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Fundamentalismo islâmico

A luta contra o imperialismo não é um problema moral

Opressão cultural ou opressão econômica e militar? Qual a causa da insurreição afegã contra a ocupação norte-americana?

Em artigo publicado no dia 20 de agosto no portal RT, o filósofo pseudomarxista Slavoj Zizek afirma que “o fundamentalismo islâmico não tem nenhum problema com a brutalidade de lutas econômicas e militares, seu verdadeiro inimigo não é o neocolonialismo econômico ocidental e a agressividade militar, mas sua cultura ‘imoral’”.

Segundo ele, “o que faz o Ocidente liberal tão insuportável para eles não é somente que ele pratica a exploração e a dominação violenta, mas que, para adicionar insulto à injúria, ele apresenta essa realidade brutal sob o disfarce do seu oposto: liberdade, igualdade e democracia”.

Isto é, para Zizek, os afegãos não se rebelaram contra o imperialismo porque não aguentavam mais passar fome e morrer de bombas que explodiam sobre suas cabeças, mas sim porque detestam a “cultura ocidental”. O escritor esloveno não embarca na onda discriminatória da direita e da burguesia, segunda a qual os afegãos são “bárbaros” que ameaçam os valores ocidentais ou que, por serem bárbaros, deveriam ser dominados. Seu equívoco, embora não seja um preconceito, é acreditar que tudo não passa de uma luta moral, e não material.

Zizek se considera é um discípulo e estudioso de Hegel e, apesar de se pretender marxista, não abandonou o idealismo hegeliano. Ao contrário do que pensa o articulista, os afegãos se rebelaram por motivos inerentemente materiais. Basicamente, pela luta pela sobrevivência.

Os Estados Unidos não levaram os direitos humanos junto com a guerra de agressão, como diz Zizek. Ao que parece, a propaganda da CNN e do New York Times influenciou enormemente o teórico “antissistema”.

“O fato é que a ocupação norte-americana do Afeganistão criou gradualmente um tipo de sociedade civil secular, com muitas mulheres educadas, empregadas e conscientes de seus direitos, e também com uma importante vida intelectual independente”, comenta. O imperialismo é realmente a salvação das mulheres! As afegãs se empoderaram nesses 20 anos de ocupação dos EUA! Vivas aos tanques e às bombas norte-americanas!

Artigo recente deste diário, assinado por Afonso Teixeira, traz informações que refutam a tese da melhoria de vida durante a ocupação norte-americana. “As taxas de educação continuaram baixas; a saúde foi privatizada; a mortalidade infantil é a maior do mundo hoje; a renda per capita é a 8ª menor do mundo; o analfabetismo é o 6º maior; a expectativa de vida de homens e mulheres é de 44 anos; o IDH é maior apenas que o de 10 países da África e um da Ásia, o Iêmen que, por sinal, está em guerra; a educação é a 16ª pior do mundo”, escreve. Contraditoriamente àquele pensamento, em alguns quesitos o primeiro governo do Talibã (1996-2001) foi melhor para o povo afegão do que os 20 anos de ocupação: “O índice de educação do país, durante o regime do Talibã, subiu, em cinco anos, de 0,125 para 0,226. Em vinte anos de ocupação, subiu de 0,226 para 0,365. Ou seja, em cinco anos de Talibã, o índice subiu 80%; em vinte anos de ocupação, subiu apenas 60%.”

Apesar de deturpada por Zizek, podemos considerar que, naturalmente, a realidade cultural afegã foi modificada (ou ao menos tentou-se) pelos invasores. Sempre quando uma potência se apodera de outro território, ela impõe costumes e tradições que facilitem sua dominação. No Afeganistão, não foi diferente. Por exemplo, o uso da burca não foi mais obrigatório, a moda “ocidental” adentrou o país, bem como aspectos da cultura norte-americana e europeia. “Esse fundamentalismo [islâmico, do Talibã] cresceu em reação à influência do secularismo liberal e do individualismo ocidental”, diz Zizek.

Entretanto, a tese não está correta, justamente porque Zizek parte da consciência para explicar a vida, e não da vida para explicar a consciência. Não parte da realidade concreta, mas sim de abstrações.

A própria cultura imposta pelos invasores (no caso, pelos EUA), só foi imposta através da dominação econômica. Inúmeras empresas norte-americanas e europeias tomaram conta da economia afegã, que foi totalmente privatizada e entregue aos grandes monopólios. Essa modificação na economia do país leva a uma modificação (maior ou menor) dos costumes e hábitos. Mas não são esses costumes e hábitos a grande causa de revolta de uma população contra um invasor, e sim o impacto do domínio econômico na vida econômica da população.

Os trabalhadores afegãos, miserável, viram a exploração de sua força de trabalho aumentar exponencialmente, os camponeses perderam suas terras, os comerciantes foram esmagados pelos monopólios estrangeiros. Além da dominação econômica, logicamente a agressão militar foi outro fator fundamental para a revolta popular. Afinal, ou se expulsava os norte-americanos ou centenas de milhares de pessoas continuariam sendo exterminadas. A luta pela sobrevivência é integralmente material, e não moral.

Podemos comparar o caso afegão com outros exemplos históricos e veremos grande semelhança. Os vietnamitas expulsaram os norte-americanos porque estavam sendo vítimas de uma exploração econômica e uma agressão militar insuportáveis, os cubanos derrubaram o regime títere e nacionalizaram as empresas estrangeiras porque passavam fome enquanto os capitalistas que frequentavam os bordéis em Havana enriqueciam. Nenhum desses povos tem uma cultura fundamentalista islâmica. Não têm um antagonismo tão ferrenho à cultura ocidental como o Talibã. E mesmo assim expulsaram os norte-americanos após muita resistência popular e ainda fuzilaram os colaboradores do antigo regime. Odiavam a cultura “imoral” dos norte-americanos? Não. Se rebelaram, como sempre se rebelam os povos, devido à opressão material, econômica e militar. Não à opressão cultural, moral. A luta contra o imperialismo nunca foi por questões morais, mas por questões materiais, concretas, reais.

O Talibã recebeu enorme apoio popular não porque representa a cultura afegã apenas. Logicamente que por ser um movimento enraizado na cultura popular afegã, facilita o recebimento de simpatia da população. Mas os outros grupos que atuavam no país também são culturalmente e moralmente afegãos. A diferença é que o Talibã se propôs a expulsar o imperialismo, acabar com a opressão militar e econômica do imperialismo no Afeganistão. E mesmo que não tivesse consciência disso (embora já demonstrou que tem), a sua luta prática sempre foi nesse sentido, por isso o enorme apoio que recebeu.

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