O Estado de “Israel” foi fundado em um dos momentos mais revolucionários da história, o fim da Segunda Guerra Mundial, ou seja, uma enorme contradição. Isso só foi possível, pois em 1939, o imperialismo britânico havia esmagado a Revolução Palestina de 1936. Foi possível, também, pois o stalinismo, que dirigia os partidos comunistas no mundo inteiro, estava a favor da criação de “Israel”. Sendo assim, os grandes opositores do gigantesco crime foram os árabes e os trotskistas do mundo.
Nos EUA, os trotskistas se organizavam no SWP, Partido Socialista dos Operários. Seu jornal, The Militant, publicou um editorial pouco após a declaração de fundação de “Israel” em maio de 1948. O artigo se chama A Guerra Árabe-Judaica na Palestina.
Ele começa com uma denúncia direta à ONU: “as atuais intrigas e manobras ardilosas das grandes potências na ONU sobre a Palestina refletem a profunda divisão entre o imperialismo britânico e norte-americano sobre esta questão”. O interessante é que fica claro que durante o processo de criação de “Israel”, não havia consenso sobre o sucesso do projeto sionista.
O texto continua: “a atual guerra entre judeus e árabes, longe de promover o sionismo reacionário ou conferir-lhe uma missão progressista, expõe de maneira evidente que o programa de um Estado judeu na Palestina e a guerra judaica para esse fim são reacionários e falidos do começo ao fim. O sionismo, longe de resolver as dificuldades judaicas, ameaça provocar novos pogroms contra os judeus e envolvê-los em novas calamidades. O sionismo e o pequeno Estado judeu inevitavelmente se tornarão uma ferramenta do imperialismo norte-americano e uma agência para facilitar a entrada dos brigões de Wall Street no Oriente Próximo. Além disso, é precisamente o sionismo que constantemente solidifica a posição dos governantes árabes reacionários, permitindo-lhes perverter a luta social em seus próprios países em uma luta comunal entre os povos árabe e judeu. Como exemplo, o regime reacionário do Rei Farouk do Egito, abalado internamente e enfrentando a crescente oposição da classe trabalhadora, conseguiu se consolidar e sufocar seus oponentes de classe ao desviar a atenção para sua aventura militar contra o Estado sionista. Assim, o sionismo, que por 40 anos se apresentou como o salvador das massas judaicas, na realidade as trouxe a um beco sem saída”.
O que eles não previram naquele momento foi como seria sólido o Estado de “Israel”, tamanho foi o apoio do imperialismo. Não previram também que os regimes reacionários do Oriente Médio acabariam se aliando com “Israel” pela imposição do imperialismo. Mas já estava muito claro para eles, ao contrário da política do stalinismo, que o Estado sionista era ultra reacionário.
Eles seguem abordando a questão dos governos fantoches dos ingleses: “tampouco os governantes árabes estão conduzindo uma luta progressista pela independência nacional e contra o imperialismo. Eles estão, através de sua guerra anti-judaica, tentando desviar a luta contra o imperialismo e utilizando as aspirações das massas árabes por liberdade nacional para sufocar a oposição social ao seu governo tirânico. É por isso que sua guerra contra o Estado judeu carece das características progressistas de uma guerra nacional contra o imperialismo e não merece o apoio dos trabalhadores conscientes de classe”.
Aqui, o The Militant não havia percebido que os governos árabes eram todos controlados pelos ingleses e por isso a guerra não tinha essa característica progressista. No entanto, é difícil afirmar que havia características anti-judaicas, o jornal parece ter caído na campanha da “luta contra o antissemitismo” que deveria ser muito forte nos EUA. Fato é que setores nacionalistas atuaram nessa guerra e cresceram politicamente, o principal deles foi Gamal Abdel Nasser, que seria o líder do nacionalismo árabe em todos os países da região.
Mas mesmo com a análise um pouco fora da mão, o The Militant apresenta a solução correta para a questão da Palestina: “esses fatos devem ser apontados aos povos envolvidos. Os elementos mais clarividentes têm o dever de afastar seus respectivos povos dessa luta fratricida – que só beneficia os imperialistas e seus agentes. A única solução para a Palestina é a união das forças dos dois povos para convocar uma Assembleia Constituinte e estabelecer por decisão democrática um Estado palestino independente, além da organização de uma luta para expulsar todos os imperialistas”.
E seguem: “as forças socialistas nos EUA e em todo o mundo devem, ao mesmo tempo, redobrar seus esforços para que o amplo movimento operário lute pela abertura das portas dos EUA, Grã-Bretanha e outros lugares às vítimas do hitlerismo”. Outra política correta, os judeus europeus que queriam imigrar tinham muito mais interesse na Europa e nos EUA do que na Palestina.
Os trotskistas, nesse momento, já haviam entrado em seu momento de crise. O SWP havia sido duramente reprimido durante a guerra, o próprio Trótski havia sido assassinada e o stalinismo perseguia o movimento no mundo inteiro. Mesmo um pouco desorientados, o movimento ainda apresentou a política correta no momento certo. Não se colocaram a serviço do imperialismo dos EUA ou dos ingleses, não capitularam como o stalinismo. Mantiveram a posição tradicional do movimento operário, união dos povos contra o imperialismo.