A Marinha do Brasil, dominada pelo bolsonarismo, quer impedir que João Cândido, líder da Revolta da Chibata (1910), seja inserido no Livro de Heróis e Heroínas da Pátria.
A Comissão de Cultura do Senado Federal aprovou a inscrição de João Cândido na sexta-feira, 29 de outubro. O projeto segue para votação na Câmara dos Deputados. Entretanto, em nota, o Alto Comando da Marinha disse que a Revolta da Chibata é “um péssimo exemplo e um episódio a ser lamentado”.
“A Marinha não reconhece o heroísmo das ações daquele movimento e o considera uma rebelião”. Os castigos físicos aos marinheiros são descritos como “não corretos”, porém a rebelião dos marujos contra as torturas aplicadas pelos oficiais com o uso de chibatadas são condenadas como “ruptura do preceito hierárquico”.
Os bolsonaristas que comandam a Força Naval querem barrar a homenagem, pois não aceitam o significado político da Revolta da Chibata. O fato é que o movimento dos marinheiros pode ser apontado como uma ação de tipo grevista, baseado em uma reivindicação democrática.
João Cândido liderou o movimento que mobilizou 2.379 marinheiros sob os gritos de “abaixo a chibata” e “viva a liberdade”. O fato que deflagrou a rebelião foi o castigo aplicado a Marcelino Rodrigues Menezes. Ele foi amarrado ao mastro do encouraçado Minas Gerais e recebeu 250 chibatadas diante dos demais marujos.
Os marinheiros rebeldes tomaram 4 navios de guerra na Baía de Guanabara e apontaram os canhões para a cidade do Rio de Janeiro, na época a capital do País. Esta última seria bombardeada caso os castigos físicos não fossem abolidos.
Na mensagem enviada ao Marechal Hermes da Fonseca, presidente do Brasil, os rebeldes declararam:
“Pedimos a V. Exª. abolir a chibata e os demais bárbaros castigos pelo direito de nossa liberdade, a fim de que a Marinha brasileira seja uma armada de cidadãos, e não uma fazenda de escravos que só tem dos seus senhores o direito de serem chicoteados”.
Cabe destacar que João Cândido, apesar de ter sido anistiado duas vezes, foi preso e mantido em regime de solitária. Sua expulsão da Marinha deu início a um processo de perseguição política por parte do oficialato. O líder rebelde jamais pôde servir à Força novamente e teve que sobreviver como estivador e vendedor de peixe.
A tentativa de impedir que João Cândido tenha o reconhecimento devido pelo seu heroísmo na luta pelo direito democrático dos praças da Marinha demonstra a importância histórica da Revolta da Chibata. Inclusive, pode-se dizer que a Revolta foi um momento importante da luta democrática do povo negro no Brasil, daí a importância de celebrar sua memória e compreender seu significado político no presente.