e político na capital sergipana.
Alguns fatos relativos à especulação imobiliária na área da reserva precisam ser trazidos à tona com esse assassinato. Uma década, aproximadamente, nos separa das primeiras notícias sobre o aumento estratosférico dos preços de imóveis em Aracaju. Na sequência dos acontecimentos, tramitou até passar o projeto da construção de um parque no local, que está dentro da área de melhorias e urbanização da prefeitura de Aracaju, a denominada Zona de Expansão. Ao olharmos no mapa, vemos que a reserva de Uilson fica na área urbana, dentro da cidade e próxima a residências, praias, hotéis, rodovias, aeroporto, condomínios etc. A área é pequena e muito valorizada por sua localização.
Em 28/04/2022, a Prefeitura Municipal de Aracaju, em sua imprensa oficial, anunciou o lançamento do projeto do parque, que contará com um conjunto habitacional no local. Ela afirma ter dialogado com a comunidade. Todavia, a comunidade não sustenta a afirmação do prefeito. Desde o início do ano de 2022, a comunidade composta pelos extrativistas tradicionais e por moradores do entorno da reserva diz que não se opõe à construção do conjunto habitacional, mas que este pode ser feito em outro local, não prejudicando a área da reserva.
O projeto divulgado prevê o cercamento da área com as mangabeiras, para protegê-las, supostamente, de invasores ilegais e especulação. Todavia, o cercamento irá cortar 50 das mangabeiras que são fonte de sustento da comunidade. A orientação original do projeto previa o corte de 200 árvores, mas, com negociações e estudos, foi possível preservar 110 árvores adultas. O projeto prevê também o replantio de mangabeiras, mas são vários anos até que a árvore produza o suficiente para sustento de famílias. A cada mangabeira caída, mais fome para os extrativistas e para os que lucram com o parque no lugar da reserva.
A especulação imobiliária e o agronegócio acuam as populações do campo e de reservas extrativistas como esta de Aracaju. Ações deste tipo aconteceram recentemente no Oeste da Bahia, fazendo vítimas entre a população que resiste às invasões do capital sobre as terras e as vidas das comunidades que ali vivem por décadas.
Se agronegócio, especulação imobiliária, forças repressivas e judiciárias se armam de tratores, máquinas pesadas e bala, o exemplo de Uilson de Sá nos lembra da necessidade da organização de grupos para autodefesa das comunidades pobres e que realmente estão na linha de frente da resistência e da luta no campo. Uilson estava sob o Programa de Proteção a Defensores dos Direitos Humanos, do Ministério da Família, Mulher e Direitos Humanos, e estava recebendo atendimento individualizado de policiais desde 2018, segundo publicação da Carta Capital. Depoimento de parentes afirmam que a vítima não gostava de ligar para a polícia toda vez que sofria uma ameaça. Mais uma vez: autodefesa é essencial na luta popular.