O caso da Copa América mais uma vez nos faz assistir à lamentável cena de setores da esquerda elogiando a rede Globo. É realmente incrível como a esquerda, que se julga tão crítica das coisas, se deixe levar com tanta facilidade pela propaganda e manipulação da rede Globo. Por sinal, essa facilidade de se deixar levar pela propaganda da Globo mostra que se trata mesmo de uma esquerda pequeno-burguesa, tão influenciada pela propaganda da burguesia quanto a classe média conservadora.
E o problema, logicamente, não é apenas a manipulação em si, mas é a política que está sendo colocada em prática. E aí é que está o problema.
As direções da esquerda ficaram mais de um ano sabotando qualquer iniciativa de sair às ruas para uma mobilização. A insuportável palavra de ordem “fique em casa” foi a única coisa que essa esquerda falou, repetindo a política que estava sendo divulgada pela Globo e pela direita golpista que nunca fez nada pela pandemia mas inventou essa conversa para convencer a classe média a ficar em casa enquanto a maioria do povo saía para trabalhar e ficar doente.
Pois bem, depois de repetir o “fique em casa” como mantra, o povo, que não aguentava mais ficar em casa vendo meio milhão de pessoas morrerem, furou o bloqueio das direções e decidiu sair à rua. Uma mobilização gigantesca em todo o Brasil que colocou abaixo a direita impopular que contava com o “fique em casa” da esquerda para controlar o movimento de oposição a Bolsonaro. Ao mesmo tempo, mostrou para Bolsonaro que seu governo está em risco, não pela ação parlamentar, mas pela mobilização do povo.
É nesse momento que as duas alas da direita, que foram derrotadas pela mobilização, lançam a Copa América como o grande acontecimento político. Mas será mesmo que é assim? Será que a Copa América no Brasil ou em qualquer outro lugar é tão relevante para a situação política? Claramente não.
Da parte de Bolsonaro está mais clara a manobra: ele procura uma maneira de reagrupar sua base social usando a demagogia do futebol, depois de um final de semana aterrorizante para o seu governo.
Já da parte da direita tradicional e sua porta-voz, a rede Globo, a questão da Copa América caiu como uma luva. É a oportunidade de tentar retomar o controle político da oposição a Bolsonaro. Uma advertência: essa oposição não é real, mas é uma disputa eleitoral entre a direita tradicional e os bolsonaristas para saber quem será o candidato da direita em 2022.
Para retomar o controle, uma falsa polarização, a rede Globo correu com seus jornalistas e colunistas esportivos para liderar a campanha contra a Copa América. Campanha que fica ainda melhor porque a rede Globo não tem o direito de transmissão do torneio, que maravilha!
Precisa de mais explicação para mostrar quem está por trás da incrível campanha contra a Copa América?
O mais irônico nem é a falta de sensibilidade política da esquerda pequeno-burguesa, que a impede de ver o óbvio. O mais irônico disso tudo é ver esquerdistas que criticam a Globo se derretendo em elogios pelos jornalistas da emissora.
Mais incrível ainda é ver esquerdistas que vivem atacando o futebol, a Seleção Brasileira e os jogadores porque eles seriam “crias da Globo” elogiarem esses jornalistas. A Globo passou de principal inimiga do futebol para a maior defensora do povo. Se contassem essa história para alguém de outro País, a pessoa com certeza iria achar que se tratava de algum romance surrealista ou alguma peça do teatro do absurdo.
Mas não, essa é a esquerda pequeno-burguesa brasileira em seu esforço por ser cada vez mais ridícula.
Ao invés de entrar de cabeça na manobra de Bolsonaro e se colocar contra a Copa, a esquerda deveria se concentrar em ampliar as enormes mobilizações do dia 29, levantando as reivindicações populares, pela vacinação em massa, auxílio emergencial de verdade e principalmente, colocar abaixo o governo Bolsonaro e todos os golpistas.