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Ricardo Rabelo

Ricardo Rabelo é economista e militante pelo socialismo. Graduado em Ciência Econômicas pela UFMG (1975), também possui especialização em Informática na Educação pela PUC – MINAS (1996). Além disso, possui mestrado em sociologia pela FAFICH UFMG (1983) e doutorado em Comunicação pela UFRJ (2002). Entre 1986 e 2019, foi professor titular de Economia da PUC – MINAS. Foi membro de Corpo Editorial da Revista Economia & Gestão PUC – MINAS.

Coluna

O Sul da Fronteira

Em sua última viagem à América Latina, a generala Laura Richardson, disse que a região "não se beneficia" da cooperação com a República Popular da China

Em sua última viagem à América Latina, a generala Laura Richardson, disse que a região “não se beneficia” da cooperação com a República Popular da China. A generala do Comando Sul do Exército dos EUA Laura Richardson esteve no Brasil para assistir aos exercícios conjuntos entre a marinha brasileira e a estadunidense.

Richardson deu uma entrevista ao jornal Valor Econômico em que comentou diferentes temas das relações EUA-Brasil. E a oficial estadunidense enxerga de maneira negativa a reaproximação intensa entre Brasília e Pequim. “Enquanto as democracias compartilham uma história de 200 anos, a parceria com a China tem apenas 50 anos”, disse a generala. O que a generala não falou foi que esses 200 anos foram de persistente tentativa dos EUA de nos colonizar, como ficou claro a partir dos anos 30 do século XX, quando os EUA buscou substituir a Inglaterra no domínio econômico . Como não conseguiu, diante do projeto da Revolução de 30 de industrializar o país, partiu para a organização de golpes de estado utilizando das vendidas forças armadas brasileiras que se sucederam até que, finalmente, em 1964 implantou a subserviente ditadura militar que atrasou o progresso do Brasil em 21 anos. Na democratização, conseguiu submeter os governos para seus projetos, que só não foram totalmente implementados nos governos Lula e Dilma, que foi derrubada em 2016 por um golpe de Estado articulado pelo imperialismo. No atual governo Lula, os EUA se articulam com a direita e mais recentemente com o sionismo para impedir que o país se reconstrua e afirme sua soberania. 

“Como democracias, respeitamos uns aos outros. Respeitamos a soberania uns dos outros. Respeitamos o povo um do outro, as democracias, o que não acontece com um país comunista, porque eles não respeitam os direitos de seu próprio povo”, disse ela. O governo dos EUA nunca respeitou a democracia em nosso país, sempre tramando contra os interesses nacionais e a democracia brasileira. A forte repressão desencadeada nos Estados Unidos recentemente contra manifestações pacíficas dos estudantes universitários contra o genocídio sionista de Israel em Gaza mostra muito claramente como os governos e as autoridades universitárias respeitam o povo norte-americano. 

A parceria entre Brasil e China tem se intensificado nas últimas décadas, com a integração do Brasil no grupo dos Brics. Ela alcançou seu ponto máximo no ano passado, com a visita oficial de Lula a Pequim com promessas de investimentos e inúmeros acordos de cooperação. Enquanto a China promete investimentos privados e estatais de alta complexidade no Brasil, o imperialismo norte-americano aposta na pura e simples pilhagem de nossos recursos naturais. Além disso, Lula e Xi Jinping avançaram em uma agenda de desdolarização, mediada inclusive pelo Novo Banco de Desenvolvimento liderado por Dilma Rousseff. O único obstáculo ao aprofundamento das relações entre China e Brasil chama-se Fernando Haddad, que rejeita a proposta chinesa das rotas da seda e aposta em projetos como o fracassado acordo Mercosul – Europa e outras quinquilharias do imperialismo. 

O Comando Sul dos EUA é o departamento do exército americano centrado em temas da América do Sul e América Central. Laura Richardson, sua chefe, sabe a importância da região para os EUA. Qual é o tema preferido pela generala? Os recursos naturais que a região possui e que os EUA querem se apossar. Ela afirma que “60% do lítio do mundo está na região; você tem petróleo bruto pesado, você tem petróleo bruto leve, você tem elementos de terras raras, você tem a Amazônia […] você tem 31% da água doce do mundo aqui na região”, completou.

Nos próximos os dias 13 e 15 de junho, acontecerá na região da Puglia, na Itália, a Cúpula de Líderes do G7, organização que representa o imperialismo norte-americano e alguns de seus vassalos da Europa e Ásia. Este encontro, após as eleições dos eurodeputados, analisará o que fazer diante da derrota militar sofrida pela OTAN na Ucrânia, a estratégia para enfrentar a fragilidade produtiva do chamado Ocidente face à China e a estratégia de alianças necessárias para enfrentar o BRICS+, do qual o Brasil é membro fundador, que persistente e pacientemente prossegue com o seu processo gradual de desdolarização e autonomia soberana.

O imperialismo quer controlar o seu “quintal”

Esses desafios explicam a insistência do Departamento de Estado dos EUA em garantir o controle estratégico da região, que eles continuam a considerar seu quintal, como ficou claro com a montagem da farsa do presidente autonomeado da Venezuela Juan Guaidó. Voltam agora sua carga contra as eleições venezuelanas, pretendendo eleger Maria Corina Machado como nova Guaidó, infelizmente com apoio do Brasil nessa nova farsa. É significativo que as relações com os governos da região se dão cada vez mais através do Comando Sul dos EUA, com raras visitas do Secretário de Estado Anthony Blinken e do Secretário de Defesa Lloyd Austin. Apesar de formalmente convidado pelo Presidente Lula a vir ao Brasil, Joe Biden não tomou qualquer providência para concretizar visita. Quanto respeito pelo Brasil!

Como vimos, a generala Laura Richardson representa claramente a perda da hegemonia política pelo imperialismo, e suas vindas ao Brasil tem como objetivo básico a demonização dos líderes políticos que privilegiam a soberania e não admitem a proposta norte-americana de “uma ordem mundial baseada em regras”. Como sempre, a China e a Rússia são sempre rotulados de países autocráticos e inimigos da democracia.

A recente tentativa de assassinato do primeiro-ministro eslovaco Robert Fico, que defendeu interromper a remessa de armas para a Ucrânia é um exemplo de como o imperialismo trata aqueles que ousam questionar a política militarista da Otan. O Jornal New York Times, em sua edição de 16 de maio – um dia após o ataque – reduziu o evento a “um epifenômeno previsível devido à prática populista estabelecida pela própria vítima”. 

O confronto entre imperialismo e a América Latina

Há hoje no mundo um confronto entre o imperialismo e os países atrasados, que podem ou não reagir buscando fazer valer sua soberania e independência. O principal fator é a disputa pelo acesso aos seus recursos naturais, que o imperialismo busca se apossar diretamente através das empresas estrangeiras ou indiretamente da apropriação dos resultados das suas empresas estatais através de dividendos, como está sendo feito com a Petrobrás. Outro fator importante é o domínio da economia do país pelos poderosos fundos econômicos chamados de abutres, onde o principal é o perigosíssimo Black Rock. 

Nesse aspecto também joga importante papel a imposição das políticas neoliberais, obrigando o país a direcionar a maior parte de seus recursos para pagamento de juros de suas dívidas internas e externas , privatização de empresas estatais, etc. Um dos aspectos fundamentais da dominação imperialista é o bloqueio de desenvolvimento de nossas capacidades científico-tecnológicas, como foi feito no Brasil a partir do golpe de 2016 e principalmente no governo Bolsonaro. Antes disso, a operação Lava Jato foi o grande instrumento dos EUA para destruir alguns desenvolvimentos que o país tinha acumulado em áreas importantes. O projeto de submarino nuclear, desenvolvido a cargo do almirante Othon Luís Pinheiro da Silva, foi interrompido e o seu chefe foi acusado indevidamente de corrupção e preso por alguns anos. Agora o Brasil vai adquirir submarino nuclear da França, ficando, portanto, dependente da sua tecnologia estrangeira. A Petrobras tinha um Centro de Desenvolvimento Tecnológico próprio , que foi destruído pela privatização. O governo Bolsonaro promoveu também a privatização das Refinarias, dos oleodutos e da BR distribuidora, cujos postos de gasolina ainda ostentam, indevidamente, a marca da empresa.

 As Universidades Federais, que são reconhecidas pela sua contribuição ao desenvolvimento da Ciência, foram perseguidas nos governos de Temer e Bolsonaro, tiveram seus recursos bloqueados, que não eram suficientes sequer para pagar as contas de luz e água. Atualmente, o Governo Lula estranhamente nega recursos para os reajustes necessários dos salários de professores e funcionários das Universidades Federais, e ameaça, com sua política fiscal neoliberal, cortar os pisos constitucionais para as verbas de saúde e educação. 

A luta pelo controle da imprensa e meios de comunicação

Outro elemento importantíssimo da dominação do imperialismo norte-americano é o controle total da imprensa, com a hegemonia da Rede Globo, que reproduz diuturnamente as notícias mentirosas produzidas pelas agências estrangeiras, impedindo que os trabalhadores brasileiros tomem consciência de seus problemas e lutem para superá-los. As emissoras de rádio e TV, bem como os jornais, são todos cúmplices do genocídio do povo palestino em Gaza, ocultando o papel nefasto dos sionistas e dos EUA no massacre perpetrado pelo Governo de Israel. O Partido da Causa Operária teve recentemente seus canais no YouTube desmonetizados por sua defesa intransigente da resistência palestina, ou seja, deixaram de ser remunerados pela empresa, que, no entanto, continua lucrando com anúncios e outras rendas que obtém a partir do trabalho gratuito a ela oferecido pelos canais do PCO. 

Finalmente, com a evolução da informática e das redes de internet, o imperialismo controla, através do Google, Facebook, X entre outros, impedindo aí também a divulgação de notícias verdadeiras sobre os fatos. As chamadas Big Techs se apropriam de uma enorme quantidade de dados que são fornecidos a elas gratuitamente pelos usuários, e os revendem para empresas comerciais dominarem os mercados com sua propaganda direcionada. Além disso, o controle das redes é feito através dos chamados algoritmos, que direciona ou não as programações e informações das redes para os usuários, atendendo aos interesses e ideologia das empresas controladoras. Com o surgimento da inteligência artificial certamente que as redes estão usando e vão utilizar este instrumento para atender os interesses do imperialismo.

A importância da parceria da China com a América Latina

A colaboração da China com a América Latina traz, sim, grandes vantagens para os países e o povos da região. Nos últimos anos, a China tem desempenhado um papel significativo na América Latina, realizando investimentos em diversos setores. A China tem investido em projetos de infraestrutura, como portos, estradas e ferrovias, visando melhorar a conectividade e facilitar o comércio entre os países da região. Além disso, a China está focando em energia renovável, como parques eólicos e usinas solares, contribuindo para a diversificação da matriz energética e redução das emissões de carbono. A China investiu em projetos de mineração em países como a Bolívia, facilitando o acesso a recursos minerais críticos. Esses investimentos têm impulsionado a economia local, em uma relação de cooperação com as empresas e governos da região, portanto não visando apenas os lucros como faz o imperialismo. O comércio entre a China e a América Latina registrou um aumento significativo nos últimos anos, tornando a China o segundo maior parceiro comercial da região.

A China patrocina grandes investimentos em infraestrutura, como o do porto de Chancay, no Peru , o canal de ligação entre os oceanos Pacifico e Atlântico na Nicarágua, a usina nuclear na Argentina, representando um investimento de US$ 8,3 bilhões, projeto prejudicado pela atitude antichinesa adotada pelo Governo fascista de Milei. No Brasil destacam-se a Tencent, gigante chinesa que realizou aportes significativos em fintechs e startups brasileiras, assim como o Nubank, QuintoAndar e Cora. A State Grid, empresa estatal chinesa, adquiriu a companhia de transmissão de energia do Rio Grande do Sul fazendo grandes investimentos no seu aperfeiçoamento. A fabricante chinesa Great Wall Motors comprou a fábrica da Mercedes-Benz em Iracemápolis, SP. A empresa de carros elétricos BYD comprou a antiga fábrica da Ford na Bahia. Registram-se também que empresas gigantes chinesas de petróleo investiram bilhões na Bacia de Santos, fortalecendo a cooperação energética entre os dois países. Outro setor importante de investimento chinês é a mineração.

Outro aspecto que preocupa a lógica imperialista é o controle comunicacional cada vez mais associado aos algoritmos. Essa é a razão pela qual Washington aprovou uma lei para banir a rede social Tik Tok, a única das dez mais usadas globalmente cuja sede não está nos EUA. O motivo foi impedir a livre expressão dos usuários, principalmente a divulgação de vídeos e notícias sobre o genocídio em Gaza. É sabido que as plataformas desempenham um papel cada vez mais decisivo na configuração cognitiva da população mundial. A rede X, antigo Twitter, foi adquirida pelo multibilionário Elon Musk, que passou a divulgar propaganda da extrema direita mundial e nacional, favorecendo Bolsonaro contra o Governo Lula. 

Não é à toa que a generala norte-americana demonstrou preocupação com a possível penetração de empresas chinesas nas redes brasileiras. “Quem vai ter todos esses dados?”, perguntou retoricamente Richardson, para responder: é preciso “promover alternativas democráticas em cibersegurança, que protejam os direitos humanos e protejam os dados”. Traduzindo: os EUA querem se apossar dos chamados metadados para controlar e manipular as redes sociais em seu favor. 

O governo brasileiro não deve reconhecer o comando sul das Forças Armadas dos EUA, pois se trata de um destacamento criado para uma intervenção militar na América Latina. A sua comandante não deve ser recebida pelo Presidente Lula, como aconteceu recentemente, pois se trata de uma comandante de um exército de um país estrangeiro que já demonstrou ser inimigo dos interesses nacionais brasileiros. Não deve ser permitido que a generala intervenha em assuntos de política interna nem externa brasileira, que serão definidos sempre, soberanamente, em termos altivos e ativos.

(*) O título se refere à forma como os norte-americanos se referem à América Latina, mas é uma homenagem, também, ao grande diretor Oliver Stone, que fez um documentário com este título sobre a primeira década do século que se caracterizou por uma série de governos anti-imperialistas, mostrando que nós podemos às vezes cair sob domínio da direita vendida , mas sabemos resistir ao domínio criminoso do imperialismo norte-americano.

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Ao Sul da Fronteira - Legendado (Completo)

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