O site vermelho do PCdoB tem sido o mais ardoroso defensor da frente ampla, em praticamente todas as questões os colunistas e articulista do vermelho apresentam o estabelecimento de um grande acordão entre a direita e a esquerda como a “solução” para todos os males.
O que fazer diante da pandemia? Frente Ampla, aliança pela “vida” com os governadores de direita. Diante da crise política e do fracasso do governo Bolsonaro? Frente ampla com Ciro, Marina e FHC. Para aprovar ou rejeitar qualquer medida legislativa? Frente ampla no Congresso, com Rodrigo Maia. Não satisfeitos, até mesmo os acontecimentos históricos são reinterpretados de acordo com a noção de que os sucessos e as “vitórias” foram produzidas pela adoção dos princípios da frente ampla.
Para defender essa perspectiva, o Vermelho tem convidado colunistas que não são integrantes do PCdoB para defender a frente ampla. Dessa feita, o economista e ex-diretor do FMI, Paulo Nogueira Batista Jr assina o texto sobre-a-polemica-proposta-de-uma-frente-ampla.
A frente ampla não tem sido um consenso na esquerda, as críticas proferidas pelo ex-presidente Lula aos manifestos e proclamações “unitárias” evidenciou que a frente ampla não tem gerado convergências. O artigo de Paulo Nogueira tem um caráter defensivo, reconhecendo que “ a questão é espinhosa” e que “ as reações negativas” seriam “ compreensíveis”. E mais ainda, apresentando-se como um digamos um “colaboracionista sincero”, afirma que diante da falência do centro, para “enfrentar a extrema-direita, a frente ampla é na verdade uma aliança entre a esquerda e a direita.
“A ideia de uma frente ampla em defesa da democracia é polêmica e suscita reações negativas compreensíveis. A principal razão é clara. Nos anos recentes, praticamente desapareceu o centro político no Brasil. Não existe mais, a rigor, um conjunto discernível e relevante de forças políticas de centro. Deve-se reconhecer, portanto, que propor uma frente ampla significa propor uma aliança da esquerda com a direita – uma aliança contra a extrema direita que se instalou em Brasília.” https://vermelho.org.br/coluna/sobre-a-polemica-proposta-de-uma-frente-ampla/
O colunista do vermelho é conhecedor que os pretensos aliados de hoje foram os principais adversários de ontem, inclusive entre eles consta a direita tradicional que deu o golpe de 2016.
“A proposta é inegavelmente indigesta. A direita tradicional merece os epítetos que a esquerda costuma lançar contra ela. É repulsivo, em especial, defender a democracia ao lado de figuras que apoiaram e ativamente promoveram o golpe parlamentar de 2016 e as barbaridades subsequentes. A questão, leitor, é que – como a Inglaterra de Churchill – o Brasil corre um risco mortal.” (idem)
Entretanto, a “sinceridade” do defensor da frente ampla vai somente até ai, ou seja reconhece o óbvio, que a direita tradicional que fala em nome da democracia, foi ela mesma que deu o golpe. O que Paulo Nogueira não explora no seu artigo, é que o bolsonarismo não é fruto do acaso, mas é uma consequência, digamos “indigesta” da política golpista. Além disso, o que também não é explicitado é que em todas as ocasiões, inclusive, agora na crise do governo Bolsonaro, a direita tradicional realizou uma frente com a extrema direita contra a esquerda e o povo. O acordo para congelar os salários dos servidores públicos, e as medidas que permitem as demissões e os cortes dos salários entre os partidos da direita e o governo Bolsonaro são alguns exemplos entre muitos.
O governo estaria “desgastado” e “isolado” sem praticamente nenhum apoio da sociedade. Entretanto não estaria liquidado, por isso é preciso a construção da aliança entre “toda a oposição, pois o governo “Ainda tem, apesar de tudo, capacidade de produzir grandes estragos.”
“Nessas condições, não deve a oposição de esquerda ou centro-esquerda engolir seco e trabalhar em conjunto, quando houver oportunidade, com forças da direita tradicional dispostas a defender a democracia e fazer oposição ao governo? Na minha modesta opinião, a resposta deve ser afirmativa.”( idem)
Mais uma vez, Paulo Nogueira omite uma questão relevante, se existe essa crise profunda do governo, o que garante a sustentação de Bolsonaro? Não são simplesmente os bolsominios e as Forças Armadas como apresenta a imprensa, mas sobretudo a direita tradicional que faz uma “ oposição” que busca enquadrar Bolsonaro e não ir para um enfrentamento final, pelo menos na atual etapa.
O autor apresenta que diante de um governo de “ destruição nacional”, uma vez que “ temos um governo que se enrola na bandeira nacional para rastejar aos pés dos Estados Unidos”, é preciso construir um governo de “ união nacional”, e novamente é evocado o exemplo histórico da Inglaterra de Churchill para justificar a reconhecidamente “ indigesta aliança” com a direita( pois não existe mais centro) que deu o golpe de 2016.
“Seja como for, só há uma coisa pior do que lutar com aliados: lutar sem aliados – outra tirada de Churchill que merece ser lembrada. Ele sabia perfeitamente que a União Soviética era indispensável na guerra contra a Alemanha e não permitiu que escrúpulos anticomunistas dificultassem a luta contra o inimigo principal. Mutatis mutandis, é o que precisamos fazer hoje.” ( idem)
Em geral, os exemplos históricos levantados pelos defensores da frente ampla são falsos. O exemplo histórico geralmente citado, o movimento Diretas Já em 1984 no Brasil, não significou um enfrentamento contra a ditadura militar, mas um acordo entre a oposição e setores civis da própria ditadura. Neste sentido, a aliança o exemplo da aliança Churchill-Stalin não foi um modelo de frente contra o fascismo como querem apresentar.
Na década de 1930 e 1940, a política dos países imperialistas “ democráticos” como a Inglaterra e a França não era de “ frente ampla” contra os nazistas e contra o fascismo. Durante a guerra civil espanhola, enquanto a extrema- direita golpista, liderada pelo general Franco recebia uma ajuda incomensurável de Mussolini e Hitler, a Inglaterra defendia a não intervenção, o que foi decisivo para a vitória da contrarrevolução. A política expansionista da Alemanha nazista foi de sobremaneira incentivada pela política de apaziguamento adotada pelas Inglaterra e França. Nas vésperas da II Guerra, era uma possibilidade real a aliança entre o imperialismo inglês com a Alemanha contra a URSS, o que evitou isso, foram os conflitos de interesses entre diferentes imperialismos. O controverso acordo germano- soviético, foi estimulado por esse temor.
Além disso, já durante a guerra, os aliados (EUA e Inglaterra) evitaram a todo custo abrir uma nova frente de combate ocidental contra os nazistas, que invadiram o território da URSS. Somente depois, que perceberam que o Exercito Vermelho estava liquidando os nazistas e poderia expandir sua influência para toda Europa continental, que foi executado o dia D. Ao terminar, a guerra a política adotada pelos três grandes ( EUA, Inglaterra e URSS) foi a divisão do mundo, sendo que o stalinismo fez um acordo que rifou a revolução que apresentava-se concretamente em países como a Itália e Grécia.
Como se vê, o exemplo histórico apresentado por Paulo Nogueira para justificar a frente ampla entre a esquerda e a direita é tão somente uma construção ideológica para defender uma colaboração de classes.
Uma questão crucial para derrotar o fascismo e a extrema direita é a necessidade de uma frente única das organizações populares. Neste sentido, rejeição da política de frente ampla, não é simplesmente por uma ojeriza moral diante de tantos cafajestes políticos da direita tradicional, como inclusive o próprio colunista do Vermelho reconhece, mas decorre de uma luta pela independência política, uma vez que a frente ampla significa desarmar os trabalhadores, e colocar a esquerda a reboque da direita golpista.