A Funai se recusou, em documentos oficiais enviados ao MPF (Ministério Público Federal), a adquirir alimentos para as comunidades, alegando não ter obrigação de garantir a segurança alimentar dos povos indígenas.
“Não é crível que mesmo com recursos orçamentários disponibilizados para tanto e com dispensa de licitação para aquisição de itens para enfrentamento da emergência de saúde pública decorrente do novo coronavírus (Lei 13.979/2020, art. 4º), as cestas básicas e materiais de higiene, que possuem caráter emergencial, não tenham chegado aos destinatários, por razões de ineficiência administrativa”, diz a ação judicial iniciada em Santarém pelo MPF.
O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou duas ações civis públicas, em Belém e Santarém, para obrigar a Fundação Nacional do Índio (Funai) e a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) a fornecerem cestas básicas e material de higiene para povos indígenas no Pará enquanto durar a pandemia do novo coronavírus. O pedido havia sido feito antes, por meio de recomendações do MPF, mas apesar de reconhecer a necessidade, os órgãos do governo federal não entregaram, até hoje, os alimentos e kits de higiene suficientes para atender a todas as comunidades.
A demora na entrega das cestas pode ser uma das causas para a contaminação em comunidades indígenas. Sem acesso seguro aos alimentos nas aldeias, muitos indígenas tiveram que se deslocar para as cidades para acessar benefícios sociais e adquirir mantimentos, o que pode ter provocado a contaminação pela covid-19. Nas regiões citadas nos processos do MPF, foram registradas mortes pela doença entre os povos Borari, Xikrin, Kayapó, Assurini, Gavião, Aikewara e Tupinambá. Todos os outros seguem ameaçados de contágio, pela situação de insegurança alimentar.
O risco de disseminação do novo coronavírus dentro de terras indígenas a partir de deslocamentos para as cidades era bem conhecido de todos os órgãos que atuam na questão. Em 2 de abril, o MPF emitiu recomendação à Secretaria Especial de Saúde Indígena e à Funai para que tomassem medidas em todo o país para evitar esses deslocamentos e prevenir os contágios.
Os dois órgãos reconheceram os riscos em respostas oficiais ao MPF. A Sesai elaborou um plano em que recomendava aos indígenas que não se deslocassem para os centros urbanos, dada a “reconhecida vulnerabilidade das populações indígenas às doenças respiratórias”. São comuns na história dos povos indígenas os genocídios provocados por epidemias de enfermidades que atacam o sistema respiratório, e, diante disso, a posição dos golpistas é ampliar esse cenário dramático.