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O Império ataca, mais uma vez

EUA, ONGs, imprensa… a rede golpista por trás da derrubada de Evo

O Golpe de Estado na Bolívia em 2019 foi planejado e executado com mais cuidado e mais atores do que aquele de 2008, para não falhar. Mas a mão dos EUA é aquela com mais sangue.

“É preciso fazer um alerta para o mundo e dizer claramente: a Bolívia está diante de um golpe de Estado fascista financiado pelos Estados Unidos, semelhante ao que tentaram realizar em 2008. Como há dez anos, quando fizeram tremular a bandeira nazista em Santa Cruz, hoje saúdam a suástica e, tal como antes ocorreu em Sucre, cometem todo tipo de abusos como obrigar uma senhora a se ajoelhar e pedir perdão por ser indígena e pobre”.

Assim, anonimamente, descreveu o golpe de Estado na Bolívia um dirigente do Movimento ao Socialismo (MAS), departamento de Santa Cruz. Antes disso, o site Behind the Backdoors[1] já havia descrito com detalhes como o golpe ocorreria, nomeando seus autores e funções.

Após o golpe ter sido concretizado, muitas outras vozes denunciam o golpe[2] e o papel que nele exerceram os Estados Unidos e os entreguistas de direita e da extrema-direita boliviana (e apoiadores brasileiros). Dos Estados Unidos, desde funcionários da embaixada americana na Bolívia a ONGs, a imprensa, políticos, mercenários e provavelmente religiosos teriam tomado parte do planejamento e da execução do golpe.

Não há novidades nisso. Os EUA têm longo histórico de intervenção no continente latino-americano e sua participação em uma dezena de golpes de estado está bem documentada, oficialmente documentada. O que chama a atenção nesse golpe especificamente é que não tiveram muito cuidado em serem pegos e não durou muito para que provas de sua participação viessem à tona.

É importante, portanto, considerar o que já se conseguiu descobrir até o momento e, assim, não apenas denunciar os conspiradores, mas atentar daqui por diante para seus movimentos e presença no restante do continente. Conhecer para combater.

O Centro Estratégico Latinoamericano de Geopolítica (CELAG) debruçou-se sobre as informações disponíveis e elaborou um informe[3] e um ‘mapa’ em que se vislumbra o papel de diversos atores na ‘construção’ do golpe na Bolívia.

Sem replicar o trabalho realizado pelos pesquisadores da CELAG, podemos apontar os seguintes atores:

  1. a) Os meios de comunicação nacionais e estrangeiros, que prepararam o terreno, ao fabricar as matrizes das opiniões negativas/falsas sobre o presidente Evo Morales e sobre as eleições vindouras;
  2. b) a direita e a extrema-direita que anunciava, sem base factual, que as eleições seriam fraudadas e, após os resultados parciais, acusaram o Tribunal Eleitoral e o partido do presidente Morales de fraudarem efetivamente as eleições;
  3. c) a Organização dos Estados Americanos (OEA) que inventou supostos indícios de fraude e divulgou um informe ‘preliminar’[4] acusando problemas nas eleições, sem apontar fatos ou apresentar provas, como irregularidade na contagem de votos;
  4. d) Os comitês cívicos, dirigidos por empresários da extrema-direita. Foram eles que iniciaram bloqueios e ataques aos cidadãos, prédios, e que cooptaram a polícia para ajuda-los nas manifestações violentas que se multiplicaram em parte do país;
  5. e) a Polícia Nacional saiu dos quartéis e passou a exigir aumento salarial, somando-se à horda de grupos paramilitares que tinham a missão de gerar o caos continuado nas grandes cidades da Bolívia;
  6. f) grupos civis não claramente identificados, mas que foram armados e se apresentaram uniformizados, como uma milícia, com objetivo especifico de ameaçar e infligir medo a dirigentes do partido MAS, isso se estendeu a ministros e funcionários menores, que eram obrigados a confirmar que renunciaram a seus cargos. Esses grupos espancaram pessoas, queimaram casas, violentaram famílias inteiras;
  7. g) O Exército, por fim, usando a imprensa pediu a renúncia de Evo Morales e, conforme relato do próprio presidente boliviano, havia um prêmio pela cabeça do mandatário da Bolívia[5].

Mas esses são basicamente os atores internos, com exceção da OEA, os que executaram o golpe. No entanto, a rede dos que participaram do planejamento, financiamento e apoio estratégico e tático do golpe é muito maior.

A OEA, por meio de seu Secretário Geral, Luis Almagro, um fantoche dos Estados Unidos, teve um papel importante ao coordenar as vozes de países alinhados aos norte-americanos para validar o golpe. Além do mais, foi a OEA que forneceu a narrativa que os meios de comunicação usaram para deslegitimar Evo Morales e as eleições vencidas por ele. Todos os meios de comunicação dos Estados Unidos e da Europa reproduziram opiniões e ‘matérias’ que justificavam o golpe e demonizavam Evo Morales[6], afirmando que um segundo turno seria o correto e, posteriormente, a necessidade de novas eleições gerais sem Evo Morales.

Agencias e instituições dos EUA que atuaram na Bolívia por muito tempo e mantiveram contatos e infiltrados no país. Não seria a primeira vez que teriam auxiliado a planejar um golpe no país, a financiá-lo e agido contra os interesses da população boliviana. Lembramos que em 2008 foi tentado um golpe, devidamente contido, que provocou a expulsão do Embaixador dos EUA, Philip Goldberg, e do próprio DEA do território boliviano.

A já conhecida U.S. Agency for International Development (USAID)[7] tem um longo histórico no continente e está diretamente ligada ao grupo de direita que tentou dividir a Bolívia em diversas oportunidades.  A USAID por sua vez, terceiriza o financiamento para outras instituições por meio da fundação National Endowment for Democracy (NED)[8].

A National Endowment for Democracy (NED) então financia outras instituições, visando apoio a partidos políticos, organizações da sociedade civil e meios de comunicação[9]. Do mesmo modo duas fundações financiadas pelo NED, a saber: Fundación Observatório de Derechos Humanos y Justicia, e a Fundación de los Derechos Humanos, foram responsáveis por uma denuncia apresentada na Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da OEA contra Evo Morales[10].

O Instituto Republicano Internacional, o Instituto Democrático Nacional, a Fundación Nova Democracia[11] e a Agencia Nacional de Prensa de Bolivia, também financiados pelo NED, atuaram por longo tempo na formaram lideranças políticas no país, com base nos ‘ideais’ de livre mercado, de democracia representativa, e na formação da opinião pública boliviana. Todos atuaram para replicar a narrativa do caos, da incompetência do governo Morales, da fraude, para marcar Evo Morales como um ditador.

A Fundación Milenio mantém um papel ativo na campanha para desmoralizar a política econômica do governo de Evo Morales e seu partido. É um think tank de economia também financiado pela NED, e elabora relatórios anuais sobre o estado da economia boliviana. Sua opinião ‘especializada’ é replicada na imprensa local[12], visando condicionar a “opinión pública” do país.

O Departamento de Estado Americano (DEA) publicou neste ano um relatório[13] sobre investimentos na Bolívia e ressaltou que o país carecia de “segurança jurídica” e que denúncias de corrupção e ‘incentivos de investimentos pouco transparentes’ seriam impedimentos fortes para investir no país.

As Forças Armadas bolivianas, graças à militarização da luta contra as drogas, foi mais uma das que foi fortemente influenciada pelos EUA, via assistência militar, treinamentos, participação em ações conjuntas (convênios bilaterais), produziu um numero de oficiais alinhados aos norte-americanos, em posições importantes, que acabaram tendo papel fundamental no golpe de estado de 2019: o chefe das Forças Armadas da Bolívia, General de Brigada Sergio Orellana Centellas[14]; General  Vladimir Yuri Calderón[15], Comandante Geral da Polícia; e Comandante em Chefe das Forças Armadas, Williams Kaliman[16]. Além de outros, devidamente gravados em articulações para promover o golpe, todos com passagem nos EUA e seus cursos.

Por fim, para voltarmos aos elementos internos, pode-se falar de uma grande rede de direita, que se organizam com braços em diversos países da América Latina e alhures, que fazem um trabalho de longo prazo, quase sempre dissimulado na forma de projetos levado a cabo por fundações, ONGs e pelos meios de comunicação.

Foram identificados alguns atores e as organizações a que estariam vinculados:

Oscar Ortiz Antelo, deputado pela Unidad Democratica, é o criador, como apontado mais acima, da Fundación Nueva Democracia e, portanto, conta com financiamento do NED desde 2008. Faz parte, por isso, de uma grupo de direita bem articulado na América Latina (Unión de Partidos Latinoamericanos[17]) e com contatos nos EUA (Alternativa Democrática para las Américas).

Carlos Mesa, candidato da direita que disputou contra Evo Morales, esteve diretamente ligado ao planejamento e execução do golpe, sendo uma voz presente na OEA. Sabe-se que manteve reunião com o ex-presidente da Colômbia, Andrés Pastrana, que tem relações de amizade com Fernando Camacho. A Colômbia foi o país que mais contundentemente culpou Evo Morales pela violência e pela desestabilização da Bolívia.

Raúl Peñaranda, diretor da FIDES, agencia de notícias membro da Agencia Nacional de Noticias (ANN). Esta participa da Sociedad Interamericana de Prensa, promotora de campanha continuada contra os governos progressistas do continente. A FIDES recebe financiamento da NED e mantém vínculos com universidades norte-americanas.

Waldo Albarracín, decano da Universidad Mayor de San Andrés, é membro

Do Conselho Nacional em Defesa da Democracia (CONADE), sendo considerado um dos principais articuladores do golpe. Em uma coletiva de imprensa, convocou uma ‘resistência civil’ para defender o voto e garantir o segundo turno no país.  Tem vínculos com a Logos International University (universidade religiosa com sede em Miami. Tem acesso à imprensa norte-americana que reproduz suas opiniões (sempre negativas sobre o governo Morales e em favor da direita boliviana).

Jhanisse Vaca Daza, dirigente da ONG Rios de pie (Standing Rivers), que utilizou sua plataforma para disseminar informação manipulada e gerar indisposição a políticas do governo nacional. A plataforma é financiada pela Freedom Fellowship da Human Right Foundation (HRF)[18]. Dela partiram acusações contra o governo boliviano em relação aos incêndios na Amazônia, replicou opiniões negativas sobre as eleições (fraude).

Ivan Arias Durán, é tido como um protagonista da operação secreta que antecedeu o golpe. Teria se reunido com Jaime Antonio Alarcón Díaz e outros membros dos comitês cívicos, todos de oposição a Evo Morales, quando planejaram obter equipamentos de votação rápida para as eleições, com o objetivo de manipular a opinião pública[19].

Abaixo replicamos o infográfico produzido pela Celag, que permite uma visão de conjunto das interrelações desses atores e da ação do imperialismo em mais um golpe contra a América Latina.

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NOTAS:

[1] Cf.: https://bbackdoors.wordpress.com/2019/10/08/us-hands-against-bolivia-part-i/

[2] Por exemplo, Alfredo Serrano Mancilla, em https://www.celag.org/quienes-son-los-responsables-del-golpe-en-bolivia/

[3] Cf: https://www.celag.org/wp-content/uploads/2019/11/ee-uu-y-la-construccion-del-golpe-en-bolivia-1.pdf

[4] Está claro hoje que tudo foi cronometrado e que esse informe serviu aos propósitos, já planejados, de gerar uma falsa comoção e justificar ações violentas de grupos ligados à oposição ao governo de Evo Morales.

[5] Após esse ‘pedido’ de generais, Evo Morales e Alvaro García Linera, o vice-presidente, renunciaram, afirmando que o faziam para evitar um derramamento de sangue.

[6] BBC, New York Times, Washigton Post, The Guardian, France 24, Reuters et caterva.

[7] A partir de 2005, o Escritório de Iniciativas de Transição (OTI) da USAID dirigiu a maior parte de seu financiamento para os projetos separatistas da Meia Lua (Santa Cruz, Beni, Pando e Tarija).

[8] A NED é uma organização ‘sem fins lucrativo’ dos EUA, fundada em 1983 e tem o objetivo declarado de promover a democracia no exterior. Seu financiamento se dá principalmente por meio de uma alocação anual do Congresso dos EUA, na forma de uma concessão concedida pela Agência de Informações dos Estados Unidos (USIA). Atua como uma fundação de concessão de doações.

[9] O NED usou entre outros, só em 2018, a Fundación Milenio, o Instituto Republicano Internacional (IRI), a Fundación para el Periodismo, e a Agencia de Notícias Fides Compañia de Jesús, em projetos que se orientavam aos comícios presidenciais.

[10] Referente à reeleição do presidente.

[11] Essa fundação foi criada pelo senador da Unidade Democrática (Departamento de Santa Cruz), Óscar Ortiz Antelo, partido de oposição ao MAS, de Evo Morales. A fundação é membro da Rede Atlas, vinculada aos irmãos Koch, e criada nos anos 1980 por conservadores norte-americanos com o mesmo discurso de defesa e promoção do ‘livre mercado’ e dos ‘valores liberais’.

[12] El Diario, Página 7, El Deber e Correo del Sur.

[13] Cf. https://www.state.gov/reports/2019-investment-climate-statements/bolivia/  além desse informa, pelo menos desde 2017, os EUA produziu comunicados oficiais, fez declarações e fez tramitar projetos de lei que não deixam dúvida de seu papel nas eleições presidenciais na Bolívia.

[14] Participou do curso Operações cívico-militares, em 2003, na Escola das Américas.

[15] Foi um agregado policial em Washington até 2018.

[16] Agregado militar nos EUA entre 2013 e 2016 e participante do curso Comando e Estado Maior, em Fort Benning, em 2003.

[17] A Unión de Partidos Latinoamericanos, criada em 1992, tem entre seus membros o Partido Conservador de Colombia, o partido Propuesta Republicana (PRO) de Argentina, o Movimiento Demócrata Social de Bolivia, o Partido Conservador de Nicaragua entre outros. Por sua vez, o grupo está ligado à Unión Democrática Internacional (UDI), fundada em 1983 por Margaret Thatcher,  George H.W. Bush, entre outros ícones do neoliberalismo e do imperialismo.

[18] A Human Rights Foundation  é financiada pelo governo norueguês. No começo do ano, promoveu o Oslo Freedom Forum, realizando na Cidade do México, evento que reuniu toda a extrema-direita latino-americana e de outros países. A HRF promove oposição permanente e ativa a Cuba e à Venezuela.

[19] Criar dúvidas sobre o resultado eleitoral e declarar, portanto, fraude.

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