O portal Esquerda Online, pertencente ao MAIS ─ corrente interna do PSOL que se diz trotskista ─, publicou um artigo assinado por Henrique Canary que poderia muito bem ter saído de qualquer jornal do Partido da Imprensa Golpista (PIG) a respeito dos Clubes de Caçadores, Atiradores e Colecionadores (CACs) e do armamento.
Utiliza como mote a troca de tiros envolvendo Roberto Jefferson, no último final de semana. O argumento do autor é que a flexibilização do acesso a armas a partir dos CACs permite a bolsonaristas como Jefferson utilizá-las ilegalmente. De onde Canary tirou que as armas de Jefferson foram obtidas através dos CACs? Não sabemos. Porque o tipo de armamento utilizado por ele não é fornecido por esses clubes. O artigo de nosso interlocutor, assim, assemelha-se à histeria provocada pelos jornais burgueses quando ocorre algum tiroteio nos EUA, por exemplo, e culpa-se os jogos de videogame. Uma coisa não tem absolutamente nada a ver com a outra.
Assumindo o mesmo moralismo reacionário da imprensa capitalista, reclama do desvio de armas obtidas legalmente como “principal fonte de armamento do crime”. Mas os CACs, mais uma vez, não têm a ver com isso, porque a maioria das armas obtidas pelos “criminosos” (Canary não consegue se diferenciar do discurso da burguesia mais reacionária), como todos sabem, é através de esquemas envolvendo as próprias autoridades públicas, ou seja, a polícia e o exército. Nem os criminosos, nem os bolsonaristas, têm os CACs como fonte de armas ─ estes últimos também utilizam as estruturas da polícia e das forças armadas, uma vez que a própria base social fiel a Bolsonaro é composta em grande medida por policiais e militares. Nenhum deles precisa dos CACs.
Ora, se nem os “criminosos” nem os bolsonaristas vivem dos CACs, qual a verdadeira razão da preocupação do MAIS? Em um dado momento, Canary utiliza uma nova desculpa para se opor ao direito ao armamento ─ que é o que realmente o motiva a desferir seus ataques aos CACs.
“Apesar das medidas de liberalização, é necessário apontar que a compra e o licenciamento de armas continua sendo uma atividade bastante cara, o que desfaz completamente o mito de que quem está se armando é o ‘cidadão comum’. Na verdade, o perfil do CAC brasileiro é de homem branco de renda média e alta, ou seja, o apoiador típico de Bolsonaro”, recita o autor.
Esse é o grande argumento da esquerda pequeno-burguesa que tenta se passar por revolucionária e que busca esconder sua política totalmente contrarrevolucionária. A liberação da venda de armas apenas favoreceria, segundo esse pensamento, os ricos, pois os pobres não têm dinheiro para comprá-las.
Mas se fosse assim os pobres não teriam automóveis, por exemplo. Proporcionalmente, a maioria dos automóveis e os carros de maior qualidade logicamente são comprados pela classe média e pela burguesia, mas o fato de ser permitido o comércio de automóveis faz com que os pobres tenham acesso a eles, pois juntam dinheiro para comprar senão um automóvel de boa qualidade e novo, ao menos um de segunda mão ou de qualidade inferior.
O acesso às armas a partir dos CACs, ademais, é mais viável para os trabalhadores do que tirar a Carteira Nacional de Habilitação (CNH). Também é mais viável do que obter o direito ao armamento pela Polícia Federal. Antes da flexibilização insuficiente emitida pelo governo Bolsonaro, a posse e o porte de armas era um crime absurdo. Agora existe uma facilidade muito maior para o trabalhador comum se armar, embora não seja ainda o ideal ─ a completa liberação do armamento para todos.
O colunista da Folha de S.Paulo, perdão, do Esquerda Online, diz que “trata-se unicamente de mais um mecanismo para destruir a democracia no país” a flexibilização da posse e porte de armas. Defende, portanto, que o trabalhador não possa se armar porque isso “destruiria a democracia” no Brasil. Mais uma vez o argumento não tem nenhuma diferença daquele utilizado pelos jornalistas mais repugnantes da imprensa capitalista ou pelos políticos mais asquerosos da direita nacional. A “defesa da democracia”. O MAIS vive em um mundo paralelo, onde não vivemos sob um regime golpista há seis anos, onde as instituições não estão integralmente sob o controle da direita e onde não há frequentes chacinas policiais na periferia. Vive em uma democracia, que estaria ameaçada porque agora existe uma possibilidade maior de os trabalhadores se armarem.
Essa é uma posição contrarrevolucionária, burguesa e extremamente direitista. A democracia que o MAIS defende é a mesma que os marxistas e revolucionários sempre lutaram para derrubar, isto é, a ditadura da burguesia e do imperialismo sobre a esmagadora maioria da população. E onde essa luta foi exitosa isso só ocorreu com o povo armado.
O que quer o MAIS é manter o completo monopólio estatal sobre as armas. Armas para reprimir o povo. Isso fica explícito quando Canary faz uma defesa vergonhosa da principal fonte de repressão do estado sobre a população, a polícia:
“E as coisas não tendem a melhorar. Está em tramitação no Congresso Nacional o PL 3.723/2019, que acaba com o impedimento do transporte de armas carregadas a qualquer horário do dia e limita o rastreamento de munição. O rastreamento de munição é um dos principais mecanismos de investigação utilizados pela polícia no desbaratamento de ações violentas e combate ao crime organizado. Ele permite rastrear uma cápsula encontrada em uma cena de crime até sua origem, revelando todos os compradores e vendedores legais desde a fábrica. Isso vai acabar”
Ou seja, a polícia precisa ter o controle de tudo o que é relacionado com o armamento. Isso retira a folha de parreira que era o argumento de que “só os ricos poderão se armar, por isso somos contra”. Canary e o MAIS querem simplesmente a repressão da polícia, símbolo maior da ditadura e desigualdade no acesso às armas no nosso país.
Eis o seu lema: “Armas? Só para a polícia e para a burguesia. Para os trabalhadores, a repressão!”